O STF, no último dia 11 de fevereiro, decidiu que “é incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais”.
A decisão quer significar que mesmo tendo transcorrido muito tempo, ainda assim, não se pode impedir que um determinado fato ou dado verídico, licitamente obtido, venha novamente a ser divulgado nos meios de comunicação.
O Ministro Relator, Dias Toffoli, considerou que inexiste no ordenamento jurídico brasileiro o direito ao esquecimento, e ressaltou que admiti-lo “seria uma restrição excessiva e peremptória às liberdades de expressão e de manifestação de pensamento dos autores e ao direito que todo cidadão tem de se manter informado a respeito de fatos relevantes da história social”.
Mas, pela redação da tese e votos de alguns Ministros, percebe-se que a discussão não se encerra com este julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.010.606. A doutrina continuará estudando o direito ao esquecimento, inclusive com outras dimensões e/ou concepções diferentes da abordada pelo STF.
Na realidade, apesar do reconhecimento da repercussão geral, o julgamento do STF não afastou, por completo, o direito ao esquecimento. Apenas, considerou-o incompatível com a Constituição, quando este direito for entendido como o “poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais”.
Vê-se, portanto, que são várias as concepções existentes quanto ao “direito ao esquecimento”, e o STF rejeitou apenas aquela que proíbe a divulgação de fatos verídicos exclusivamente em razão do tempo.
Está, portanto, aberta a possibilidade do direito ao esquecimento voltar a ser discutido, desde que num enfoque mais amplo, ou diferente. O Ministro Fachin, inclusive, afirmou que, nesse julgamento, houve “uma miríade de fundamentos nos votos” O próprio Ministro Relator, Dias Toffoli, não negou as diferentes concepções existentes quanto ao chamado direito ao esquecimento, e o presidente do STF, Ministro Luiz Fux, admitiu que as abordagens feitas “não deixam ao desabrigo a possibilidade de se rediscutir num caso específico, se é relevância social ou interesse público, o direito ao esquecimento”.
Enfim, a complexidade da matéria, a análise do direito comparado, e os diferentes pontos de vista analisados sob o prisma da questão científica e acadêmica, poderão trazer de volta a discussão e ajudar a construir um parâmetro, quanto ao chamado direito ao esquecimento, para evitar que a divulgação de fatos antigos e descontextualizados venha a provocar traumas, trazer infelicidade e prejudicar o desenvolvimento da personalidade dos envolvidos. O presidente do STF, Ministro Luiz Fux, no final da sessão de julgamento, levantou esta possibilidade, ao questionar: “por que não dizer que há um direito ao esquecimento, como uma forma de não gerar infelicidade?”
Só a título de exemplo, a divulgação atual, na imprensa ou na internet, de um crime sexual ocorrido há mais de vinte anos, poderá repercutir negativamente e causar mais transtornos, infelicidades e um novo trauma na vítima, diante da publicidade desnecessária desse fato antigo. Mas, de acordo com a tese aprovada pelo STF, em razão da passagem do tempo não haveria como proibir esta publicação.
Enfim, o STF decidiu que o direito ao esquecimento não está amparado por nosso ordenamento jurídico e “eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível”.
Assim, esqueçamos o direito ao esquecimento, mas por enquanto.