Encerradas as convenções partidárias para definição das chapas presidenciais neste domingo, o desenho das candidaturas que vão disputar a eleição em outubro ficou mais definido. Faltando apenas dois meses para o primeiro turno, porém, nenhum concorrente desponta como franco favorito e a incerteza sobre quem passará para o segundo turno segue alta.
Foram confirmados 13 concorrentes ao Palácio do Planalto, o que torna essa eleição presidencial a mais fragmentada desde 1989, quando houve 22 candidatos. Entre eles, está o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi lançado pelo PT apesar de estar condenado em segunda instância e, portando, inelegível segundo a Lei da Ficha Limpa.
É ele que lidera as pesquisas de intenção de voto hoje, mas sua candidatura provavelmente será barrada pela Justiça Eleitoral. O ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad foi apontado como vice, aumentando a expectativa de que seja o plano B petista quando Lula for impedido de concorrer.
Sem Lula na disputa, quem aparece em primeiro lugar nas pesquisas é o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL), mas ele não conseguiu costurar alianças com partidos relevantes, amargando um estrutura nanica para encarar a campanha nacional. Após muita dificuldade em encontrar um vice, o candidato anunciou neste domingo o general da reserva Hamilton Mourão (PRTB), também de perfil conservador, como seu companheiro de chapa.
Outra que aparece bem nas pesquisas, mas também não conseguiu atrair apoio relevantes para sua candidatura é a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, que concorrerá pela Rede ao lado de Eduardo Jorge, do PV.
Já o ex-governador de São Paulo e agora candidato pelo PSDB, Geraldo Alckmin, que aparece com menos de 10% nas pesquisas, foi o grande vitorioso desse período de convenções ao costurar uma ampla aliança com mais nove partidos – DEM, PP, PR, SD, PRB, PTB, PSD, PPS e PHS. Essa coligação lhe dará uma grande estrutura de campanha e o maior tempo de propaganda em rádio e TV para tentar alavancar as intenções de voto. Sua companheira de chapa será a senadora de perfil conservador Ana Amélia (PP-RS).
Em meio a essa cenário incerto, entenda abaixo o que pode fortalecer ou dificultar o caminho dos principais concorrentes.
Esquerda se fragmenta e ‘plano B’ de Lula começa a se delinear
Enquanto a maior parte das siglas de centro-direita conseguiu entrar em um acordo em torno de Alckmin, as legendas posicionadas hoje na centro-esquerda não conseguiram consolidar suas forças em uma candidatura.
Para cientistas políticos ouvidos pela BBC News Brasil, o grande número de candidatos disputando o eleitor mais à esquerda cria o risco de nenhum deles conseguir reunir os votos suficientes para chegar ao segundo turno.
O PT, que normalmente centraliza as alianças nesse campo, teve dificuldades em atrair aliados ao não abrir mão da incerta candidatura Lula, mas acabou assegurando o apoio de PC do B, que desistiu da candidatura de Manuela d’Ávila, Pros e PCO.
No fim, a acabou sendo registrada uma chapa “puro sangue”, com Fernando Haddad como vice, o que elevou as apostas de que ele vá assumir a cabeça de chapa quando a candidatura de Lula for impugnada – segundo o PT, o ex-prefeito de São Paulo atuaria como “porta-voz” do ex-presidente e seria substituído mais adiante por Manuela.
O PT tem até dia 15 de agosto para registrar Lula candidato no Tribunal Superior Eleitoral, quando então será aberto um processo para impugnar sua candidatura que pode durar algumas semanas. Depois disso, o partido ainda poderá recorrer ao Supremo Tribunal Federal.
No entanto, o prazo final para trocar o candidato é 17 de setembro. Se não houver uma decisão final da Justiça até lá e o PT decidir insistir em Lula, o partido correrá o risco real de a candidatura ser impugnada mais à frente e ficar sem candidato na eleição.
As sondagens de intenção de voto hoje mostram Haddad com apenas 1%. Cientistas políticos se dividem sobre as chances de crescimento do ex-prefeito, já que é muito difícil prever qual será a capacidade de transferência de votos de Lula, que hoje tem cerca de 30% nas pesquisas.
“Esse potencial de transferência é uma incógnita. A tarefa fica mais difícil com Lula preso”, nota Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
O PT ainda conseguiu isolar o candidato do PDT, Ciro Gomes, ao fechar acordos regionais com o PSB em troca de uma neutralidade da legenda no campo nacional. Assim, o partido de Lula pode ter conseguido evitar o fortalecimento de uma sigla que ameaçasse sua hegemonia no campo da esquerda. Por outro lado, o campo ficou sem um candidato com chances claras de chegar ao segundo turno.
Gomes acabou optando por Kátia Abreu como vice. A senadora do Tocantins, ex-ministra de Dilma Rousseff, entrou no PDT após romper com seu partido anterior, o MDB, durante o processo de impeachment.
Alckmin sai fortalecido, mas ainda enfrentará obstáculos
Do ponto de vista das condições materiais de campanha, o saldo das convenções partidárias é amplamente favorável a Alckmin, observam os analistas entrevistados.
“O número de partidos em torno do tucano é muito grande. Ele é certamente o nome mais competitivo”, acredita Andréa Freitas.
“A disputa presidencial é casada com eleição para governos estaduais, Senado, Câmara dos Deputados e assembleias legislativas. A aliança ampla significa que Alckmin terá mais candidatos a diferentes cargos pedindo voto para ele pelo Brasil. Além disso, garante um tempo grande de propaganda na TV”, explica Tadeu Monteiro.
Estimativas do jornal Folha de S.Paulo indicam que Alckmin terá o maior tempo de TV disparado, com cerca de 44% de todo o espaço da propaganda eleitoral, que dura 35 dias. Isso representa 5 minutos e 32 segundos por bloco de 12 minutos (são seis blocos por semana para a campanha presidencial).
Os candidatos terão também direito a inserções de 15 ou 30 segundos de duração ao longo da programação. A Folha de S.Paulo calcula que a ampla coligação garantirá a Alckmin cerca de 12 inserções de 30 segundos a cada dia, por emissora. O candidato do PT e Henrique Meirelles terão quatro cada um. Já Marina Silva terá apenas uma por dia, enquanto a situação de Jair Bolsonaro é ainda pior: uma inserção a cada três dias.
O tempo oficial de propaganda será definido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na segunda quinzena de agosto, após o registro de todas as candidaturas.
Um obstáculo importante para Alckmin, porém, é o forte sentimento anticorrupção e de decepção dos brasileiros hoje com a política tradicional. Seu partido foi duramente atingido pela operação Lava Jato, principalmente o ex-presidente do PSDB, senador Aécio Neves, gravado pedindo R$ 2 milhões ao executivo Joesley Batista.
Além disso, os partidos que apoiam a candidatura do ex-governador de São Paulo também têm muitos quadros investigados e estão hoje na base de apoio do impopular governo Michel Temer.
“Alckmin não incorpora esse desejo pelo novo. Acusações de corrupção vão ser pedra no sapato do candidato”, afirma Tadeu Monteiro.
O cientista político Rafael Cortez, da Consultoria Tendências, ressalta que a fragmentação também no campo da direita é outro fator que dificulta a vida do tucano. Além de Bolsonaro, que atraiu votos de um eleitorado mais conservador que vinha votando no PSDB nas últimas eleições, Alckmin disputará eleitores com Henrique Meirelles (MDB) e Álvaro Dias (Podemos).
“Os dois não parecem ter condições de crescer, mas, num cenário muito disputado entre outros nomes, podem tirar de Alckmin votos essenciais para ele chegar ao segundo turno”, ressalta o analista da Tendências.
Isolamento testará resiliência de Bolsonaro e Marina
No sentido oposto de Alckmin, Jair Bolsonaro e Marina Silva incorporam hoje um discurso anticorrupção, mas terão estruturas nanicas de campanha. Com reduzida capilaridade nacional e pouquíssimo tempo de propaganda eleitoral, não terão muito espaço para expor suas ideias ao mesmo tempo que ficarão expostos ao ataque dos adversários.
Bolsonaro tentou atrair o senador capixaba Magno Malta para sua chapa, de olho no tempo de TV e estrutura partidária do PR, mas a negociação fracassou. Depois, tentou emplacar dobradinha com a jurista Janaina Paschoal, professora da USP que se notabilizou por ser uma das autoras do pedido de impeachment contra Dilma Rousseff e poderia dar um viés um pouco menos radical a sua candidatura. Acabou ficando com o general Hamilton Mourão, do nanico PRTB.
“É um vice de extrema-direita que mais reforça o eleitorado conservador que ele já tem do que agrega novos votos”, nota Cortez.
Apesar disso, suas chances de chegar ao segundo turno não estão descartadas pelos analistas ouvidos pela reportagem. Isso porque, num cenário de fragmentação da disputa, aumenta a possibilidade de um candidato passar para etapa final mesmo sem alcançar um percentual tão alto de votos. Vale lembrar que em 1989, Lula ficou em segundo lugar com apenas 16%.
“Bolsonaro tem aparecido com consistência nas pesquisas na casa de 17% a 20% das intenções de voto. Seu radicalismo pode dificultar que ele cresça além disso, mas, se não perder votos, tem fortes chances de estar no segundo turno”, acredita Monteiro, ressaltando ainda a força do candidato do PSL nas redes sociais.
O cientista político da Uerj lembra que a reforma política aprovada em 2015 deixou a campanha desse ano mais curta, o que tende a favorecer os que partem de um patamar mais alto nas pesquisas, caso de Bolsonaro e Marina.
A candidata da Rede, porém, parece mais fraca nessa eleição do que nas duas últimas, em que terminou em terceiro lugar (2010 e 2014), observa a professora da Unicamp Andréa Freitas. Nos dois pleitos anteriores, Marina concorreu por legendas maiores, PV e PSB, respectivamente.
“Em 2014 ela assumiu após a morte de Eduardo Campos, o que lhe deu grande visibilidade e fez ela disparar nas pesquisas. Ainda assim, acabou perdendo fôlego na campanha. A última eleição mostrou que ela não é tão competitiva”, acredita.
Fonte: BBC News