DEMONICES
Vitor de Athayde Couto
Modela um pouco de barro no espaço tridimensional e terás uma Escultura. Tira os excessos do mármore e verás nascer davis, dianas e pietàs.
Imita os passarinhos e terás melodias, harmonias e ritmos. Terás Música.
Mexe o teu corpo e terás a Dança.
Dispõe umas cores sobre telas e terás a Pintura, desde vênus, giocondas e abaporus, até a última ceia.
Se construíres belas metáforas, terás Poesia.
E se juntares um punhado de palavras combinadas, com segurança, elegância e beleza, terás produzido Literatura. Sim, a mais pura arte, desde que não seja crítica literária, história da literatura, quem são os maiores escritores e outras chatices pseudocientíficas.
Arte é o trabalho humano que emociona.
Ciência, ao contrário, produz apenas conhecimento, sem nenhuma emoção. No entanto, em algum dia do tempo anterior a Jesus Cristo, um cientista muito entusiasmado gritou “Eureka!”. Infelizmente, os seguidores de Arquimedes não herdaram esse mesmo entusiasmo. Nem alegria.
Hoje em dia, cientistas sisudos apenas argumentam, às vezes experimentam, demonstram, e, muito raramente, dão alguma utilidade ao esforço despendido. E como brigam para publicar artigos, quase todos inúteis (exceto na China, onde todo e qualquer conhecimento novo vira mercadoria para exportação).
Mas eu juro que produzir conhecimento novo é mais fácil do que emocionar, fazer rir ou fazer chorar. Para fazer ciência, basta ter objeto, método e algum conhecimento previamente acumulado. Mas nada disso serve para fazer rir ou chorar (exceto quem está fazendo tese de doutorado, haha). Só quem já sofreu é capaz de fazer rir. Só faz chorar, quem vive rindo, nem que seja de maldade.
Só o riso e o choro são capazes de travestir a vida em tragicomédia sem fim.
E quanto à morte? E depois da morte? E depois da tese? Duvidas? Se duvidas, não mereces conjugar os verbos reviver, renascer, e, muito menos, ressuscitar.
A ciência fria pode estudar e até compreender a Alma, nunca o Mistério. Mistério e Fé são obras exclusivas do criador da Arquitetura – a arte primeira.
Li em algum lugar que “a Literatura é uma arte produzida com palavras”. E as palavras são tão poderosas que combatem até o diabo – porque o diabo é feito de palavras. Basta substituir a palavra diabo por outra qualquer, desde que não sejam as palavras anjo e mal, porque têm a mesma origem e significado. Por exemplo, Generoso, haha. Se eu quiser chamar o capeta de Generoso ele vai se sentir depressivo, vai ficar injuriado e completamente desmoralizado.
Não existe diversidade entre anjo, diabo e mal. Ao contrário, são palavras que se identificam, assim como vil (vilão), evil (mal) e devil (diabo). Essas palavras, do inglês, formam trindades – embora não sejam santíssimas. Para formar trindades, basta eu querer. Quando escrevo, produzo com palavras. Não satisfeito, invento quantas palavras novas eu quiser. Demonices, por exemplo, se eu não gostar da palavra diabruras.
Já em ciência, tudo se copia.
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