Tenho a satisfação de ceder o espaço desta Coluna aos inteligentes estudantes de Direito, Jamila da Silva Rodrigues e Daniel Guimarães Gonçalves, do Bloco III, da UESPI.
VINTE ANOS DO ESTATUTO DA ADVOCACIA
A profissão de advogado tem, aos nossos olhos, uma dignidade quase sacerdotal. Toda a vez que a exercemos com a nossa consciência, consideramos desempenhada a nossa responsabilidade. Empreitada é a dos que contratam vitórias forenses. Nós nunca nos comprometemos ao vencimento de causas, nunca endossamos saques sobre a consciência dos tribunais, nunca abrimos banca de vender peles de ursos antes de mortos. Damos aos nossos clientes o nosso juízo com o nosso conselho, a nossa convicção com o nosso zelo; e, depois, quanto ao prognóstico e à responsabilidade, temos a nossa condição por igual à do médico honesto, que não canta vitórias antecipadas como os curandeiros, nem se há por desonrado, quando não debela casos fatais…
Rui Barbosa, 1918.
Em 04 de julho de 1994, a Lei nº 8.906 que dispõe o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) trouxe para o cenário jurídico linhas norteadoras a culto dos princípios éticos e o domínio da ciência jurídica. Mas, ao longo desses 20 anos da criação do Estatuto da Advocacia, o que de fato ele representa para o profissional advogado? Será que garante ampla defesa aos direitos deste profissional e se mostra adequado à realidade da necessária garantia ao seu desenvolvimento?
É indiscutível o papel do profissional da advocacia na sociedade, na proteção dos direitos e na garantia da ordem social justa. Esse papel emergiu e engrandeceu-se desde o início do Estado brasileiro. O Estatuto da Advocacia acolheu esta responsabilidade proeminente do advogado na sociedade, a partir da proteção da classe quase que em detrimento da defesa do “indivíduo advogado”. Esta assertiva é flagrante no enunciado do art. 31, in verbis:
Art. 31. O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia. (grifo nosso)
O procedimento do advogado, então, não tenderia, em si, a ser regulado pelo mercado a partir da busca de bons profissionais, mas à excelsa causa do prestígio da classe e da boa imagem do exercício da profissão. O que em tese se configura como uma boa iniciativa não se coaduna com o pragmatismo do exercício profissional. Enfim, o Estatuto da Advocacia busca incidir mesmo na seara privada do “indivíduo advogado” a partir de regulações morais, como o disposto parágrafo único do art. 34 que visa dar aplicabilidade ao inciso XXV ao tipificar como infração a conduta incompatível com a advocacia, incluindo nessa tipificação: a) pratica reiterada de jogo de azar; b) incontinência pública e escandalosa; c)embriaguez ou toxicomania habituais.
É interessante perceber que as condutas tipificadas como “incompatíveis com a advocacia” previstas no recém citado dispositivo legal em nada se relacionam com o desenvolvimento profissional em sentindo estrito, mas a condutas morais e pessoais do “indivíduo advogado”.
Nessa perspectiva da interação profissional entre si e sua projeção social coadunam-se as exigências de controle do “indivíduo advogado” e suas condutas em favorecimento à imagem da Advocacia (art. 31, art. 54 inciso III, art. 61 inciso II).
A regulação do exercício das atividades profissionais esquadrinham interesses que visam o interesse público, mas, e mais ainda, à proteção e oferecimento de garantias de pleno desenvolvimento técnico-científico e operacional ao profissional. Na Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 133, se consagram duas observações: o princípio da imprescindibilidade do advogado à administração da Justiça e a garantia da inviolabilidade deste. Considerando que o constituinte definiu uma norma de eficácia limitada quanto à imunidade do advogado, surgiu a lei regulamentadora, o Estatuto do Advogado. Entretanto, é da primeira observação, acima apontada, a que relaciona ou pelo menos deveria relacionar advogados como estandarte da Justiça afastando-os de uma mera figura de coadjuvantes, que se devem analisar as fraturas, os rompimentos, o engessamento que impedem a sua intercomunicação com a sociedade e com o próprio exercício da profissão.
Jamila da Silva Rodrigues
Daniel Guimarães Gonçalves