Autor de gol histórico vem da Guiné-Bissau, foi separado dos pais por falta de dinheiro e usa luva branca para pedir paz aos críticos. É o filho “adotado” de Portugal.
Éder saiu do banco de reservas para se tornar o herói improvável de Portugal na Eurocopa. Entrou em campo aos 33 minutos do segundo tempo e, aos 3 da segunda etapa da prorrogação, marcou o gol mais importante da história de sua seleção, que garantiu a vitória sobre a anfitriã França por 1 a 0 na final do torneio e o primeiro título de expressão dos lusos no futebol. Um prêmio para alguém que precisou ter muita força de vontade e dedicação para chegar aonde chegou. O mundo conheceu Éder mais de perto nesse domingo.
– É um momento fantástico. É inacreditável. Estou muito contente. Fizemos um ótimo trabalho durante esta Euro e estamos todos de parabéns – disse o atacante, completamente realizado, ao GloboEsporte.com após a partida.
Ederzito Antonio Macedo Lopes, ou apenas Éder, nasceu na Guiné-Bissau, país africano com cerca de 1,5 milhão de habitantes. Com apenas 3 anos, mudou-se junto da família para Lisboa. Pouco tempo depois, devido às más condições financeiras dos pais, foi levado para um orfanato em Braga, e logo em seguida para outro em Coimbra, o Lar Girassol. Foi lá que ele cresceu e tomou gosto pelo futebol. Portugal o “adotou”.
– Foi difícil de aceitar. Depois de um tempinho na instituição, comecei a me adaptar e vi que aquilo era o melhor para mim. Tenho uma série de boas recordações – afirmou o grandalhão de 1,88m em entrevista ao site “Mais Futebol” em 2013.
Durante infância e adolescência, Éder quebrou muitos vidros do orfanato com a bola até entrar nas categorias de base do ADC Adémia, onde ficou de 2000 a 2006. Naturalizou-se português e estreou como profissional pelo Oliveira do Hospital, hoje na Quarta Divisão de Portugal. Depois foi para Tourizense (2007), Acadêmica de Coimbra (2008 a 2012), Sporting Braga (2012 a 2015), e foi comprado pelo Swansea City, clube do País de Gales que disputa a Premier League. Aos 28 anos, o clone de Adebayor – como os amigos brincam – está emprestado ao Lille, da França, e atraiu os holofotes ao marcar o gol do título da Euro. Chance de sair?
– Esse gol representa muito, mas estou tranquilo. Tenho contrato com o Lille. Estou muito contente, e agora é desfrutar das férias. Mas antes, celebrar com os portugueses, desfrutar ao máximo, que é o mais importante.
Luva branca é pedido de paz aos críticos
A história de Éder na seleção portuguesa começou em 2012. Ele disputou a Copa do Mundo no Brasil em 2014 e a Eurocopa na França agora em 2016. Mas os números são fracos. Em quatro anos, participou de 29 jogos – contando amistosos -, apenas oito como titular, e fez quatro gols. Muito em função disso, ele constantemente sofre com as críticas, que também partem de torcedores dos clubes onde jogou. E a maneira que o atacante achou para enfrentar o problema foi bastante nobre: ele usa uma luva branca para comemorar seus gols, um pedido de paz aos “haters”.
– Tem a ver com toda a adversidade que ocorreu na minha vida. Trabalho da melhor forma para superar isso tudo. Desde criança supero algumas adversidades e isso tem sido muito importante para mim – explicou o jogador em coletiva de imprensa no início da Eurocopa.
O técnico Fernando Santos não deu bola para as constantes críticas e depositou confiança em Éder ao convocá-lo para a Euro. A recompensa veio de forma emocionante no Stade de France, com o camisa 9 marcando o gol do título.
– Quando o chamei, ele disse que ia fazer o gol. O patinho feio ficou bonito – brincou Fernando Santos, ironizando quem fala mal de Éder.
Assim como Éder, Portugal entrou na competição desacreditado pela maior parte da imprensa e até por sua própria torcida. Não fez jogos brilhantes, mas sobraram garra e espírito coletivo dos jogadores, que conseguiram superar até a perda precoce do lesionado craque Cristiano Ronaldo na final para ficarem com o título inédito.
– Perdemos um jogador importante naquele momento, o melhor jogador do mundo. É fundamental na nossa equipe. Mas, claro, sabíamos que somos 23, então tínhamos jogadores que poderiam continuar fazendo a diferença. (O título) É uma resposta para nós mesmos, para continuarmos a acreditar que não há nada impossível. Portanto, essa é a lição que temos que tirar – afirmou Éder.
Uma das grandes qualidades de Éder, segundo quem fez ou faz parte do Lar Girassol, é ter mantido a humildade. Sempre que pode ele volta ao orfanato para visitar aqueles que participaram diretamente de sua criação. Se antes já era ídolo dessas pessoas que o viram crescer e alcançar o sucesso, agora ele ganhou moral com o país inteiro. Gol de título, ainda mais o primeiro da história de um país, não é para qualquer um.
Fonte: Globo Esporte