DIACHO, PÔXA, É DO CARVALHO!

 

Vitor de Athayde Couto

 

Baixou no ambiente o espectro do Professor Virtual (PV). Ele ri por dentro, orgulhoso do conhecimento que lhe permite falar sempre alguma coisa na internet. O PV explicador faz cara de gente humilde e dá início à sua nobre missão:

 

– Explico. Em qualquer parnasia do Brasil é muito fácil encontrar um amontoado de escolas de nível dito superior a que as pessoas dão o apelido de Faculdades Mentais Imaginárias (FMI). Assim como eu e as FMI, existem muitos outros PV. E são milhares. Quando pelo menos duas FMI estão agrupadas, e pertencem ao mesmo dono, os jornalistas dão, ao conjunto da obra, o nome de universidade. Os donos das FMI até gostam, pois isso ajuda a divulgar e recrutar futuras vítimas que não zeraram a redação do “é nem”. Daí eles inventam uns nomes bem esquisitos para esses conjuntos: Uniisso, Uniaquilo, Universal, Unicórnio, Unidunitê… até Uniesquina. É imprescindível começar com “uni”.

 

O povo, induzido pela mídia mercenária, acaba acreditando que se trata mesmo de universidades. O ensino à distância (EAD) virou uma festa. Com custos e riscos menores, agora tem até aula de cirurgia de fígado pelo youtube. O datashow, que chegou a fazer sucesso nas oficinas de lavagem de carro, já era. Agora a moda são láives, ou seja, outras lavagens “celebrais” a jato. O Professor Virtual liga a câmera e se dirige aos futuros cirurgiões, assim: “E aí, galera! Tudo bem? Hoje nós vamos aprender como se faz uma cirurgia no fígado. Todo mundo tá ligado? Então… estão vendo?”

 

Graças às tecnologias digitais, quase todo dia tem formatura – o que explica a proliferação e os elevados rendimentos de uns ditos “empresários” que vendem mercadorias. Na verdade, são serviços que os parnasianos conhecem pelo nome de “eventos”. Esses “empresários” faturam muito com aluguéis de becas, capelos, “clínicas” de estética com bronzeamento artificial e depilação a laser, salões de festa, buffets, diplomas-de-mentirinha, placas de homenagens aos mestres-com-carinho, fotografias, vídeos, drones… Alugam até um tipo de som ao vivo, conhecido como “música”, só porque lembra algo próximo dos estilos bigwall e bigbeat universinejos.

 

– Diabéisso? – insiste o aluno que atende pelo apelido de estudante.

 

– Isso eu não posso responder, pois não frequento bigwalls nem bigbeats – disse PV, o Professor Virtual. Ele nunca hesita em dizer que não sabe, quando não sabe. Eis aí o maior sinal revelador do conhecimento.

 

– Guirindó disse que quem ensina a mentir são as nossas avós… Então…

 

– Pois bem – disse o PV explicador – e como é que criança aprende a falar? Ora, ouvindo e repetindo o que os adultos dizem. Logo, logo, aprendem a dizer diabo, palavra fácil de pronunciar. Os bebês ainda de fraldas adoram. Pois é nesse exato momento que as avós se metem, ralhando:

 

– Chhh… Não diga isso, menino! Não diga isso, menina!

 

Batalha perdida. Não tem jeito. Os adultos estão sempre a repetir o nome do diabo. Por essa razão, as avós nos ensinam a dizer a primeira mentira. Assim:

 

– Em vez de dizer esse nome feio, diga diacho – e se benzem.

 

Esse processo é igual a coceira. Começou, vai mentir a vida toda. Daí, aprende logo a dizer pôxa, do carvalho, pulga que partiu, caraca, bochecha… E quando quer cagar? Ahá, não pode dizer “quero cagar”. Tem que dizer “vovó, telo fazê um tôtôzinho”, muito provavelmente porque assim fede menos. Será?

 

– Então – continua o PV explicador – basta contar uma mentirinha de oito em oito minutos. Depois, uma mentira, até uma mentirona de verdade. Mas, se a criança cresce e escolhe ser político, evêm mentiras a cada quatro minutos. Infelizmente, na amostra da pesquisa inglesa sobre a mentira não havia sido sorteado nenhum político brasileiro.

 

– Por falar em político – continua insistindo o aluno – por que é que o diabo também se disfarça de político tranca-ruas?

 

– Primeiro vamos saber qual é o conceito de tranca-ruas – disse o PV explicador.

 

– Evém esse cara. Pensa que tá na academia de ciências e vem pra cá falando em conceito – pensou o aluno.

 

– Eu ouvi isso – retrucou o PV explicador encarando o aluno. Eu leio pensamentos. Mas, fique tranquilo. Em Parnasia tem muitas academias. Mas só tem academias de malhação, de boxe tailandês, tá-é-com-dor… Tem até academia do salgueiro! Os professores e os intelectuais em geral são coaches. Coach é o apelido usado para distinguir um tipo de ator social cada vez mais importante na vida dos parnasianos no atual processo de desenvolvimento (fisio)cultural. São os personal trainers. Então, vamos combinar assim: fica entendido que o tranca-ruas é um exu.

 

– Mas o que é um exu? – perguntou o aluno.

 

– Exu é um exu.

 

– Não entendi.

 

– Claro que não entendeu. A menos que se defina o conceito de exu, talquei? Mas vocês millennials acham que os conceitos não são mais necessários…

 

O aluno olhou em volta, à procura do seu celular do qual é dependente. Queria perguntar ao gúgli o significado de exu e millennials. Foi quando ele percebeu que o celular havia desaparecido em plena sala de aula da sua Universidade Imaginária (UI). Pronto, furtaram o celular. E com o celular levaram todo o seu conhecimento. Costuma-se dizer que em Parnasia os celulares são abduzidos. Desconfia-se que se trata da ação de marcianos comunistas, confinados em discos voadores provenientes de um planeta vermelho. Dizem que eles navegam sobre a terraplana durante 24 horas por dia. Todas essas informações rigorosamente “científicas” podem ser obtidas nas rádios e blogues locais, além de inúmeras láives disparadas dos gabinetes e laboratórios igualmente “científicos” de Virgínia, nos Estados Unidos.

 

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Escute o texto com a narração do próprio autor: