JORGE CARVALHO
Na edição de hoje desta coluna nada de debates sobre temas científicos. Apenas uma singela homenagem a meu primo, o poeta Jorge Carvalho, que exaltava Parnaíba, por ficar pertinho dos seus, de sua casa, seus museus, seus quintais e estar próximo de “amigos para abraçar/birinaites a sorver/novidades a versar/papos, catiripapos a saber”.
A homenagem que ora se presta, não descaracteriza a finalidade desta Coluna, criada para debater temas jurídicos. É que Jorge Carvalho, além de poeta, era um grande estudioso da ciência jurídica e um excelente operador do Direito.
Jorge contava com orgulho as histórias do tempo em que estudava na tradicional Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife, época em que foi líder estudantil e diretor cultural da entidade representativa dos estudantes.
A faculdade de Direito de Recife, criada por D. Pedro I no dia 11 de agosto de 1827, sempre figurou entre as melhores instituições de ensino jurídico do país, e por ela passaram Barão do Rio Branco, Clóvis Beviláqua, Joaquim Nabuco, Pontes de Miranda, Tobias Barreto, Teixeira de Freitas, Pinto Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda, Augusto dos Anjos, Paulo Freire, Ruy Barbosa, Castro Alves, dentre outras personalidades. É a segunda faculdade que mais formou ministros do STF.
A vocação poética, muita leitura, um curso jurídico bem feito — em que estudava nos livros de autoria dos seus próprios professores —, cursos de pós-graduação e participação efetiva em inúmeros congressos, tudo isso fez de Jorge Carvalho um homem culto, de rara inteligência e memória privilegiadíssima, digno de um ex-aluno da pioneira faculdade de Direito do Brasil.
Desprovido de vaidade e sem ambição pessoal, optou por não fazer carreira solo na literatura. Digo isto, porque Jorge Carvalho, uma verdadeira “enciclopédia ambulante”, poderia ter escrito sozinho diversos livros de poesia, história, Direito e genealogia parnaibana/piauiense, mas preferia participar de coletâneas e contribuir com movimentos literários e artísticos, agindo mais como um indutor da cultura de sua terra e pensando sempre no coletivo.
Apreciava a arte e a cultura. Possuía uma das maiores bibliotecas do Estado, improvisando livros em todos os espaços de seu enorme quarto, afora os que existiam dentro de caixas, tendo sido, ainda, um dos maiores colecionadores de obras de arte do Piauí, com acervo de quadros e esculturas, preferencialmente de artistas da terra, os quais, aliás, gostava de prestigiar.
Tornou-se, por concurso público, auditor fiscal do Ministério do Trabalho e, nessa função de garantir o cumprimento das leis trabalhistas, exerceu, com a sensibilidade de um poeta, um trabalho social de alta relevância. Sua preocupação constante com o combate à desigualdade e à pobreza fê-lo escrever a seguinte poesia, publicada na prestigiada antologia “Poemágico”.
ESCRAVOS DE “JOB”
Vegetam peças, outrora seres
Morrendo prá máquina viver!
A produção sonega deveres:
direitos d’escravos do poder.
Esforço, oh! Suor: “osso” , oh!
O suor vale menos
Que o (de)vil metal. . .
“time”, please! Plus valia. . .
Homem!
Trabalhas prá passar fhome. . .
Ó mendigo!
Batalhas pra fhome pa$$ar?
Homem, digo!
Trabalhas alimentando mitos y motos:
Homem. . .Homen. . .home. . .ômi. . . .
Man. . . . .ma. . . . .maq. . . . .MÁQUINA.
Máquinas maquiavélicas. . .
Movidas a salário mínimo
O mínimo salário que escravisa.
Escravos de “job”
Trabalha sem cessar.
Bota, tira, por um miserê,
(e vai.
As máquinas automáticas. . .
Fazem. . . . .zig-zig-zá.
O espaço desta coluna é curto, não comporta o muito que eu gostaria de escrever. Penso em homenagear Jorge Carvalho na próxima edição do Almanaque da Parnaíba, pois seria guardar a sua monumental trajetória no nosso repositório maior de arquivos históricos.
Salve Jorge!