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Mesmo as penitenciárias que são consideradas referências, têm estruturas vergonhosas.

A situação do sistema prisional do Piauí está em situação critica e os gestores que estiveram à frente da Secretaria de Justiça na última década foram incapazes oferecer àqueles que foram privados da liberdade a oportunidade de se ressocializarem e voltarem à sociedade como cidadãos. Pelo contrário, as penitenciárias do estado funcionam em situação caótica, favorecendo fugas, motins e rebeliões. Para piorar, a morosidade da justiça faz com que muitos estejam nestas condições sem sequer terem sido julgados. Uma reportagem da Rede Brasil Atual, com informações do Justificando e do Sinpoljuspi, com base em relatos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional do Piauí, mostra a que ponto chegou o sistema no estado.

“As penitenciárias próximas a Teresina, mesmo as maiores, consideradas referências, têm uma péssima infraestrutura. Quando se entra em uma delas já se sente aquele cheiro ruim. Cheiro de morte”, afirma o presidente da Comissão de Direito Penitenciário da OAB-PI, Jonas Deusdará. A declaração ilustra a situação do Hospital Penitenciário Valter Alencar (HPVA), situado na cidade de Altos, a 38 quilômetros da capital piauiense.

MORREU SEM JULGAMENTO
Foi no HPVA que, no último dia 24, Nazareno Antônio de Sousa, de 51 anos, morreu após 24 anos de cárcere. Preso em 1992, o piauiense residia no povoado de Carnaíba, próximo à cidade de Picos, no sul do Piauí, e aguardou até o fim de sua vida pela liberdade. A morte do detento revela um problema na Justiça local. Sousa nunca chegou a ser julgado. Aguardou desde os anos 1990 por uma audiência com um magistrado, mas morreu encarcerado no hospital.

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SITUAÇÃO PRECÁRIA
No HPVA, de acordo com Deusdará, 53 pessoas são mantidas em situação precária. “Entre eles, 15 estão em tratamento psicológico, o restante, sob cuidados ortopédicos relativos à ferimentos ocasionados por confrontos com a polícia”, afirma. O corpo médico também não corresponde às necessidades dos internados. “Na verdade, lá só tem serviço odontológico e psicológico”, diz o advogado.

Nazareno aguardou por mais de 20 anos uma resposta do estado. Ele deveria estar em liberdade havia quatro anos, quando prescreveu o crime de homicídio, pelo qual foi acusado e nunca julgado. Em 9 de abril de 2014, a juíza titular da 5ª Vara Criminal de Picos, Nilcimar Rodrigues de Araújo Carvalho, extinguiu o processo. A soltura, entretanto, foi adiada pela demora na expedição do alvará. Mesmo com o documento em mãos, Nazareno permaneceu sob custódia do HPVA, por problemas de saúde mental e, também, pela ausência de familiares.

O HPVA já foi descredenciado da Justiça em 2014 por problemas estruturais, mas o hospital fez acordo com o Ministério Público, a Secretaria de Justiça e Cidadania e a Justiça para manter suas atividades. A situação dos detentos já havia chamado a atenção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por suas práticas.

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SETE JÁ MORRERAM SÓ ESTE ANO
De acordo com levantamento do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Piauí (Sinpoljuspi), sete detentos morreram nas cadeias do estado apenas neste ano. Nazareno não teve a causa da morte identificada. Segundo autoridades, o corpo não apresentava sinais de violência.

Casos de morosidade do Judiciário são frequentes, porém, a extensão desse caso chama a atenção. Segundo pesquisas de tribunais superiores em todo o país, são normais históricos de presos que aguardam até dez anos em prisão provisória. O Piauí se destaca negativamente nesse tema. De acordo com reportagem do UOL em 2013, ao menos sete pessoas estavam mantidas em cárcere sem nem sequer possuir ficha criminal.

OMISSÃO DO ESTADO
Para Deusdará, entretanto, o maior problema no caso de Nazareno foi a omissão do estado do Piauí, sob gestão de Wilson Nunes Martins (PSB), por não entregá-lo para a sua família após expedido o alvará de soltura. “O Estado tem direito de punir o cidadão por conta de eventual crime. Dentro das penas, está a pena de prisão. Só que de forma igual que ele tem direito de punir, ele tem a responsabilidade objetiva decorrente da Constituição federal de localizar os responsáveis”, explica.

Sob nova plataforma de governo, as pastas estaduais de Saúde e Justiça prometem mudanças no cenário. “A Sesapi e a Sejupi buscam promover meios que destinem adequadamente os pacientes judiciários com transtornos mentais – como encaminhamento para residências terapêuticas, retorno à família ou outros tratamentos terapêuticos – inclusive em conformidade com o serviço de avaliação e acompanhamento de medidas terapêuticas aplicáveis à pessoa com transtorno mental em conflito com a lei”, informam em nota.

Fonte: 180graus