E SEGUE O BAILE… DE MÁSCARA
Vitor de Athayde Couto
No pátio do Sanatório Geral* os internos conversam.
Interno 01 – Por que acreditar na vacina russa?
Interno 02 – Na cubana, nem se fala…
Interno 03 – Peraí, não foi o Trump que ameaçou não pagar e até mesmo fechar a OMS?
Interno 176 – Sim. Em meio à corrida por vacinas e eleitores, Trump inventou que hackers chineses e russos copiaram segredos de laboratórios americanos e ingleses. Agora ele vem criticar quem não publica e não registra os procedimentos na OMS? Ôxi!
Interno 03 – Atenção! Acabo de receber uma mensagem dizendo que o Trump mandou pular etapas. Ele quer vacinar todo mundo antes das eleições de 3 de novembro! Aff…
Estagiária psi – Ei, se vocês são loucos, como conseguem conversar com tanta coerência assuntos que praticamente ninguém sabe direito?
Todos os internos – Ora, nós somos loucos mas não somos burros kkkk
Depois da gargalhada geral, com a participação da psi, agora bem humorada, o interno 176 subiu num caixote, como se estivesse no Hyde Park, e começou o seu discurso:
“A humanidade participa de um baile macabro. Um baile de máscaras. Não é aquele Bal Masqué, de Verdi, assassinato de reis está fora de moda, desde a Revolução Francesa. Mesmo assim, a imprensa dá espaço aos palpites de membros da casa grande e branca de Bragança. Quem mais entende de corona do que as cabeças coroadas? A realeza é a solução? Eles entendem mais do que pesquisadores infectologistas e virologistas?
Prefiro o Bal Masqué da Compagnie Créole. Além de contemporâneo, representa muito melhor o sanatório geral – a geleia geral brasileira! Ano que vem, mês que foi, o que se vê são napoleões, josefinas, carlotas joaquinas e… tcharããã… cloroquina! – a convidada de honra! É a mesma dança, meu boi, meu gadão drogado!
Agora, todos comigo! Muuu!
Décalécatan, décalécatan, ohé, ohé
Décalécatan, décalécatan, ohé, ohé
Durante o ano preparamos fantasias
Hoje eu faço o que eu quiser
Hoje é tudo permitido, hoje vale-tudo
No baile, ele dança, ele dança, ele dança
Esta é uma grande oportunidade de mudar de parceiro
Trouxeram suas fantasias? Nunca esqueçam! A loucura é o exercício pleno da fantasia!
Drácula, Júlio César, Casanova, Cinderela, Marylin, D’artagnan, D’alanhol, Napoleão, Josefina, Arlequina, Joaquina, Leopoldina, Florentina, Colombina, Cloroquina!”
Terminado o discurso, lembrei da pequena Pryscylla… sim, aquela, do Cumunirmo.**
Na mesma feira de Caruaru, ela vai caminhando, de máscara. Presa pela mão da mãe, também de máscara. Avistou sua bisa, de máscara, que não via há meses. Saiu correndo, agitando os bracinhos abertos para o abraço. Abaixou a máscara até o queixo e gritou:
– Vovó! Vovó!
Sua mãe berrou bem alto:
– PARA, PRYSCYLLA!!! FICA LONGE DA TUA VÓ!!!
Antes da pandemia, Pryscylla ouvia sempre:
– “Corre, Pryscylla! Vai abraçar a vovó!”
Aos oito anos, a pequena Pryscylla começou a entender o novo anormal que vem por aí e acabou deduzindo que os jumentos e as bisavós de Caruaru viraram comunistas.
E segue o baile… de máscara.
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