O Estado do Piauí está gastando seis vezes mais o que se gasta normalmente com a ressocialização de presos. Em três meses de uso de tornozeleiras eletrônicas em reeducandos do Estado, com a implantação do sistema de monitoramento eletrônico de área, foram gastos R$ 870 mil –R$ 290 mil por mês. Os valores foram contestados pela CGE (Controladoria Geral do Estado), que recomendou a suspensão dos pagamentos devido a suspeita de superfaturamento.

Estimativas da Sejus (Secretaria de Estado da Justiça) apontam que a média gasta para manter um preso em uma unidade prisional do Piauí é de R$ 1.500. Já o valor médio gasto por reeducandos com tornozeleiras está em R$ 9.666 — sendo que 30 deles estão com tornozeleiras. O valor é quase 17 vezes mais do anunciado pela Sejus, que seria R$ 580 em média por preso.

Em setembro, a Sejus anunciou que 500 equipamentos estavam à disposição da Justiça para readequação de penas de internos do sistema prisional do Piauí, e assim, diminuir a lotação dos presídios piauienses. Porém, os equipamentos foram locados e a Sejus está pagando pelos equipamentos que não estão em uso.

“A Secretaria devia estar pagando pelo valor de equipamento em uso e não pela quantidade disponibilizada. É inadmissível pagar por algo que não está em uso. É dinheiro desperdiçado. Como é que alugam 500 tornozeleiras de uma vez se não existe um planejamento para 500 presos usarem os equipamentos de uma vez, inicialmente?”, questionou o presidente do Sinpoljuspi (Sindicato dos Agentes Penitenciários do Piauí), Vilobaldo Carvalho.

Os valores pagos com a locação das tornozeleiras e monitoramento dos presos foram questionados pela CGE. Segundo a controladoria, o contrato firmado entre a Sejus e a empresa UE Brasil Tecnologias Ltda – ME foi celebrado de forma emergencial, ou seja, sem processo de licitação e por meio de carta convite, e passou a vigorar em 12 de abril de 2013 com término em 12 de outubro de 2013, porém, neste período, nenhum preso havia usado tornozeleira. O primeiro equipamento foi colocado em um preso no dia 17 de setembro.

A CGE suspeitou de irregularidades no pagamento do aluguel de tornozeleiras depois que constatou que a empresa UE Brasil Tecnologia Ltda – ME venceu um pregão eletrônico realizado pelo Estado do Rio Grande do Sul para fornecimento de equipamento idêntico, pelo valor de R$ 260 por tornozeleira.

A CGE recomendou também alteração do contrato de locação das tornozeleiras para identificar os valores pagos referentes a equipamentos e de prestação de serviços para que a Sejus pague apenas os valores dos equipamentos usados. “A alteração contratual deverá, também, estabelecer que a propriedade dos equipamentos utilizados para implantação do sistema de monitoramento dos apenados passe, ao final do contrato, para o Estado do Piauí, uma vez que o referido contrato não prevê essa possibilidade.”

Falhas no sistema

O sindicato criticou a implantação de tornozeleiras eletrônicas, pois para a entidade, os reeducandos são monitorados pela polícia apenas por área e não socialmente, assim podem cometer delitos dentro da área que estão dispostos. “Esses presos que estão indo para as ruas podem voltar a cometer delitos, pois eles não estão sendo monitorados sobre o que estão fazendo e com quem estão convivendo. Eles podem fazer toda logística de um crime dentro de casa, livre do monitoramento que é feito dentro de uma unidade prisional”, explicou.

O primeiro preso a ganhar uma tornozeleira eletrônica no Piauí conseguiu, em menos de dois dias, tirar o equipamento e sair livremente pelas ruas de Teresina.

O reeducando Vando Bezerra Gomes, 33, contou que retirou a tornozeleira sem dificuldades porque se sentiu incomodado com o aparelho para dormir. Ele havia sido preso acusado de assalto à mão armada, furto qualificado e arrombamento, e estava ainda na Central de Flagrantes de Teresina quando foi beneficiado com a tornozeleira eletrônica.

Já o reeducando Francisco Robert Mendes, que estava preso na Casa de Custódia, em Teresina, é acusado de cometer assaltos no mesmo dia que saiu da prisão usando a tornozeleira eletrônica. Ele retirou o equipamento e saiu para cometer os delitos no último dia 29. O cinto da tornozeleira foi cortado e abandonado na casa dos pais do reeducando.

Para o sindicato, a implantantação das tornozeleiras eletrônicas não contribuiu para diminuir a superlotação nos sistema prisional do Piauí.

“Não tivemos nenhuma mudança significativa para amenizar a superlotação nos presídios. Se teve o lado positivo, não foi sentido nada até agora com esses presos nas ruas”, disse o vice-presidente do Sinpoljuspi, Wellington Rodrigues.

Outro lado

A Sejus justificou que o valor pago por cada tornozeleira — R$ 580,00 — que está sendo questionando pela CGE, abrange a mobília e instalação de equipamentos de tecnologia avançada, sistema de internet, instalação de monitores portáteis nos carros da polícia, além de treinamento de pessoal, assistência técnica permanente, que somam o valor de R$ 290 mil mensal.

Sobre a eficácia das tornozeleiras eletrônicas, a Sejus informou que “os presos são monitorados em todo o Estado e na hora da violação, imediatamente a central acusa e a policia é acionada”.

A secretaria destacou que apesar do contrato do aluguel das tornozeleiras ter vigorado entre 12 de abril de 2013 com término em 12 de outubro de 2013, a execução dos serviços ocorreu entre os meses de maio e novembro.

Fonte: UOL