“Num mundo onde/delinquir é a norma/e prevaricar é a lei/seria quase impensável/que os espíritos fracos/ e mal formados/não escolham também/o caminho da delinquência/ e da prevaricação.”
DIREITO DE FAMÍLIA. DIREITO HEREDITÁRIO. SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA.
Na edição passada a coluna iniciou um despretencioso estudo sobre testamento em geral, em especial, no âmbito do direito hereditário.
Após estudar os aspectos gerais do testamento, atinentes a quem pode testar e os limites da liberdade de fazê-lo, respeitados direitos de herdeiros, e outros aspectos, registramos as formas ordinárias do testamento e dos testamento especiais, que repetimos.
FORMAS ORDINÁRIAS DE TESTAMENTO: a) o público; b) o cerrado; e o c) particular. Examinemos cada um deles.
TESTAMENTO PÚBLICO. O art. 1.864 do Código Civil estabelece quais os requisitos de validade do referida forma de testamento, transcritos a seguir:
I – ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de acordo com as declarações do testador, podendo servir-se de minuta, notas ou apontamentos;
II – lavrado o instrumento, ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador e a duas testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial;
III – ser o instrumento, em seguida à leitura, assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo tabelião. O testamento público pode ser escrito manualmente ou mecanicamente, bem como ser feito pela inserção da declaração de vontade em partes impressas de livro de notas, desde que rubricadas todas as páginas pelo testador, se mais de uma.
A modernidade permite que o testamento público seja escrito manualmente ou mecanicamente: “bem como pode ser feito pela inscrição da declaração de vontade em partes impressas de livro de notas, desde que rubricadas todas as páginas pelo testador, se mais de uma.” Parágrafo único do art. 1.864 do CC.
Ainda algumas particularidades: a) se o testador não souber ou não poder assinar, o tabelião determinará que uma das testemunhas do testamento assine a rogo; b) no caso de surdez do testador, mas sabendo ler e escrever, e se não souber, permite que alguém leia em seu lugar, tudo testemunhado; e c) ao cego só é permitido fazer testamento público, que será lido duas vezes em voz alta, uma vez pelo tabelião e a outra por uma das testemunhas designadas pelo testador.
Para complementar o resumido estudo atinente ao testamento público, uma fato merece destaque.
A legislação brasileira não obriga que testador, qualquer que seja a idade, apresente ao tabelião atestado de capacidade mental firmado por médico especializado, entretanto, na prática, se recomenda que se tratando de pessoa idosa, que seja adotada, ainda que voluntariamente, essa providência.
A coluna colheu uma decisão do STJ, que se refere ao testador idoso (com 88 anos de idade), compareceu em cartório para fazer um testamento público, munido de laudo médico atestando a sua capacidade mental.
Houve após a feitura do testamento o reconhecimento a posteriori de uma filha, isto é, post mortem, que questionou judicialmente a validade do mesmo, alegando a incapacidade mental do testador, ante o avançado da idade.
Segue a transcrição da decisão judicial do STJ, que esclarece bem a matéria.
EMENTA: “A vontade manifestada pelo autor do testamento de dispor sobre os bens disponíveis da herança, em detrimento da filha reconhecida a posteriori – intuito sobre o qual, como visto, nem mesmo a recorrente controverte -, restou substancialmente demonstrada, cuja verificação deu-se, de modo uníssono, pelas instâncias ordinárias com esteio nos elementos de prova reunidos nos autos. Segundo apurado, o testador, contando com oitenta e oito anos à época da efetuação do testamento, justamente para prevenir posterior e infundada alegação de incapacidade, apresentou laudos médicos que atestavam sua plena sanidade mental. É dizer, o testador, por sua própria iniciativa, deixou comprovado, por ocasião da confecção do documento, que a manifestação acerca da destinação de seus bens, na parte disponível da herança, expressada no testamento público por ele subscrito, representava, de forma livre e consciente, verdadeiramente a sua última vontade. O proceder adotado pelo testador revelou inequívoca preocupação em assegurar que as disposições de última vontade insertas em seu testamento fossem efetivamente observadas. Não há na lei de regência qualquer limitação ( máxima ) de idade para testar, tampouco exigência de que o autor do testamento comprove sua capacidade para o ato. Não obstante, o testador assim acautelou-se. Há que se pontuar, ainda, não remanescer qualquer dúvida, a considerar o laudo pericial conclusivo, acolhido pelas instâncias precedentes, de que o autor do testamento efetivamente apôs sua assinatura no documento, por ocasião de sua lavratura. Aliás, a própria adoção da forma pública do testamento revela a intenção do testador de valer-se da segurança e seriedade a ele inerente. Todas essas circunstâncias, de fato, deixaram evidenciada a congruência entre o disposto no testamento e o real propósito de seu autor. Em que pese a existência de vício de forma ( testemunhas instrumentárias, funcionários do cartório, que não presenciaram a lavratura do testamento, apondo as respectivas assinaturas posteriormente), a confirmar a reiterada atuação antijurídica da Tabeliã, a quem incumbia, imediatamente, zelar pela observância dos requisitos formais, inviável, na hipótese dos autos, frustrar a manifestação de última vontade encerrada no testamento público, quando esta, a partir dos elementos de prova reunidos nos autos, refletiu, indene de dúvidas, a real intenção de seu autor” ( STJ-3ª T., REsp 1.419.726, Min. Marco Belizze, j. 9.12.14, DJ 16.12.14).
O testamento, qualquer que seja a forma exige, para sua validade, testemunhas presenciais, então, o testador tem que saber quem não pode testemunhar.
Como regra geral em qualquer processo, inclusive nos testamentos (no que couber: a) o interessado no litígio; b) o amigo íntimo ou inimigo do testador; c) os cônjuges; d) os ascendentes, os descendentes, os colaterais até terceiro grau, por afinidade ou consanguinidade.
Na próxima edição a coluna prosseguirá no estudo da matéria, comentando os testamentos cerrado e particular, os últimos das formas ordinárias de testamento.
Josino Ribeiro Neto
OAB/PI 748