Há exatos dois anos Teresina amanheceu com a notícia que o corpo de uma jovem estudante foi encontrado na obra do prédio do Ministério Público Federal. Enquanto esperava a Perícia Criminal e o Instituto Médico Legal (IML), o Tenente Coronel Almeida, primeira autoridade policial que esteve no local do crime, isolou área e marcou pegadas no caminho percorrido pela jovem da obra do Tribunal Regional do Trabalho até o prédio do MPF, percebendo dois tipos de marcas de pés no trajeto feito por Fernanda. Uma de homem e outra de mulher. Começava aí toda a confusão que terminou por produzir dois inquéritos policiais que não indicam nada. Fernanda, corre o risco de se inserir no rol dos crimes insolúveis.

O Coronel também foi o primeiro a conceder entrevistas sobre o caso chegando a afirmar que o trabalho dos investigadores seria fácil, tanto pela quantidade de evidencias deixadas na cena do crime, quanto pelas afirmações de Domingos Pereira, o vigia da obra. Entretanto ao contrário do que previa o Coronel, o crime nunca foi elucidado de uma forma que convencesse a família da jovem e parte da sociedade, principais interessados.

O próprio tenente coronel pediu exoneração do cargo, num processo que de acordo com a PM é natural, e passou logo após a desmentir as afirmações, apesar da quantidade de jornalistas que ouviram. Não é segredo de ninguém, o coronel Almeida foi punido administrativamente pelo muito que falou sobre o caso. A Polícia Civil, através da Cico, concluiu que Fernanda teve morte violenta, num inquérito cheio de falhas, de contradições. A Federal, depois de meses investigando, encerrou sua participação no caso informando que Fernando teria se suicidado. Ou caído, acidentalmente, do alto do prédio do MPF onde ela teria ido andar sobre a mureta do 6º. Andar, na madrugada do dia 25 de agosto de 2011.

Fernanda Lages Veras tinha 19 anos e cursava o terceiro semestre do curso de Direito, em Teresina. Ela era filha do ex-vereador pelo município de Barras, Paulo Lages. Fernanda era muito querida na cidade, e tamanha foi a comoção que as festividades em comemoração ao 170º aniversário do município não foram realizadas, no lugar apenas uma missa campal em praça pública por um mês da morte de Fernanda.

Primeiro Delegado

O primeiro delegado que atuou no caso foi titular do 5º DP, Mamede Rodrigues. Em uma das suas primeiras entrevistas, Mamede afirmou que havia possibilidade de ser um crime passional, devido a brutalidade evidenciada na cena do crime. O delegado disse ainda que provavelmente tratava-se de um ato de vingança.

Segundo as investigações iniciais, feitas por Mamede, Fernanda foi vista pela última vez com vida na companhia de amigas. Inicialmente as amigas disseram que ela teria saído do bar Pernambuco por volta das 4h30 dizendo que ia para casa sozinha, mas uma testemunha e provas periciais comprovaram que ela estava na obra acompanhada de uma amiga de nome Nayra Veloso, a Nayrinha. E, possivelmente de um homem.

No dia seguinte a morte da jovem Mamede concedeu uma entrevista a imprensa onde ele afirmou que apesar dos anos de experiência na polícia, estava chocado com a brutalidade do assassinato.

“Chocou não só a mim como a família e toda a sociedade pelo excesso de crueldade e pela forma violenta como ela foi assassinada. O vigias repetia a versão dada no depoimento de ontem de que estava a uma certa distância mas viu uma pessoa, aparentemente jovem e do sexo masculino, entrando na obra. No entanto, por temor ou descaso não teve a preocupação de verificar de quem se tratava”, afirma Mamede Rodrigues.

Apesar disso, Mamede passou a negar todas as afirmações e após sua saída do caso. Adotou o silêncio sobre o caso. Mas uma pessoa, Cassandra, tia de Fernanda, tem muito o que revelar ainda sobre o que ouviu de Mamede Rodrigues. Cassandra não se convence com a atitude tomada por Mamede e acha que ele ouviu mais do que devia do vigia Domingos.

Fernanda estava com as unhas quebradas, levando peritos a afirmar tratar-se de uma evidencia que ela tentou se segurar em algo ou alguém. Cerca de seis metros do corpo de Fernanda foi encontrada a chave do carro que ela conduziu até o local, um Fiat Novo Uno de cor preta. Além da chave, as duas sandálias da garota foram encontras no local. Os objetos estavam distantes cinco metros um do outro. Peritos afirmaram inicialmente que sinais no corpo de Fernanda indicavam que ela reagiu e lutou para não ser morta.

Menos de um mês de sua morte, no dia 16 de setembro de 2011, o crime já dava sinais de que não seria elucidado facilmente; o ministério público designou mais dois promotores para acompanhar o caso. A atitude do Ministério Púbico Estadual foi tomada 24 horas depois do Ministério Público Federal e da OAB-PI cobrarem mais rigor do órgão no acompanhamento do caso.

Com o novo decreto, os promotores Ubiracy de Sousa Rocha e José Eliardo de Sousa Cabral juntam-se oficialmente a João Mendes Benigno Filho no acompanhamento das investigações. Os três compõem o Núcleo das Promotorias do Tribunal do Júri da Comarca de Teresina. Mas não demorou muito, Benigno saiu do caso.

No mesmo dia o promotor Ubiraci Rocha, concedeu entrevista exclusiva ao Portal AZ. Já com um discurso firme, Ubiraci descartou “a possibilidade que essa ocorrência criminosa não tenha sido homicídio”. Contrariando a afirmação de Benigno Filho que acreditava na possibilidade de suicídio cometido pela estudante.

Veja a entrevista completa aqui

No inicio dos trabalhos os promotores já encontraram contradições no depoimento do vigia Domingos, fato sustentado até hoje. Foi constatado tanto pela polícia civil como federal que tanto o vigia, quanto Nayra mentiam e ambos chegaram a ser presos por obstruremi o trabalho da justiça, mas ainda assim a investigação não avançou.

Mesmo com a prisão dos dois e pedidos do advogado da família que fosse realizada uma acareação entre Cassandra Lages, tia de Fernanda que ouviu a declaração do vigia, e o delegado Mamede, ela nunca aconteceu.

Outro ponto polêmico do processo são as provas que foram perdidas ao longo da investigação. As pegadas marcadas pelo coronel Almeida foram contaminadas por um policial civil que colocou o pé em cima, segundo ele para saber o tamanho do pé. O computador de Fernanda teve a senha alterada ainda no 5º DP por um policial que alegou que não havia nada de importante no notebook, apenas cenas de sexo entre dois homens. Tanto o computador como o pen drive que estavam no carro de Fernanda nunca foram devolvidos para a família. A polícia civil afirmou que o celular que foi encontrado há cerca de 5 metros do corpo da estudante chegou a ser enviado para a empresa Nokia, mas não foi conseguido restaurar informações no mesmo.

Recentemente a tia e o pai de Fernanda Lages concederam uma entrevista ao Sistema O Dia, onde relataram todas as falhas cometidas pela polícia civil. Paulo chegou a confirmar que um dos delegados comentou que a PF ia pedir ao final do inquérito punição para os delegados da civil, devido a quantidade de falhas na investigação.

Cassandra afirmou que ainda na fase da Polícia Civil o inquérito passou a ficar tumultuado depois que uma sobrinha do ex-deputado José Ribamar Pereira, o Cabelouro prestou depoimento colocando um novo personagem no cenário dos acontecimentos.

De acordo com Cassandra, Pauliene, sobrinha de Cabelouro, chegou a afirmar em depoimento a CICO, que certa vez foi apresentada ao engenheiro Jivago Castro, dono da construtora responsável pela obra do Tribunal Regional do Trabalho, por Fernanda Lages quando o engenheiro foi buscá-la em seu apartamento. Fernanda o apresentou a amiga como seu namorado. O delegado que presidiu o inquérito da Polícia Civil, Paulo Nogueira, desconsiderou o depoimento alegando que Pauliene é míope.

Nessa mesma entrevista, os familiares de Fernanda falaram da relação conturbada com os delegados e agentes, tanto da polícia civil, quanto da federal.Paulo Lages diz que em alguns momentos foi atendido com deboche pelo delegado da Comissão Investigadora do Crime Organizado (CICO), Paulo Nogueira.

“Teve um momento ainda na CICO que enquanto eu falava, ele fazia chacota do que eu dizia com expressões faciais; na hora eu reclamei e a partir daí eu vi que não havia seriedade na investigação”, comenta.

Com o Delegado Freitas da Polícia Federal, a relação não melhorou, e o delegado chegou em alguns momentos a criticar o advogado da família e a pedir que os familiares de Fernanda não o levassem mais nas suas idas a sede da Polícia Federal.

“Ele disse que o Dr Lucas era uma pessoa de outro planeta, inclusive disse que eu não falasse isso a ele, e muitas vezes pediu que nós fossemos conversar com ele sem o Dr Lucas”, afirmou Paulo Lages.

Mesmo com toda repercussão do caso a família prefere não apontar um ou outro como responsável ou envolvido na morte de Fernanda. “Nós da família, nunca culpamos ninguém, nunca fomos nas televisões dizer que foi fulano ou beltrano, as pessoas que se apressaram em negar o crime”, afirma.

O Caso Fernanda como ficou conhecido, completa hoje dois anos, mas apesar do tempo dá indícios que não será esquecido. Os promotores de justiça do caso devolveram o inquérito para a polícia civil e fizeram o pedido de novas diligencias. Já a família pede que seja feita uma autópsia psicológica da vítima, para saber se Fernanda possuía o perfil suicida.

Com as novas diligências os promotores querem a identificação da terceira pessoa que estaria no local do crime junto com Fernanda e sua amiga Nayra, uma hora antes da morte da jovem. Uma testemunha confirma a presença e o inquérito da Polícia Federal aponta a presença dessa pessoa que seria do sexo feminino. Os promotores acreditam que a identificação dessa pessoa deve ajudar a elucidar o caso.

Resta esperar agora pela decisão dos promotores de justiça que chegaram a renunciar ao caso alegando falta de estrutura.

Fonte: A. Azevedo