No meio Espírita tornou-se comum a citação da resposta dada a Allan Kardec, pelos reveladores da Doutrina, à questão número 886, informando-nos que a Caridade, segundo entendia Jesus, dá-se pela aplicação da Benevolência para com todos, Indulgência para com as imperfeições alheias, e o Perdão das ofensas.

Também permeia o movimento espírita o convite de Bezerra de Menezes, em inúmeras manifestações mediúnicas, para que unamo-nos e unifiquemo-nos.

Tais conceitos são bússolas aos que integram a comunidade espírita, e não podem desassociar-se instante algum. Isto porque, a Caridade é o cordão que nos une, e a união é o que nos unifica, e tudo isto é regra para o dia a dia do espírita, das instituições em suas vivências particulares, e entre as instituições na execução de atividades comuns.

Natural percebermos pessoas impacientarem-se em situações simples, esquecendo-se que é no momento de irritação que devemos usar da paciência. Logo, é justamente quando estamos planejando, executando e avaliando atividades espíritas, que seus membros devem recordar-se do comportamento caridoso para manter-se unido, e por sua vez, unificados.

Mas, as discordâncias, distanciamentos e até dissidências, também não são raras no recém movimento feito por encarnados que durante anos, encarnações, mais serviram ao materialismo e a ideias dogmáticas de poder, que são novatos na ideia da essência Cristã, e claro do Espiritismo, que tem um pouco mais de 160 anos. Isto os leva, portanto, a manifestarem, com frequência, atitudes que os afasta do ideário espírita, pois é quando esquecem-se da prática da Caridade, segundo Jesus e Kardec.

Na obra Viagem Espírita em 1862 e outras viagens de Kardec, no capítulo que trata das “Instruções Particulares dadas aos Grupos em Resposta a algumas das Questões Propostas”, encontramos esta pérola doutrinária:

 Não seria desejável que os espíritas tivessem uma senha, um sinal qualquer para se reconhecerem quando se encontram?

Os espíritas não formam nem uma sociedade secreta, nem uma afiliação; não devem, pois, ter nenhum sinal secreto para serem reconhecidos. Como nada ensinam e nada praticam que não possa ser conhecido por todo mundo, nada têm a ocultar. Um sinal, uma senha, poderiam, aliás, ser usados por falsos irmãos, e nem por isso serieis mais adiantados. Tendes uma senha que é compreendida de um extremo a outro do mundo: é a da caridade. Esta palavra é fácil de ser pronunciada por todos, mas a verdadeira caridade não pode ser falsificada. Pela prática da verdadeira caridade reconhecereis sempre um irmão, ainda que não seja espírita, e deveis estender-lhe a mão, porquanto, se ele não partilha de vossas crenças, nem por isso deixará de ser para vós menos benevolente e tolerante.

A situação é complexa, do ponto de vista de sua amplitude e multifatorialidade, e é igualmente prejudicial ao movimento, se não for constantemente observada e debatida, a fim de que os aprendizados se deem e ocorra a superação de conflitos pelo perdão, mantendo assim o propósito de união e unificação de pé.

Infelizmente, há aqueles que, percebendo suas habilidades, e não querendo abrir mão do amor próprio, enxerga na Casa Espírita e no Movimento Espírita, meios de se sobressair em projetos pessoais de realização do ego. O próprio Codificador percebeu isto nos dias nascentes da Doutrina e teve o cuidado de expor aos grupos e sociedades espíritas por onde visitou, esclarecendo que:

Ao lado da especulação material, há a que se poderia chamar especulação moral, isto é, a satisfação do orgulho, do amor-próprio; é o caso daqueles que, mesmo sem interesse pecuniário, julgavam fazer do Espiritismo um pedestal honorífico para se porem em evidência. Não os favoreci, e meus escritos, assim como meus conselhos, se contrapuseram a mais de uma premeditação, mostrando que as qualidades do verdadeiro espírita são a abnegação e a humildade, segundo esta máxima do Cristo: “Quem se exalta será humilhado.” Esta segunda categoria também não me aprecia e bem poderia ser chamada a das ambições frustradas e dos amores-próprios melindrados. Viagem Espírita em 1862 e outras viagens de Kardec. Feb.

Para que o Movimento Espírita, através dos espíritas, das instituições e das atividades que propõem a si mesmos, possa se verificar uma crescente onda de fraternidade, é imprescindível fazer uso da Caridade, conforme disse Emmanuel, na mensagem recebida em 14 de setembro de 1948, pelo médium Francisco Cândido Xavier, em Pedro Leopoldo (MG), destinada aos irmãos do I Congresso Brasileiro de Unificação, em São Paulo:

Compreendendo a responsabilidade da grande assembleia de colaboradores do Espiritismo brasileiro, formulamos votos ardentes para que orientem no Evangelho quaisquer princípios de unificação, em torno dos quais entrelaçam esperanças. Orientação aos Órgãos de Unificação. Feb

Mas também, estudar Kardec, em todas as suas obras, trazendo solidez e compreensão, o que possibilita a todos nos identificarmos parte da mesma família cristã, como assegura Bezerra, na mensagem recebida pelo médium Francisco Cândido Xavier, em reunião da Comunhão Espírita Cristã, em 20-4-1963, em Uberaba-MG:

Nenhuma hostilidade recíproca, nenhum desapreço a quem quer que seja. Acontece, porém, que temos necessidade de preservar os fundamentos espíritas, honrá-los e sublimá-los, senão acabaremos estranhos uns aos outros, ou então cadaverizados em arregimentações que nos mutilarão os melhores anseios, convertendo-nos o movimento de libertação numa seita estanque, encarcerada em novas interpretações e teologias, que nos acomodariam nas conveniências do plano inferior e nos afastariam da Verdade. Orientação aos Órgãos de Unificação. Feb

A prática espírita, de foro individual, institucional e coletivo, é questão de consciência, sentimento de pertencimento e identificação. Caridosos seremos unidos; unidos nos unificaremos. E sentindo-nos acolhidos, proativos e exercendo reciprocidade, nos sentiremos felizes e no direito de afirmar como Kardec:

Estando, pois, admitido que não se pode ser bom espírita com sentimentos de rancor no coração, eu me orgulho de contar apenas com amigos entre estes últimos, pois que, se eu tiver defeitos, eles saberão desculpá-los. Viagem Espírita em 1862 e outras viagens de Kardec. Feb.

Por Samuel Aguiar