Falta de interesse, poucas parcerias e medo. Essas são algumas razões para que apenas 19% dos 496.251 presos brasileiros trabalhem e só 8% deles estudem. Números que deveriam aumentar por um punhado de motivos. Ao ter uma ocupação, os detentos ganham dinheiro, aprendem uma profissão, recuperam a auto-estima e ainda desafogam os presídios, já que a pena é reduzida para quem trabalha e estuda.
A obrigatoriedade para que todas as unidades prisionais brasileiras ofereçam cursos profissionalizantes e oportunidade de emprego aos detentos está na LEP (Lei de Execuções Penais), que deixa claro: os presos que trabalham têm sua pena reduzida em um dia para cada três trabalhados. Já os que estudam reduzem um dia para cada 12 horas de frequência escolar.
Responsável por organizar os cursos e as vagas de trabalho para os presos de todo o Estado de São Paulo (que concentra o maior número de detentos do país: 170.916), a diretora-executiva da Funap (Fundação de Amparo ao Preso), Lucia Casali, fala da dificuldade de conseguir professores para dar cursos em algumas unidades.
– Os professores têm medo de ir trabalhar nos presídios. Em Guarei (perto de Sorocaba), […] tem curso sem professor há seis meses. Eles acham perigoso e reclamam do salário.
Tanto as vagas de trabalho como os cursos profissionalizantes e de alfabetização são oferecidos nos presídios por empresas das iniciativas pública e privada, que firmam contrato diretamente com os Estados. Como essas parceiras desembolsam 75% do salário mínimo para cada detento e não precisam recolher encargos trabalhistas, como FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), muitas delas procuram as secretarias de segurança pública estaduais mais interessadas em mão de obra barata do que na recuperação de presos.
– Tem muito empresário que procura a gente porque pensa na mão de obra barata. Ao longo do tempo que estou aqui, eu rescindi mais de 2.000 contratos com esse perfil.
No Mato Grosso do Sul, onde 4.257 presos trabalham e 986 estudam, o empresário Edson Germano emprega 20 detentas no presídio feminino de Campo Grande. Dono da Agosto Uniformes, já passaram por sua confecção 170 pessoas nos quatro anos em que o projeto Vestindo a Liberdade funciona. Ele nega que tenha procurado o presídio em razão dos baixos salários.
– Eles [do Estado] me deram um espaço precário, mas botei tudo. Não me deram nem uma lata. A qualidade do serviço das presas é muito boa, mas não tem produção. Enquanto na fábrica as funcionárias produzem 10 mil peças por mês, na cadeia a média é de 3.000.
Germano paga R$ 423 para cada detenta, contra R$ 700 para quem trabalha em sua empresa. De acordo com o Ministério da Justiça, o salário dos presos vai direto para uma conta judicial, e só pode ser sacado quando o detento cumpre a pena ou quando a família ganha na Justiça o direito de resgatá-lo.
Mas se a produção é baixa, por que empregar detentas?
– O presídio reflete a sociedade, que é hipócrita e não faz nada. Dá para trabalhar, profissionalizar e ajudar alguém. A gente cobra muito do poder público, mas somos nós que temos de fazer alguma coisa. A gente recupera o preso e a auto estima da família dele.
É o que aconteceu com Hélvio Antônio Antunes, ex-presidiário de 37 anos, que reduziu cinco anos de sua pena de 15 estudando e trabalhando enquanto esteve preso. Recuperado, faz arte com sucata e dá aula de solda para detentos em uma unidade da própria Funap em Taubaté, a 130 km da cidade de São Paulo.
– Eu não consigo ficar um dia sem trabalhar. O que eu digo para os outros presos é que trabalho e estudo podem fazer uma vida recomeçar.
Essa é a mesma opinião da diretora da Funap, que admite que o número de estudantes e trabalhadores presos ainda é pequeno:
– O meu sonho é que, em dez anos, 50% dos presos em São Paulo trabalhem.
Ela lembra que a redução da pena para esses casos também ajuda a diminuir a superlotação das cadeias, mas lamenta o fato de que muito preso não trabalha porque não quer.
– O preso quer primeiro lazer, a segunda preferência deles é visita, depois vem trabalho e, por último, educação.
Fonte: r7.com