Ô CLASSE UNIDA!

 

Vitor de Athayde Couto

Era uma vez um país não tão distante assim. De vocação turística, as suas cidades litorâneas possuíam um cabaré em cada esquina. Certo dia, um cliente fiel…

– Peraí! Cliente de cabaré… fiel? Isso existe?

– Depende, hoje em dia, até cabaré tem cartão de fidelidade, desconto no Dia das Mães, Proclamação da República, cashback, Dia do Avô, Semana da Pátria, programa de milhagem… Tu podes pagar teu programa até com pix parcelado!

– Eita! Pois é, certo dia, um cliente fiel, de tão revoltado que estava, incendiou o maior cabaré do seu bairro, a famosa “Boate Rói Couro”. A multidão gritava, histérica: “Pega fogo, cabaré!” O que tinha de molé de cassóla e ômi de cueca bókiss pulando janela…

Horas depois, ao ser interrogado pela polícia, o cliente fiel afirmou que tinha sido enganado.

– Enganado por quem? – perguntou o delegado.

– Pela Madame – respondeu o cliente.

– Madame?

– Sim, madame, a dona do cabaré.

– Ah, sim – lembrou-se o delegado, com um sorriso treteiro – E o que ela fez?

– Cobrou o cachê adiantado, e foi muito desaforada porque não aceitava dólar. Só aceitava rublos, renminbis, kuais, units ou qualquer outra moeda do BRICS. Pagamento líquido, sem IOF, sem essa tal de comissão de SWIFT que alguns bancos inventam… E tem mais, ela cobrou muito caro por apenas meorinha de programa… uma meóta, rapá!, só porque era com uma japinha instagramável, bem novinha, segundo ela. Acontece que a japa era fake. Não passava de uma boneca inflável paraguaia, malmente tiktokável, e recém-saída de uma covid longa, cheia de efeitos colaterais, em estado avançado de TOC, com alto grau de TDAH, sempre em PLS, produzida por IA numa impressora 3D.

– Rapaz, no meu tempo, o máximo que podia acontecer era um couro roído aqui, um mofinho inocente acolá… Se fosse comigo, eu juro que também tacava fogo nesse cabaré – declarou o experiente delegado, cumprimentando o acusado, enquanto arquivava o processo.

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