Tanto na Academia Parnaibana de Letras-APAL quanto no Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Parnaíba-IHGGP, escolhi como Patrono das cadeiras que ocupo Benedicto Jonas Correia, grande professor de Português e de História do Brasil.

Por que não Benedicto Correia – de quem não fui aluno – numa das cadeiras e o professor José Rodrigues  e Silva – de quem fui aluno durante os cursos ginasial e científico – na outra? Ou ainda um dos dois outros  expoentes do ensino  na cidade, pertencentes à mesma geração – professores João Batista Campos ou Monsenhor Antônio Monteiro de Sampaio?  E o professor Edson da Paz Cunha, um dos fundadores da Academia Piauiense de Letras? Explico: esses  quatro grandes mestres de Língua Portuguesa já estavam homenageados pelos acadêmicos fundadores: João Batista Campos como Patrono da Cadeira nº 17, ocupada por Francisco de Assis Almeida Brasil;  o Monsenhor Sampaio como 1º Ocupante da Cadeira nº 07, que tem como Patrono o Monsenhor Roberto Lopes Ribeiro, e Edson da Paz Cunha como Patrono da Cadeira nº 02, cujo 1º Ocupante é  João Nonon de Moura Fontes Ibiapina. O professor José Rodrigues, por sua vez,  foi convidado na época da criação da Academia para integrar seus quadros na qualidade de membro fundador, tendo declinado do convite.

Aliás, no discurso que proferi na solenidade comemorativa de nascimento de Benedicto Correia, em 2006, fiz comentários sobre esses quatro mestres.

Concluído o curso primário na terra natal, Benedicto Correia foi para Fortaleza-CE, onde estudou no Instituto Miguel Borges e no Colégio Militar do Ceará, transferindo-se para o Colégio Militar do Rio de Janeiro.

Quando ingressou na Sociedade Parnaibana de Expansão Cultural, 1948, o jornalista Raimundo Ferraz Filho fez o discurso de recepção, do qual transcrevo o seguinte trecho:

“Quando ainda fazendo o curso do Colégio Militar, Benedicto Jonas Correia era um dos diretores da Sociedade Literária e Científica e redator da revista daquele Educandário, A ASPIRAÇÃO. A sua ausência do Colégio Militar não constituiu, porém, motivo para que a sua colaboração fosse suspensa e por isso as páginas daquela importante revista continuaram acolhendo as magníficas produções do seu assíduo colaborador”.

 Em 1945,  Benedicto Correia escreveu e publicou, em parceria com Benedicto dos Santos Lima,  O LIVRO DO CENTENÁRIO DE PARNA[ÍBA, importante documentário que compreende estudos históricos, corográficos, estatísticos e sociais do município, no período de 1844 a  1944.

Ao longo da vida Benedicto Correia cultivou os nobres sentimentos de patriotismo e de profundo amor à terra natal, com participação ativa em várias campanhas cívicas. Lembrarei uma: “Campanha Pró-Manutenção do Nome da Cidade.

Em 1943, o nome da cidade amada – Parnaíba – foi substituído por outro: – Poti. Motivo: em São Paulo havia um município homônimo e mais antigo que o nosso. Os parnaibanos não se conformaram e constituíram uma Comissão, integrada por dez membros, para conduzir a campanha pela preservação do nome da cidade. Benedicto Correia foi um deles.  Campanha vitoriosa, ficando a cidade paulista com a denominação de Santana do Parnaíba, livrando-se os parnaibanos de serem chamados de potienses. Aliás, no  terceiro poema da série NOMES, inserido no meu livro PARNAÍBA: MEU UNIVERSO,  refiro-me a esse episódio: “na década de 1940/ os parnaibanos/ quase fomos transformados/ por paulistas/ de Santana do Parnaíba/ com o aval/ da ditadura Vargas/ em potienses/ como se nascidos/ em Poti (ex-Parnaíba)/ e portanto/ na exata/ pronúncia nossa/ filhos da puta/  seríamos/ – não fora/ a firme/ forte/ frente/ formada/ por valorosos/ conterrâneos/ hoje mortos/ que na caneta/ e na voz/ e com a história/ na memória/ mantiveram/o nome/             con-sagrado/ e imutável/ da invicta Parnaíba.”

Em 1979, já bastante doente e a poucos meses do falecimento, o professor e jornalista Benedicto Correia indignou-se , a exemplo do povo em geral, com o triste episódio da destruição da praça da Graça, durante a gestão do prefeito João Batista Ferreira da Silva, e encontrou força e coragem para redigir o Editorial intitulado – “31 de Agosto: Do Povo Parnaibano ao Povo Parnaibano” -, publicado em Caderno Especial do Jornal INOVAÇÃO, edição de setembro daquele ano, e transcrito no meu livro ASPECTOS DA LITERATURA PIAUIENSE. O artigo foi escrito para exaltar a coragem cívica dos parnaibanos, que, na noite de 31 de agosto de 1979, revoltados com a destruição da praça da Graça, incendiaram os tapumes que ocultavam  os escombros, os entulhos, os destroços do nosso mais importante logradouro público.

Em Parnaíba, Benedicto Correia teve ainda destacada atuação no exercício de funções executivas, tanto no setor público quanto no privado.

Na administração do dr. Mirocles de Campos Veras foi secretário municipal, em cujas funções deu especial atenção à interiorização do ensino primário (com destaque para a criação do Grupo Escolar de Morros da Mariana, a primeira escola do povoado) e à  criação em 1942 da Biblioteca Pública Municipal, que  leva o nome desse grande médico e administrador, organizada e estruturada pelo secretário do município, que adotou, de acordo com as instruções do Instituto Nacional do Livro, o Sistema de Classificação Decimal Dewey, então o mais difundido e  conhecido como classificação universal.

Foi ainda o primeiro superintendente do Departamento Regional do Serviço Social da Indústria – SESI,  a partir de 1955 até a aposentadoria nos anos 70, realizando uma gestão pautada na competência, no trabalho e na probidade.

Descendente da tradicional família Moraes Correia, Benedicto Correia é filho do coronel Jonas de Moraes Correia e de dona Maria Firmina Ramos Correia, tendo nascido em 1906 em Parnaíba, onde faleceu em 1980. Esposa: Berenice Correia, com quem teve quatro filhos: Paulo, Maria Aparecida, Teresa de Jesus e Francisco de Canindé Correia, de quem passo a falar agora.

Na infância e na adolescência não tive convivência com  Canindé  apesar de morarmos em Parnaíba.

Tornei-me seu amigo no Rio  de Janeiro, onde ele fazia o curso de ciências econômicas e eu o de direito e chegamos a fazer com outros parnaibanos algumas edições do jornaleco mimeografado O LINGUINHA, considerado o primeiro jornal marginal do Piauí e que viria a ser tema de uma monografia de conclusão de curso de Licenciatura Plena em História, apresentada pela professora Camila da Silva Miranda à Universidade Estadual do Estado do Piauí/ Campus Professor Alexandre Alves de Oliveira, em Parnaíba, sob a orientação do professor M.s. Idelmar Gomes Cavalcante Júnior, com o título POR UMA QUESTÃO DE (DES)ORDEM: A EMERGÊCIA DA IMPRENSA ALTERNATIVA NO PIAUÍ A PARTIR DO JORNAL LINGUINHA.  O jornaleco, fundado em Parnaíba em fins de 1971 estampava como epígrafe esta quadrinha de minha autoria

“O LINGUINHA é um jornal

que talvez não valha nada,

mas em tudo o que vai mal,

quando pode, dá porrada.”

O gosto pelo jornalismo alternativo levou-o a escrever para o jornal INOVAÇÃO, fundado em Parnaíba em 1977 por Francisco José Ribeiro e Reginaldo Costa, que durante as comemorações do 7º aniversário de fundação do jornal declarou :

 “Num plano mais amplo, direcionamos nossos olhos para o povo, para os marginalizados que vegetam na periferia da cidade, apesar de pagarem impostos de toda natureza. A visão dessa situação nos estimulou a editar um jornal mimeografado, desvinculado de qualquer força que viesse a nos amordaçar. Hoje, por uma feliz coincidência, INOVAÇÃO entra no 8º ano de existência, de luta ininterrupta. Em nome do grupo INOVAÇÃO gostaria de homenagear aqueles que se empenharam, no início, para que a ideia frutificasse. Destacaria Canindé Correia, Ednólia Fontenele, Olavo Rebelo, Ana Alice, Airton Meneses, Franzé Ribeiro, entre outros”.

Durante os dez anos de existência o INOVAÇÃO, que reputo o mais importante e o mais duradouro jornal alternativo do Piauí, cumpriu corajosamente a sua destinação, denunciando mazelas e falcatruas administrativas na cidade de Parnaíba, além de divulgar a poesia, a música e o teatro da terra e colocar-se permanentemente ao lado dos fracos e oprimidos.

Segundo o poeta Elmar Carvalho, que teve  ativa atuação no MOVIMENTO SOCIAL E CULTURAL INOVAÇÃO, “se alguém algum dia, escrever um ensaio isento e imparcial sobre a cultura parnaibana não poderá olvidar, jamais, o jornal INOVAÇÃO.

INOVAÇÃO é, atualmente  para algumas pessoas de Parnaíba, um jornal maldito. E incômodo, muito incômodo. Mas vale ressaltar que não obstante isso, ou exatamente por isso, é mais vendável e discutido que a ‘grande’ imprensa de Parnaíba. Creio que em virtude de sua independência, de sua coerência para com a verdade, e de sua não omissão diante de fatos injustos e nocivos à comunidade” (JORNAL DA MANHÃ, Teresina, edição de 28.08.1983).

Por sua vinculação com o INOVAÇÃO e posições políticas de esquerda, Canindé é taxado por seus desafetos de comunista, o que não corresponde à verdade. Socialista convicto sim; comunista, nunca.

As principais funções que exerceu foram: superintendente do SESI-PI e secretário municipal de educação na primeira administração do prefeito José Hamilton Furtado Castelo Beanco (1993-1996).

No período em que foi secretário de educação foram muitas as realizações, destacando-se a construção do CAIC – Escola Municipal Professora Albertina Furtado Castelo Branco e a grande ampliação da Escola Roland Jacob, justamente as duas maiores escolas da rede pública municipal.

Até hoje não conheci uma pessoa mais desprovida de ambições materiais e de vaidade do que ele. Quando sondado para integrar a Academia Parnaibana de Letras agradeceu a lembrança, mas ponderou que não poderia concorrer porque não era autor de um livro, argumento frágil se se considerar que poderia sanar o óbice com a reunião em livro dos principais textos que escreveu em jornais e dos pronunciamentos  feitos como secretário da educação e superintendente do SESI. Outro exemplo: presenciei na minha residência Canindé recusar convite feito por José Hamilton Castelo Branco na sua terceira administração para que assumisse importante cargo na Prefeitura. Justificativa para a recusa: já aposentado queria dedicar-se apenas à esposa Tânia Maria (minha irmã), às filhas Ivana e Maria de Fátima e aos netos Jonas e Felipe. Na época não tinham nascido ainda Gabriel e Maria Eduarda.

Não obstante as considerações acima, Canindé compõe surpreendentemente o quadro de sócios efetivos do Instituro Histórico, Geográfico e Genealógico de Parnaíba (cadeira nº 13). Será que o colocaram lá sem consultá-lo?

Desde que nos tornamos amigos houve até hoje apenas uma divergência entre nós: ele é obcecado pelo Fluminense; eu, pelo Flamengo. E segundo o genial  dramaturgo e tricolor  Nélson Rodrigues  “o Fla-Flu (único clássico do futebol brasileiro a merecer a honraria de patrimônio imaterial do Rio de Janeiro) não tem começo. O Fla-Flu não tem fim”.

Por Alcenor Candeira Filho