SEMANÁRIO JURÍDICO – EDIÇÃO DE 25.01.2019
JOSINO RIBEIRO NETO
JUSTIÇA – A SITUAÇÃO DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS – COMEÇO DE SOLUÇÕES.
A coluna sempre denunciou a situação inusitada de injustificado atraso nos serviços prestados à população pelas serventias cartorárias privadas e, em reiteradas ocasiões, solicitou providências justas objetivando atender a população, notadamente, os menos favorecidos.
A situação cartorária do Piauí, ainda se assemelha às velhas regras das “Ordenações”, prevalecendo concentração de poder e de prestação de serviços, de enriquecimento financeiro, vínculos hereditários, dentre outros males.
Nas grandes comarcas, em especial, em Teresina-Pi., todos os serviços cartorários das serventias extrajudiciais, concentram-se no centro da Cidade, os usuários enfrentam filas intermináveis, até para um simples reconhecimento de firma ou autenticação de um documento e pagam elevado preço pelo serviço prestado.
Ao contrário do espírito da lei e das normas codificadas da espécie, embora se trate de um serviço público, exercido por particulares por delegação, tais serventias cartorárias, deliberadamente, afrontam a função social do serviço do serviço e se assemelham às práticas capitalistas das mais desumanas e perversas.
Em tempos passados o titular da coluna, na época no exercício de função de comando na Justiça, em conjunto com a Prefeitura Municipal de Teresina (Pi), através de anteprojeto de resolução, sugeriu a criação de diversas serventias cartorárias, cuja titularidade seria preenchida pela via estreita do concurso público, mas a força do tráfico de influencia “conseguiu” que a ideia sucumbisse nos “gavetões” do Tribunal de Justiça.
Agora um alento. Na solenidade de instalação do ANO JUDICIÁRIO o Chefe do Poder Judiciário do Piauí, Desembargador SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS, anunciou a instalação do um cartório no bairro Dirceu Arcoverde, que significa o começo de uma descentralização da prestação dos serviços registrais na Capital, de elevado significativo social para a comunidade.
O Presidente do TJPI informou ao titular da coluna que outras serventias serão instaladas e que o Desembargador OTON LUSTOSA é quem está no comando das providências de descentralização do referido serviço.
CÓDIGO DE TRANSITO BRASILEIRO – CRIMES COMETIDOS NA DIREÇÃO DE VEÍCULOS AUTOMOTORES.
A legislação de trânsito, consolidada pelo Código de Transito Brasileiro (Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997), ao impor condenações aos crimes cometidos por condutores de veículos automotores, considerando o tempo em que foi editada, mostrava-se bastante benevolente com os praticante dos crimes da espécie, haja vista que o comportamento dos motoristas era outro.
O número de veículos em circulação era modesto, poucas pessoas tinham condições financeiras para adquirir um veículo, assim, existia natural e razoável processo seletivo.
Depois tudo mudou. O número de veículos novos e usados cresceu assustadoramente. As vias de tráfegos restam congestionadas e motoristas de todo tipo, preparados, despreparados, prudentes, imprudentes, responsáveis e irresponsáveis, trafegam dirigindo carros, enfim, “deu a louca no mundo” do trânsito de veículos automotores.
Os acidentes de trânsitos, alguns com vítima fatal, aumentaram significativamente, até por se tratar de um crime de natureza culposa, afiançável, de penalidades leves, que não intimidam ninguém.
Motoristas embriagados ou sob efeito de outras drogas, desrespeitam a sinalização de trânsito (ultrapassagem em sinal fechado, etc.), dirigem em alta velocidade, enfim, usam o veículo como verdadeira arma de prática de crimes.
Diante da situação, que é preocupante, a doutrina e a jurisprudência criou a figura do dolo eventual,que resulta do comportamento ilícito do motorista consciente de que o seu comportamento poderá vitimar alguém (embriagues, velocidade excessiva, ultrapassagem de sinal fechado, etc.), e, portando, deixa de ser culposo o crime passando a ser de natureza dolosa, cabendo o julgamento ao Tribunal do Juri.
Sobre a matéria as lições doutrinárias de Juelci de Almeida, no Livro TRÂNSITO, editora Primeira Impressão, pgs. 86/87, são esclarecedoras da matéria pesquisada:
“Por oportuno, cabe salientar que Otávio Valeixo, responsável pelas primeiras condenações de trânsito por dolo eventual (na qual a Justiça considera que motorista não teve a intenção, mas assumiu o risco de matar, com pena de seis a vinte anos de prisão), acha que a lei dos juizados especiais deve ser revista. Numa entrevista concedida ao Correio Braziliense, de 22 de janeiro de 1997, assim se manifestou: “Foi uma lei feita só para desafogar os cartórios criminais. Do lado dos infratores, ela foi recebida co m efusiva alegria. Mostra-se exageradamente benevolente com o infrator.”
Na capital, Brasília, há apenas um caso de condenação por homicídio doloso em crime de trânsito. Em dezembro de 1996, o Fórum de Ceilândia condenou a oito anos de prisão um motorista profissional que havia um ano, dirigindo alcoolizado e com excesso ode velocidade, atropelou e matou três pessoas e feriu outra. Nesse caso, o promotor de justiça que denunciou o motorista assim justificou, ipisis verbis: “Ele foi julgado por homicídio doloso, na modalidade dolo eventual, porque, com a sua conduta, colocou-se em situação de causar mortes. Em acidentes em que há morte e que o motorista for comprovadamente culpado, deveria haver condenações mais rigorosas. Somente dessa forma consegue-se mudar essa cultura de impunidade. Se um indivíduo furta um tocafitas ele vai para a cadeia, e no caso de trânsito não poderia ser diferente”.
O legislador, preocupado com a interferência do Judiciário na sua competência, editou a Lei nº 13.543, de 19 de dezembro de 2017, acrescentando o § 3º ao art. 302 do CTB, punindo o crime de homicídio culposo com pena mais rigorosa:
§ 3º – Se o agente conduz veículo automotor sob a influencia de álcool ou de qualquer outra substancia psicoativa que determine dependência:
Penas – reclusão de cinco a oito anos, e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Existem outras alterações introduzidas pela Lei nº 13.543/17, dentre elas a que consta da redação do § 3º, do art. 303, acerca da apenação no caso de lesão corporal culposa, que tem a seguinte redação:
§ 2º “A pena privativa de liberdade é de reclusão de dois a cinco anos, sem prejuízo das outras penas previstas neste artigo, se o agente conduz o veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência, e se do crime resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima”.
Mas, no momento a matéria tem como foco principal a apenação resultante do homicídio culposo, cujo espírito da lei era de tornar sem objeto a construção doutrinária e jurisprudencial do dolo eventual, que, felizmente, não aconteceu.
Então, como afirmado, preocupado com as providências da Justiça, que, de certo modo, passou a legislar sobre o assunto, o legislador cuidou de aumentar a pena para a prática de crime culposo no trânsito, objetivando esvaziar a transformação da ação culposa em ação dolosa, quando, eventualmente, o comportamento do praticante do crime justificar a sua prática consciente.
Mas o problema continua e a doutrina e a jurisprudência ainda não renunciaram o posicionamento acerca da ocorrência da prática do dolo eventual em situações graves que justifiquem. Segue a transcrição de decisão recente do Superior Tribunal de Justiça, confirmando a competência do Tribunal do Juri para o julgamento do ilícito:
“Na hipótese de homicídio praticado na direção de veículo automotor, havendo elementos nos autos indicativos de que o condutor agiu, possivelmente, com dolo eventual, o julgamento acerca da ocorrência deste ou da culpa consciente compete ao Tribunal do Júri, na qualidade de juiz natural da causa”.
Em sede de conclusão o que se pode afirmar é que, não obstante a tentativa do legislador de agravar as apenações aplicadas aos crimes de trânsito, que continuam de natureza culposa, a construção doutrinária e jurisprudencial do dolo eventual continua, para o gáudio da população cada vez mais preocupada com a violência no trânsito.
O Desembargador OTON MÁRIO JOSE LUSTOSA TORRES, a quem compete cuidar de efetivar a descentralização dos serviços cartorários nas grandes comarcas do Piauí, instalando novas serventias extrajudiciais obedecendo a densidade populacional de cada bairro.