CHAMEM O SÍNDICO!

 

Vitor de Athayde Couto

 

Rosas falam? Esta questão, provocada pelos versos da música “As rosas não falam”, do genial Cartola, alertou para a necessidade de novas pesquisas. Infelizmente a comunidade científica não chegou a nenhum resultado útil, até hoje. A única exceção é a insistência do Roberto Carlos em dizer que as rosas falam. Ele não percebe que “simplesmente as rosas exalam o perfume que roubam de ti” é uma fala mais sutil do que mil verbalizações.

 

Mesmo assim, investiu-se bastante em projetos e eventos científicos a exemplo de seminários, congressos, colóquios, encontros, palestras, mesas-redondas, brainstorms… Emergiram novas hipóteses, teorias, conceitos, artigos ditos científicos, dissertações, teses, livros, lives, blogs, sites, podcasts, concursos, prêmios e, tcharããã… pontuações nos Lattes da vida.

 

A meta agora é validar a Fonobotânica como ciência e incluir no sistema. Para isso, já existe um projeto de criação da Sociedade Brasileira de Fonobotânica. O seu objeto de estudo é a linguagem das plantas. Resta apenas saber em que área do conhecimento humano a Fonobotânica seria alocada, na Biologia das Plantas ou na Psicologia dos Seres Vivos sem Alma?

 

O que mais impressiona é a velocidade como já se estrutura outro movimento paralelo, em prol da criação da Psicobotânica. Esta futura e promissora ciência tem por objeto as emoções e o sofrimento das plantas. Neste caso, a questão teria sido levantada por outro músico talentoso, Zé Kéti. Será? Infelizmente ele não está mais entre nós para confirmar. Se estivesse vivo, ZK faria 100 anos no dia 16 de setembro deste ano.

 

– Plantas choram? – é outra questão que se coloca no meio científico, quando se discute a emergência da Psicobotânica.

 

O problema é que não há nenhum registro de que ZK tenha formulado tal questão. Ele apenas compôs, entre outras maravilhas, uma das músicas de maior sucesso no Brasil. Detalhe: a música foi desclassificada pelos burocratas do Festival Internacional da Canção. Desclassificaram até três composições do maestro Pixinguinha, em parceria com o notável Rubem Braga, dá pra acreditar? Ainda não satisfeitos, de caneta azul na mão, os burocratas também desclassificaram os pais do samba Ismael Silva e Nelson Sargento.

 

Essas estupidezes nunca surpreendem quando os organizadores de qualquer coisa são pessoas com ótima vocação para ser síndico de prédio. Não sei se é piada, mas contam que o perfil ideal de um bom síndico é ser uma pessoa desocupada, medíocre e com uma enorme vontade de mandar em alguém como porteiro, zelador, vigia ou jardineiro. É só felicidade.

 

Como se não faltasse mais nada, a crítica caiu de pau na letra do ZK. Dizia-se que ele tinha errado, confundiu Pierrô com Arlequim, ao que ele respondeu assim, bem na lata, como merecem os burocratas:

 

– “A música é minha e eu faço o Arlequim chorar e ficar apaixonado quando bem entender.”

 

Para terminar, resta uma pergunta:

 

– O que ZK tem a ver com a Psicobotânica?

 

Resposta, na mesma lata: nada. Não tem nada a ver. Mas quase todo mundo só canta assim: “Alecrim está chorando pelo amor da Colombina / No meio da multidão”. Donde se pode concluir que, se o alecrim está chorando, fica provado que as plantas também choram.

 

Não tenho nada contra a Psicobotânica. Muito pelo contrário. Reconheço até que o sucesso do ZK continua bem atual, nestes tempos de pandemia. E os brasileiros lembrar-se-ão (ops, discupaê) irão se lembrar do grande compositor, sempre que virem pessoas usando “máscara negra” nas ruas, nos mercados, nas academias, nas áreas de alimentação dos shoppings, nos cinemas… menos nos bailes de máscara, cantando “Quanto riso / Quanta alegria…”

 

Duas semanas depois, quantas lágrimas, quanta tristeza. Mais de mil palhaços no salão, chorando pelo amor da Cloroquina, no meio da multidão. “Foi bom te ver outra vez / Tá fazendo um ano / Foi no carnaval que passou.”