A PROFISSÃO MAIS ANTIGA

 

Vitor de Athayde Couto

 

Ao sair de uma festa, quatro notívagos resolvem pernoitar num motel. São dois casais. Mais especificamente, dois homens e duas mulheres. Uma arquiteta (Dra. Urbanilda), um economista (Dr. Paulo G.), um engenheiro (Dr. Genésio) e uma prostituta formada na escola da vida (Dra. Samantha). Ninguém tem doutorado, mas é de se respeitar a formatura de cada um. Dos quatro “doutores”, Dra. Samantha ostenta o maior anel, uma semijoia, com uma enorme pedra falsa, vermelha, qual sonho de valsa. De paixão.

 

Enquanto esvaziam o frigobar, discutem em torno da seguinte questão: qual é a profissão mais antiga?

 

– Claro que é a minha – adianta-se Dra. Urbanilda, a arquiteta. – Deus é conhecido como o Arquiteto do Universo. Projetou o universo.

 

– Epa! De jeito nenhum! – estrila a prostituta, enquanto lava o dedo indicador no blend on the rocks. – Todo mundo sabe que a minha profissão é a mais antiga do mundo. Sem a minha profissão, não ia ter ninguém aqui. A humanidade é filha da puta, mesmo.

 

Apelando para a Gênese, Dr. Genésio começa a recitar o capítulo 1, quando Deus criou os céus e a terra:

 

– Não teve projeto nenhum. Deus não precisa disso. Ele foi logo construindo tudo. Um puxadinho aqui, outro puxadinho ali, uma pracinha acolá, um meio-fio pintado de branco… E assim criou o universo, prova de que a mais antiga é a profissão de engenheiro – disse Dr. Genésio.

 

Dr. Paulo G., o economista, só ouve, calado.

 

De pé, o engenheiro Dr. Genésio continua seu recito da Gênese:

 

– Deus criou os céus e a terra. Disse Deus: “Haja luz”, e houve luz. Deus viu que a lâmpada de led era boa, e separou a luz das trevas.

 

– Péra! – grita a prostituta, Dra. Samantha. – Nada disso existe sem o homem e a mulher. E Deus ainda ordenou: “Sejam férteis e multipliquem-se!” E Deus viu que era bom. E até hoje ninguém disconcorda, pois é bom mesmo, haha.

 

– Ora, ora. Homem e mulher precisam de um chão, de uma casa para morar. A terra, o chão e a casa são obra de Deus-construtor. A criação do mundo foi o primeiro trabalho sobre a terra. Logo, se Deus é engenheiro…

 

– Péra! – grita prostituta outra vez. – Sem mim, o homem não existe. “Amor de rapariga é que é amor”. Sou eu que ensino a fazer neném. – continuou Dra. Samantha, folheando o seu book.

 

Dr. Paulo G., o economista, só ouve, calado.

 

Sempre atento, Genésio retruca Samantha, e explica:

 

– Mas o primeiro homem veio do barro do chão da criação do mundo, a maior obra de engenharia jamais vista. E os mares, e as montanhas…

 

Dr. Paulo G., o economista, só ouve, calado.

 

– Depois disse Deus: “Haja entre as águas um firmamento que separe águas de águas”. – continuou Dr. Genésio, citando a Gênese de memória. – Então Deus fez o firmamento e separou as águas que ficaram abaixo do firmamento das que ficaram por cima.

 

– Eita! – diz a prostituta já quase se convencendo de que ela veio depois.

 

– E disse Deus: “Ajuntem-se num só lugar as águas que estão debaixo do céu, e apareça a parte seca”. À parte seca Deus chamou terra, e chamou mares ao conjunto das águas. E Deus viu que ficou bom.

 

Dr. Paulo G., o economista, só ouve, calado.

 

Seguro de que a profissão mais antiga é sem dúvida a do engenheiro, Dr. Genésio já se acha vencedor quando, de repente, o economista pergunta:

 

– Ei, pissíte! E antes disso tudo, no princípio, havia o quê?

 

Genésio, o engenheiro, hesitou… olhou para Samantha, a prostituta, que abaixou a cabeça… acabou por confessar:

 

– Não sei.

 

– Viu? – disse Dr. Paulo G., o economista, para quem o ponto G representa o Globalismo que equilibra o comércio internacional e o sistema financeiro mundial. – A profissão mais antiga não é a arquitetura, nem a engenharia, nem a prostituição.

 

– E qual é, então? – perguntam os dois, ao mesmo tempo.

 

– A mais antiga é a profissão do economista. – responde Dr. Paulo G.

 

Genésio, o engenheiro, enfurecido, pergunta:

 

– E por quê? Posso saber?

 

– Porque… no princípio dos tempos… só existia o caos.

 

***

 

Por falar em Economia, a Revista Econômica do Nordeste, editada pelo ETENE, do Banco do Nordeste, completou 50 anos. Como parte das comemorações, acaba de ser publicado um número especial, com contribuições de pesquisadores de cada um dos nove estados da Região Nordeste, em que se utiliza a base de dados do Censo Agropecuário de 2017, do IBGE. Tive a honra de ser convidado para escrever sobre o Estado da Bahia, juntamente com duas ex-alunas e orientandas de tese de doutorado, pela UFBA. Ambas são integrantes do Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Territorial UFBA/CNPq, que coordeno. A revista tem artigo de abertura escrito pela economista Tânia Bacelar, que homenageia o centenário de nascimento do economista Celso Furtado (meu estimado ex-professor, na Sorbonne). Quem tiver interesse, pode acessar a revista pelo link: <https://www.bnb.gov.br/etene/ren>

 

Para ter acesso direto ao artigo, utilize o link: <https://www.bnb.gov.br/documents/80223/8054629/J_1268.pdf/42a83549-1884-bb57-18a9-8a8320e9441d>