SEMANÁRIO JURÍDICO. EDIÇÃO DE 18.02.2022.
JOSINO RIBEIRO NETO
PRINCÍPIOS JURÍDICOS E A METODOLOGIA DO DIREITO.
Doutrinadores afeitos ao estudo da Ciência Jurídica afirmam que os PRINCÍPIOS DE DIREITO (OU JURÍDICOS, como queiram), ocupam posição de base, isto é, central, na metodologia do direito, unindo em torno do mesmo rumo, ainda que com paisagens distintas, a ciência e a prática.
A coluna, com relativa frequência, tem divulgado e comentado, sem maiores pretensões, algum princípio jurídico, escolhendo sempre os de maiores destaques, portanto, de interesse de todos os operadores do direito.
Nesta edição segue breve comentário acerca do PRINCÍPIO DE ACESSO À JUSTIÇA, que tem como alicerce a regra posta no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito.”
No estudo da matéria é oportuna a lição do doutrinador Flávio Galdino (DICIONÁRIO DE PRINCÍPIOS JURÍDICOS, ed. Campus Jurídico, p.14):
”O acesso à justiça pode ser considerado um dos temas centrais da moderna Teoria do Direito. Com efeito, a questão de saber a amplitude e a extensão dos poderes dos órgãos jurisdicionais – em uma palavra a justiciabilidade – , notadamente no que diz respeito à tutela de direitos fundamentais, constitui um dos temos centrais dos estudos jurídicos do nosso tempo. Há notória preocupação em evitar que barreiras consideradas iníquas ( econômicas, sociais, etc.) impeçam a tutela dos direitos.”
Em sede de comentário histórico, registre-se a importância de como o tema foi tratado na Constituição de 1946, que numa resposta ao autoritarismo do regime Vargas, incluiu a garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional – ou princípio da ubiguidade da jurisdição – conforme constou do art. 141, § 4º, da referida Carta Federal.
Este avanço, em sede da prestação jurisdicional e, de resto, da garantia de acesso à justiça, foi sem dúvida, sobretudo pelo momento, a mais importante contribuição assegurada pela Constituição Federal de 1946.
Concluindo, ainda é oportuna lição de a lição de Flávio Galdino (ob. cit. pgs. 27 e 28):
“Embora moldado a partir de várias premissas diferentes, verificou-se uma construção competente consistente do princípio do acesso à justiça, que funciona hoje como matrtiz metodológica da ciência processual, como base constitucional no art. 5º, XXXV, CF.”
DIREITO CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NÃO EDIFICADO. CONEQUENCIAS.
A matéria relacionada com as consequências de resilição contratual (arrependimento) de parte do promitente comprador, especialmente, em Teresina – Pi., cujas relações contratuais de venda de imóveis são cada vez mais crescentes, haja vista a expansão da cidade, merece especial destaque.
A propaganda na imprensa, noticiando a venda de terrenos loteados, de prédios de apartamentos, conjuntos de casas residenciais, anima o consumidor, que as vezes, à guisa de investimento, se lança a adquirir imóvel anunciado, depois se arrepende, em especial, por não suportar o pesado ônus financeiro das prestações.
A coluna nesta edição trata das consequências da rescisão do contrato de compra de terreno não edificado, por razões de conveniência do comprador, no caso, impostas pela empresa promitente vendedora.
Uma das exigências do vendedor é o pagamento da taxa de ocupação, de retenção de elevado percentual das quantias pagas, além da não devolução das arras confirmatórias.
A jurisprudência, em especial, dos julgados do Superior Tribunal de Justiça, já sedimentada, isto é, repetida sem discrepância, onde em situações semelhantes entende o seguinte:
1. TAXA DE OCUPAÇÃO, cobrada sob a alegativa do proveito auferido pelo promitente comprador, que teve a posse do terreno. Entende o STJ: “não há enriquecimento sem causa no caso do terreno não edificado, pois o comprador não pode residir no imóvel, devendo ser afastada a cobrança da taxa de ocupação do bem” (Agint no REsp 1896690/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 23/08/2021, DJe 16/08/2021).
2. Devolução integral dos valores pagos pelo promitente comprador à guisa de arras confirmatórias.
3. Retenção do percentual de 25% da quantia paga, para indenizar o construtor das despesas gerais e desestimular o rompimento unilateral do contrato.
É basicamente este o entendimento do STJ no caso de rescisão imotivada de parte do promitente comprador. Segue a transcrição de decisão recente, que trata da matéria:
“AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. RESCISÃO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA PELO PROMITENTE-COMPRADOR. ARRAS CONFIRMATÓRIAS SEGUNDO O ACÓRDÃO. DEVOLUÇÃO INTEGRAL. NECESSIDADE DE REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. ANÁLISE DE DISPOSITIVO CONTRATUAL. ENUNCIADOS 5 E 7/STJ. TAXA DE OCUPAÇÃO. INVIABILIDADE. TERRENO NÃO EDIFICADO.
SÚMULA 83/STJ. DATA DA RESCISÃO. SÚMULA 284/STF. PRINCIPIO DA CAUSALIDADE. SUCUMBÊNCIA. SÚMULA 7/STJ. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM EM DESACORDO COM JURISPRUDÊNCIA DA SEGUNDA SEÇÃO FIXANDO EM 25% PERCENTUAL DE RETENÇÃO PELO DESFAZIMENTO. ESTIPULAÇÃO ANTERIOR A LEI 13.786/2018. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Assentado pelo acórdão recorrido que as arras são confirmatórias, e ausente qualquer menção a direito de arrependimento, fica obstado a esta Corte concluir, no âmbito do recurso especial, pelo caráter penitencial das arras, por demandar incursão no contexto fático-probatório e análise de disposição contratual. Incidência das Súmulas 5 e 7/STJ.
2. De acordo com a jurisprudência desta Corte, “o arrependimento do promitente comprador não importa perda das arras, se forem confirmatórias, admitindo-se, contudo, a retenção, pelo vendedor, de parte das prestações pagas, como forma de indenizá-lo pelos prejuízos suportados” (AgInt no AREsp 1.273.751/DF, Relator o Ministro Antonio Carlos Ferreira, DJe de 1º/8/2018).
3. Consoante entendimento desta Corte, “não há enriquecimento sem causa no caso de terreno não edificado, pois o comprador não pode residir no imóvel, devendo ser afastada a cobrança da taxa de ocupação do bem”(AgInt no REsp 1896690/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 23/08/2021, DJe 26/08/2021).
4. No presente caso “o terreno não está edificado, de modo que não existe possibilidade segura e concreta, diante dos fatores anteriores ao momento da contratação e sem qualquer outra nova interferência causal, de que a recorrente auferiria proveito com a cessão de seu uso e posse a terceiros, se não o tivesse concedido à recorrida, estando, pois, ausente o requisito de seu empobrecimento; tampouco seria possível o enriquecimento da compradora, que não pode residir no terreno não edificado” (REsp 1863007/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/03/2021, DJe 26/03/2021).
5. Tratando-se de recurso interposto pela alínea “c”, deve o recorrente comprovar, analiticamente, que os acórdãos confrontados deram ao mesmo artigo de lei interpretações divergentes. Descumprido tal requisito, incide, por analogia, a Súmula n. 284/STF.
6. A revisão da conclusão a que chegou o Tribunal de origem (acerca do fato de que foi a parte agravada quem deu causa para o ajuizamento da demanda) exigiria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, providência inviável no âmbito do recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.
7. A incidência da Súmula n. 7/STJ impede o conhecimento do recurso lastreado pela alínea c do permissivo constitucional, uma vez que falta identidade entre os paradigmas apresentados e os fundamentos do acórdão, tendo em vista a situação fática de cada caso.
8. A Segunda Seção desta Corte, no julgamento do REsp n. 1.723.519/SP, consolidou a orientação de que, nos casos de desistência imotivada pelo comprador de imóvel, não havendo nenhuma particularidade que justifique a redução, deve-se estabelecer a retenção de 25% (vinte e cinco por cento) dos valores pagos para indenizar o construtor das despesas gerais e desestimular o rompimento unilateral do contrato.
9. Agravo interno parcialmente provido para dar parcial provimento ao recurso especial e fixar em 25% (vinte e cinco por cento) a retenção sobre os valores pagos pelo recorrido.
(AgInt no REsp 1930685/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/10/2021, DJe 19/10/2021)