A Lei Seca está mais dura desde dezembro passado, mas somente na última terça-feira (29) o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) detalhou as regras.
Foi reduzido o limite de álcool para o motorista ser multado por meio do teste do bafômetro. E a opinião de um agente de trânsito ganhou mais peso: agora tem valor de prova em um eventual processo criminal envolvendo embriaguez ao volante.
Na resolução desta terça, o Contran indicou quais sinais devem ser considerados por um policial ou agente de trânsito para confirmar que um motorista bebeu.
Entre eles, há itens como “sonolência”, “olhos vermelhos” e “dificuldade de equilíbrio” até “desordem nas vestes” e “arrogância, exaltação, ironia”. É necessário constatar um conjunto de sinais, não apenas um.
Com base no que vê e percebe, o agente poderá multar, reter a carteira de habilitação e o veículo, mas liberar o motorista. Se ele tiver se envolvido em acidente ou representar risco, poderá ser levado para a delegacia.
O que muda na prática
Na prática, isso já era realizado quando o condutor se recusava a passar pelo bafômetro mesmo apresentando sinais de embriaguez. “A novidade é que agora [o relato do agente de trânsito] pode ser considerado prova criminal”, explica Maurício Salvadori, assessor do centro de apoio operacional criminal do Ministério Público de São Paulo.
Antes a lei só considerava como prova o bafômetro ou o exame de sangue. Com base nela, só no estado de São Paulo, de dezembro de 2010 até esta terça, havia 7.310 processos cadastrados no sistema do MP envolvendo embriaguez ao volante, considerando os concluídos e os ainda em andamento.
O ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro, afirmou na última terça que agentes de trânsito já estão sendo treinados para lidar com a norma, mas não deu detalhes. “Acreditamos no bom senso dos agentes de trânsito do país.”
Critérios ‘subjetivos’
Para Maurício Januzzi, presidente da comissão do sistema viário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em São Paulo, os critérios para o exame visual de um agente de trânsito “são altamente subjetivos” e o relato do policial ou guarda pode ser uma prova frágil.
Ela seria derrubada mais facilmente na Justiça do que uma perícia, que ocorre quando o motorista é levado a um médico legista, em geral no Instituto Médico Legal da cidade, para exame clínico ou de sangue. “Uma perícia só pode ser contestada com outra. Já o exame visual exame visual é mais fácil de contestar”, opina.
O advogado acredita que a defesa poderá alegar que falta uma parte da lei para que seja constituída a prova de embriaguez ao volante. “A lei fala em limites de álcool [no ar ou no sangue] para configurar o crime. Como comprovar esse limite [com o exame visual]?”, questiona.
“A presidente Dilma perdeu uma grande oportunidade de ter colocado tolerância zero na lei”, diz Januzzi. “Aí não seria necessário comprovar se passou ou não de um determinado limite. A partir do momento em que estabelece limites, [a lei] diz que beber e dirigir é possível.”
A Lei Seca agora estabelece que, a partir de 0,05 miligramas de álcool por litro de ar soprado no bafômetro, o motorista pode ser multado por infração gravíssima, no valor de R$ 1.915,40 e suspensão por 1 ano do direito de dirigir. Acima de 0,34 mg/l de ar, é considerado crime e o condutor pode ser preso. Para exame de sangue, qualquer quantidade álcool permite a multa; a prisão pode ocorrer quando esse nível ficar acima de 6 decigramas por litro.
‘Tem que fundamentar’
O promotor Salvadori, do MP-SP, discorda que a palavra do agente de trânsito seja fraca ou que possa haver arbitrariedade. “Toda abordagem policial se baseia em critérios, não é absolutamente livre. E ele terá que fundamentar depois”, explica.
“Isso [o relato do agente] vai passar por outros crivos, como o do delegado, se houver a prisão, o do próprio Ministério Público, que vai decidir abrir ou não um processo, e, se for o caso, de um juiz. Nenhum processo é concluído com base em uma única prova.”
Além disso, completa Salvadori, é permitida ampla defesa para o motorista que for acusado de embriaguez, tanto para um processo administrativo (multa e suspensão da CNH) quanto para um eventual processo criminal. Para dar sua versão, o condutor pode ser valer do próprio bafômetro ou de testemunhas.
Defesa do motorista
O médico Mauro Augusto Ribeiro, colaborador da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), diz que há outras situações em que uma pessoa pode apresentar características como as que serão observadas pelos agentes de trânsito para verificar embriaguez. “Evidentemente, [o exame visual] tem um certo grau de subjetividade”. “Mas é por isso que a pessoa poderá exigir passar pelo bafômetro em seguida.”
O próprio governo federal reconhece que as novas regras servirão como estímulo para que as pessoas solicitem mais o teste bafômetro, que alguns rejeitavam com base no direito de não produzirem provas com si próprios. “Ele [o motorista] vai dizer que quer soprar para mostrar que não está alcoolizado. Até se tiver com um nível menor de álcool, vai fazer sair do crime e ir para infração”, avalia o ministro das Cidades.
Caso a pessoa seja levada a uma delegacia, ela pode solicitar que seja feito um exame com um perito. Esse procedimento não é “automático”, explica o promotor Salvadori. Só pode ser feito no IML ou hospital referenciado e a pedido da autoridade policial ou da Justiça. Um exame realizado laboratório comum não conta como contra-prova, alerta. “Geralmente, o delegado vai convidar a fazer o exame”, diz Salvadori.
A pena para quem for condenado por embriaguez ao volante é de detenção de 6 meses a 3 anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo.
Fonte: G1