Presos pela Lava Jato desde o ano passado, os petistas José Dirceu e João Vaccari Neto sugeriram a correligionários que a sigla faça um acordo de “leniência partidária”.
Segundo relatos de pessoas que estiveram com o ex-ministro e o ex-tesoureiro do PT no último mês, a ideia teria surgido do próprio Dirceu e foi apresentada a ao menos a dois deputados do partido e a dois advogados que confirmaram à Folha terem abordado o tema com os petistas.
“Não sei se foi o Dirceu que pensou nisso, mas ele defende. Pensamos nessa possibilidade e em outras. A ideia é passar uma régua na história do PT, assumir a culpa e fazer com que isso se reflita nas pessoas físicas”, disse Roberto Podval, advogado do ex-ministro na Lava Jato.
A proposta consistiria em acordo seguindo o modelo de leniência feito por empresas, em que elas assumem crimes e são condenadas a pagar multas. Em troca, mantêm a possibilidade de fazer contratos com o governo e seus executivos podem aderir ao acordo, com diminuição de pena ou até perdão judicial.
A maior diferença entre leniência e delação é que a primeira é feita com empresas, e a segunda, pessoas físicas.
Segundo relatos de envolvidos no debate, a proposta, ainda incipiente, teria o objetivo de incluir não só o PT, mas todas as siglas comprometidas na Lava Jato.
A ideia é que a negociação seja comandada pela presidência da cada partido, que faria um relatório com informações reveladas aos procuradores, inclusive com fatos ditos por Dirceu e Vaccari.
Dessa forma, em troca de pagar multas e assumir os erros, os políticos envolvidos nos crimes receberiam benefício, como redução de penas.
O tempo na prisão é preocupação dos petistas, já que Dirceu é o réu da Lava Jato que recebeu a maior condenação em uma única ação –20 anos e dez meses. Vaccari foi condenado a mais de 24 anos em duas ações penais.
Essas penas não são definitivas, pois há processos em curso envolvendo ambos que ainda não foram julgados.
PRIMEIRA VEZ
Pela primeira vez desde que surgiram as acusações contra o partido no esquema de corrupção da Petrobras, petistas cogitam a possibilidade da sigla assumir delitos e fazer uma espécie de autocrítica. Até então, o PT nega todas as irregularidades.
A leniência também pode ser um meio do partido evitar que seja inviabilizado por dívidas, caso se torne alvo de novos processos.
A proposta, porém, não é consenso nem entre petistas. Alguns acham impossível que ela avance porque as demais siglas não a apoiariam.
O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) faz parte do grupo que não acredita no acordo. “Não vejo sentido, já que não temos notícia de que políticos do PT agiram para beneficiar empresas em troca de dinheiro e vemos as atividades do Vaccari como legais.”
Ele visitou os petistas presos na última quinta (9), mas disse que nunca debateu o assunto com eles ou com o PT.
Três advogados com experiência em acordos de delação e leniência ouvidos pela Folha afirmaram não ver empecilhos para partidos fazerem esse tipo de negociação.
“Não há vedação expressa a partidos, mas a lógica das disposições legais remete a empresas”, avalia Rogério Taffarelo, especialista em direito penal econômico.
O advogado de Vaccari, Luiz Flávio D’Urso disse que nunca falou do assunto com seu cliente.
O presidente do PT, Rui Falcão, não quis se manifestar.
Procuradores da Operação Lava Jato questionados pela Folha sobre a possibilidade de acordos de leniência serem negociados com partidos políticos afirmaram “não haver espaço para isso”.
Hoje, a avaliação do Ministério Público Federal e da Procuradoria-Geral da República é que nomes como de Vaccari e Dirceu têm mais serventia à operação como exemplos do que como colaboradores.
Os investigadores também defendem que não há espaço para anistia ou benefícios de redução de pena dos dois envolvidos nas investigações, principalmente por não existir “clima político para isso”.
No entanto, os procuradores acreditam que é provável que o PT e outros partidos tentem se salvar e reduzir as penas de seus filiados por essa via, já que boa parte dos políticos implicados na Lava Jato estão condenados, respondendo a processos ou sendo investigados.
João Vaccari está preso desde abril do ano passado, e José Dirceu desde agosto. O primeiro é acusado de corrupção, lavagem e associação criminosa. O segundo, de formação de quadrilha, corrupção e lavagem de dinheiro.
Fonte: Uol