O progresso que desumaniza

Capitulo IV

                               Beira do Rio

O passado

As ruas são os nossos sentimentos… E o carro, ah, o carro é a armadura que reveste nossos tolos corações, a mil batidas entusiasmadas e eufóricas! Juntos, eu e mais quatro amigos de infância (e em plena adolescência), percorremos a cidade de Parnaíba, pela noite, a procura de lugares e situações que possam alimentar os nossos mais jovens desejos: de sorrir e de se divertir “aos montes”.

Depois de trafegar pelas praças, avenidas e bairros, num clássico Monza, e ao som do rock brasileiro e do gringo, com nossas mentes leves, cantando – para todos e para o vento – canções de lealdade, mexendo com os casais de namorados, com os ciclistas e tantos outros, alcançamos a Beira do Rio – Point da garotada – lugar onde a “noitada” começa, para em seguida, e dependendo de cada tribo, despencar a procura: da boate, da festa de rock, do barzinho, da praia.

E eis que, ainda na Beira- Rio (e já ao final dela, a parte menos iluminada), nós avistamos alguns indivíduos, em atitude um tanto suspeita, protegidos pela ausência de lâmpadas e postes de luz, tentando disfarçar e esconder um cigarro, porém, sem sucesso, pois num ambiente tão escuro como esse, a brasa fica difícil de não ser notada.

Um dos meus amigos, o mais “louco”, resolve colocar a cabeça para fora e gritar obscenidades… Foi o suficiente para que os ocultos indivíduos, talvez por pensarem que pudesse se tratar da policia, logo se amedrontem, rebolando o cigarro em direção ao rio…

Os dias atuais

Dirijo em direção a escola onde ensino. É noite, e carrego na alma um profundo sentimento de pesar… Há apenas dois dias, eu perdi um aluno: Mais uma vitima do envolvimento com drogas. Porém, antes que eu possa chegar a Unidade Escolar, e por ainda ter alguns minutos antes que o turno inicie, eu resolvo seguir em frente e alcançar a “velha” Beira Rio.

Como é inicio de noite (e de semana), a juventude que geralmente freqüenta a Beira Rio, não se encontra, presencio apenas as ruínas do que um dia foi o Clube Igara. Avisto uma AABB quase que abandonada, como também alguns bares “das antigas” e outros que nem existiam na década de 90.

Lembro dos meus amigos, e de como (hoje) cada um vive a sua própria vida, em sua própria cidade, em seu próprio ritmo, sua própria freqüência, em seu próprio progresso: intelectual, profissional e pessoal. Um sentimento nostálgico percorre o meu ser, pensando em como seria bom entrar novamente naquele Monza, conversar sobre os medos e os sonhos, vontades e verdades… E me pego, levemente sorrindo, quando recordo o dia em que assustamos, “sem querer, querendo”, os tais indivíduos ocultos…

Ah quem dera, se as drogas ainda fossem coisa de um fim de semana, de pequenos grupos, de uma simples brasa na escuridão… Não, hoje não é mais assim. As drogas já se multiplicaram, se diversificaram, invadindo lares (de ricos e pobres), roubando vidas (de crianças e adolescentes), transformando adultos (em marginais e traficantes)… Que acabam provocando Medo, ao invés de antes, quando eles tinham Medo…

É quando fico a observar, da beira do rio, tentando entender, e com o punho cerrado, por que as coisas só pioram?

                                                                                                              Claucio Ciarlini Neto