MELHOR IDADE

Vitor de Athayde Couto

Ao completar 60 anos de idade, seu Alencar recebe a comunicação oficial de sua aposentadoria e vai comemorar. Como havia muitas opções e não podia lidar com todas, decide esquecer a artrite reumatóide e se dirige ao parque de diversões da cidade.
Na bilheteria lê o seguinte aviso:
“INGRESSO R$10,00
IDOSOS, ESTUDANTES, PROFESSORES E APOSENTADOS TÊM 50% DE DESCONTO”
Seu Alencar tinha acabado de se matricular num desses cursos de empreendedorismo, mesmo sem saber de quê nem pra quê. Afinal, ele só queria conhecer u’as mina novinha e nada melhor pra isso do que uma sala de aula de empreendedorismo. Doido pra inaugurar sua carteirinha de estudante, consegue provar que é mesmo estudante, com direito ao desconto de 50%, ou seja, cinco reais.
Como todo cearense gaiato, começa a fazer contas e a zoar com a cara da guicheteira que por sinal é muito bonita. Justificando ser idoso, reivindica mais cinco reais de desconto, totalizando dez reais. Aí, já quer entrar de graça, no que é vigorosamente impedido pelo porteiro sarado e tatuado com um gibi de tigres, dragões e outros super-heróis do mundo animal.
Diante da recusa, resolve apelar. Argumenta que tem direito a mais dois descontos por ser aposentado como professor. Logo, além de poder entrar de graça, ainda teria a seu favor um crédito de dez reais.
Impedido novamente de entrar, sem dinheiro e sem comemoração, seu Alencar volta pra casa a pé, devidamente conformado como concerne aos idosos brasileiros – o metrô zero oitocentos só vale pra quem já tem 65 anos ou mais. No meio do caminho seu Alencar é atropelado por um caminhão. Depois de ficar seis dias na UTI do HG, pelo SUS, sem RG e sem BO, seu Alencar acaba morrendo sem nunca ter sido reembolsado, digo, embolsado pelo dono do parque.
No seu túmulo lê-se “Aqui jaz o professor Raimundo Nonato Alencar”.
Na bilheteria do parque lê-se agora o cartaz atualizado, tendo-se acrescentado mais um tipo de beneficiário conhecido como cadiúnico, ou seja, beneficiário do programa de combate à pobreza, inscrito no cadastro único.
Enquanto isso, o diretor do banco social assedia as funcionárias subalternas que o chefe de gabinete cadastrou na sua agenda de trabalho. Enquanto isso, o povo de cabeça fraca já nem se lembra mais de tantos assédios. Enquanto isso, algumas crianças trocam figurinhas de jogadores da seleção de futebol. Enquanto isso…

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Ouça o texto narrado pelo próprio autor: