O MENTIROSO DE PARNASIA
Vitor de Athayde Couto
Quando o maior mentiroso da cidade morre, logo aparece um substituto. O enterro de um grande mentiroso é sempre muito disputado. Todo mundo acorre, desde o velório. Querem ter certeza de que o morto tá bem morrido mesmo, mortim mortim. Ou então querem ver se ele vai levantar do caixão, a qualquer momento, dizendo com firmeza:
– Morri não! haha
Ninguém vai querer perder essa, vai? Enterro de mentiroso-celebridade só perde pra enterro de político, pois nesse campo a concorrência é muito grande. Lembra até aquele filme “O homem que amava as mulheres”, do genial Truffaut. O filme começa com o enterro de um cara muito malandro e muito bem dotado. Durante sua vida, ele enganou tanto a mulher que o seu funeral foi honrado por um número incalculável de amantes e piriguetes de toda ordem – o que confirma uma grande verdade científico-sertaneja: “amor de rapariga é que é amor” ou “só choro (mijo) por onde sinto saudade”.
Acontece que Galerão não era qualquer mentirosorréichinfrim. Ele era um mentiroso-celebridade muito especial, porque tinha uma grande particularidade: acreditava em tudo que ele mesmo dizia. “Juro pela mãe dele que é verdade!”. Se alguém duvidasse, rolava fáite. Por ser violento e ter porte de arma, ninguém duvidava de nada que ele dizia, fazendo arminha, mesmo sendo ele minúsculo. Talvez seja essa a origem da tal “verdade científica” haha.
Parnasia, é uma cidade “monarca de grande”. Lá, tudo é exagero. Parnasia aloja uma multidão de mentirosos. Por essa razão, a cidade ostenta uma densidade mitográfica equivalente à das grandes capitais. Mas se forem consideradas apenas as cidades do interior, os parnasianos detêm a maior concentração de mentirosos por mil habitantes.
Nas suas aulas-espetáculo, Suassuna gostava de dividir a humanidade em dois grupos. Por exemplo, de um lado, as pessoas que já foram à Disney pelo menos uma vez; de outro, as que nunca foram. Com relação à mitomania, ele certamente dividiria os parnasianos em três metades: de um lado, aqueles que mentem; de outro, aqueles que mentem muito. Resta agora pesquisar a terceira metade. Fica a sugestão como tema de pesquisa. Com a palavra, a comunidade científica, pois ainda restam as últimas bolsas remanescentes da crise. Pra muitos “cientistas” é a bolsa ou a vida.
(próxima crônica: “CATULO, O CEARENSE, E A INDEPENDÊNCIA DA FRANÇA”)
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Escute o texto com a narração do próprio autor: