A psicóloga Nayara Paula, que há seis meses busca trabalho em São Paulo (Foto: Arquivo Pessoal)
A psicóloga Nayara Paula, que há seis meses busca trabalho em São Paulo (Foto: Arquivo Pessoal)

Nayara Paula, 24 anos, faz parte do grupo de quase 13 milhões de desempregados no país. Formada em psicologia, com estudo de sobra e uma prova de mestrado nos planos, a mineira está há seis meses em São Paulo e, sem conseguir um emprego fixo para se manter, passou a oferecer serviços de limpeza e de babá nas redes sociais.

A dificuldade de inserção no mercado de trabalho, cada vez mais restrito e exigente, não é uma realidade só para Nayara, nem para os outros milhões de brasileiros que, com o agravamento da crise na economia, engordaram a fila de desempregados.

No entanto, para mulheres, a entrada ou a recolocação no mercado de trabalho tende a ser ainda mais custosa. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), a taxa de desocupação entre as mulheres com mais de 14 anos continua acima do índice geral, que inclui os dois gêneros.

No primeiro trimestre de 2012, quando a pesquisa do IBGE começou a ser feita, o índice de desemprego era de 7,9% no país. Para homens, a taxa era de 6,2% e, para mulheres, de 10,3%. Com o passar dos anos, as diferenças, timidamente, foram diminuindo, mas seguem altas. No último trimestre do ano passado, de acordo com os dados mais recentes, o índice de desocupação havia chegado a 12% no Brasil. Para os homens, era de 10,7% e para as mulheres, de 13,8%.

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“A gente acompanha a participação da mulher desde 2012 e o que a gente mostra é que todas aquelas mazelas já conhecias com relação à mulher no mercado permanecem. Elas têm dificuldade de entrar, a taxa de desocupação é maior, estamos vivendo uma recessão onde tem 12 milhões de pessoas desocupadas, e parte expressiva é de mulheres”, disse Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Renda do IBGE.

Condição desigual

O debate sobre desigualdade no mercado de trabalho ganha força nesta quarta-feira (8), Dia Internacional da Mulher.

O nível da ocupação (que mede a parcela da população ocupada em relação à população em idade de trabalhar) na análise entre gêneros também é distinta e menos favorável às mulheres. Em 2012, o percentual era de 56,3% no país – o número relativo aos homens era de 68,5% e o de mulheres, 45,2%. Quatro anos depois, o nível de ocupação havia recuado para 54%, sendo 64,3% entre homens e 44,5%, entre mulheres.

“As mulheres têm mais dificuldades do que os homens. Numa firma pequena [em plena crise], imagine um homem e uma mulher [funcionários]. Imagine que essa mulher tem 24 anos e o homem, 28. Ela pode engravidar, terá de ficar de licença, outro funcionário ser contratado… Para não ter esse ‘custo’, a empresa acaba preferindo contratar um homem”, afirmou Azeredo.

A recessão na qual o país mergulhou também contribui para que mais mulheres ficassem fora do mercado ou que recorressem a outras ocupações.

“Tanto a taxa de participação masculina quanto feminina piorou. Mas o que observo é que no início da crise, a partir de 2014, a desocupação estava mais focada em setores masculinos, como indústria e construção. Mais recentemente, tem havido um movimento em setores mais característicos entre mulheres, como comércio e serviços”, disse Ana Luiza Neves de Holanda Barbosa, técnica de Planejamento e Pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), todos os setores da economia fecharam vagas no ano passado. O setor de serviços foi o que mais cortou empregos: 390.109. Na sequência, estão a construção civil, com 358.679 e o comércio, com 204.373 mil.

Para Onofre Portella, professor de Economia das Faculdades Integradas Rio Branco, toda crise tende a acirrar as tensões existentes na sociedade e, particularmente, no mercado de trabalho. “Como exemplo dessas ‘tensões’, temos: o percentual de carteira assinada junto às mulheres é inferior ao dos homens. A diferença entre os rendimentos de homens e mulheres é maior entre os mais escolarizados. A remuneração das mulheres com curso superior é, em média, 40% inferior à dos homens.”

Trabalho doméstico temporário

Com menos vagas e salários menores, muitas mulheres têm recorrido à oferta de trabalhos domésticos, ainda que temporariamente. “A iniciativa de procurar trabalhos paralelos não é de agora, precisei trabalhar em serviços noturnos durante toda a minha graduação, que era integral. Mas, me oferecer para fazer faxina é novo e faz parte do desespero que vai batendo à porta. Não que eu esteja desmerecendo tais profissões, é que seria hipócrita ao dizer que essa seria minha primeira ou segunda opção, depois de tantos anos me dedicando a outra coisa“, contou a psicóloga.

Ainda assim, a demanda pelo serviço está fraca, segundo Nayara. “Não tem surgido nada, e aí não sei te responder qual o motivo…Talvez pela grande oferta…Participo de grupos de frilas e faxinas e quando aparece um anúncio de procura, existem mais de 70 respostas de pessoas se oferecendo para a vaga, então tudo acaba sendo muito rápido. Tenho colegas com mais qualificação que eu, já com o mestrado, por exemplo, que estão passando roupa para conseguir se manter. Acredito que a situação esteja, de fato, muito difícil.”

“Com essa crise, a participação do trabalho doméstico subiu por falta de opção em outros setores – coisa que a gente não via antes. À medida que entra no processo de recessão, elas voltam para o trabalho doméstico. Isso vai acontecer até que tenha um reestabelecimento do cenário macro e um processo de geração de vagas que permita essa migração do trabalho doméstico”, analisou Azeredo.

Depois de o número de trabalhadores domésticos cair entre 2013 e 2014, de acordo com o IBGE, em 2015 e 2016, o contingente voltou a crescer. O ano passado encerrou com 6,108 milhões de domésticos. Desse total, apenas 1,946 milhão tinham carteira assinada.

A professora Luciana Martins e seus dois filhos. Perdeu emprego em 2015 e trabalha hoje com decoração de festas. (Foto: Arquivo Pessoal)
A professora Luciana Martins e seus dois filhos. Perdeu emprego em 2015 e trabalha hoje com decoração de festas. (Foto: Arquivo Pessoal)

Alternativas

A professora Luciana Martins da Cunha Silva, 38 anos, também está desempregada, mas tem tentado buscar alternativas no microempreendedorismo. “Sou professora formada, lecionava antes e, mesmo durante as aulas, que estavam escassas, eu complementava a renda com decoração de festas. Hoje, só trabalho com isso. Ou seja, o que era complemento passou a ser renda principal. Mesmo assim, não tem suprido as minhas necessidades familiares”, contou.

Casada e mãe de dois filhos, Luciana ainda procura um serviço fixo para conciliar com a sua microempresa e dar início a uma “quarta jornada”. “A vida está cara, e isso faz com que a gente passe a maior parte do tempo buscando o bem-estar das nossas famílias. Mas acredito que seja um desafio não tão impossível, porque eu sou mulher e mulher tem essa habilidade de fazer várias coisas ao mesmo tempo.”

Fonte: G1