Faz tempo que Vicentina Roberto, de 72 anos, viúva e pensionista da Previdência, não compra presentes de Natal para os quatro filhos e cinco netos. Neste ano, não será diferente. A primeira parcela dessa renda extra ela já recebeu, mas nem retirou do banco. “Vou pagar as contas que estão atrasadas: água, luz, telefone. Já estou devendo cerca de R$ 2 mil em contas básicas.” Ela reconhece que precisaria trocar a máquina de lavar roupa. Mas, diante do aperto, decidiu pagar as dívidas e guardar a segunda parcela do 13.º salário.
O caso de Vicentina mostra o tamanho da cautela do brasileiro neste Natal, que não deve trazer impulso adicional para o consumo. Pelo segundo ano seguido, apenas 25% dos brasileiros vão gastar o 13.º salário com compras de Natal, 31% vão poupar e 18%, quitar dívidas. Os 23% que restam não recebem esse benefício porque estão desempregados ou são subempregados, aponta pesquisa da consultoria Deloitte, feita pelo Ibope no mês passado com cerca de mil pessoas de todas as camadas sociais.
O aperto é tão grande que, entre os que pretendem consumir, a intenção é desembolsar menos do que no ano anterior. A enquete revela que, neste ano, 63% dos entrevistados disseram que planejam gastar uma cifra menor do que no Natal passado. Coincidentemente, no Natal de 2015, também 63% dos entrevistados informaram que desembolsariam menos do que em 2014. Resultado: o Natal do ano passado foi um fiasco.
“A situação piorou em cima do que já estava ruim”, observa Reynaldo Saad, sócio líder para a Indústria de Bens de Consumo e Produtos Industriais da Deloitte Brasil. Ele pondera que, apesar de os indicadores de confiança do empresariado sinalizarem uma perspectiva mais positiva para 2017, o cidadão comum ainda sente o efeito da queda na renda e tem medo de perder o emprego. Para 41% dos entrevistados, a situação financeira da família hoje é pior do que no ano passado e 59% se sentem inseguros em relação ao emprego.
Gasto
O pé no freio no consumo fica nítido em dois indicadores revelados pela pesquisa. O gasto total com presentes estimado neste ano pelos entrevistados será de R$ 342. No Natal de 2015, o desembolso efetivo com a compra de presentes foi de R$ 422. Se as previsões se confirmarem, será uma queda de quase 20% no gasto nominal e mais de 10% de retração se descontada a inflação.
Um ponto que chama a atenção é que, pela primeira vez desde que a consultoria começou avaliar o consumo no Natal em 2011, o número de presentes atingiu a menor marca. Neste ano, a intenção é comprar quatro produtos, ante cinco no ano passado. Saad observa que, em média, nos últimos anos, a intenção de compra de cada consumidor era levar para casa meia dúzia de presentes.
Apesar do cenário ainda ruim, existe a percepção entre os consumidores de que o quadro pode parar de piorar no ano que vem e o estrago se reduzir. Para 77% dos entrevistados, a economia brasileira está hoje estagnada ou em declínio. Em 2015, essa fatia era um pouco maior e era de 88%.
Fonte: Estadão