É certo que esta Coluna tem o propósito de estimular leitura e debates sobre assuntos jurídicos. Mas, não necessariamente precisamos tratar os temas com excessivo rigor científico, nem escrever apenas sobre ensinamentos extraídos dos livros, da prática forense ou da sala de aula.
O nome da Coluna é Amplo Direito exatamente porque o objetivo é discutir assuntos jurídicos numa linguagem simples e acessível a todos, trazendo para fora do ambiente acadêmico o debate de temas que possam interessar à coletividade.
Afinal, o Direito faz parte do nosso cotidiano e está presente em todos os agrupamentos humanos, por todas as horas, inclusive tenho a convicção de que as primeiras noções de Justiça eu aprendi em casa, quando criança, com meus pais, pois eles sempre me transmitiram o significado daquilo que é justo e está de acordo com o ideal de Justiça.
Por exemplo, hoje, quando estudo os princípios gerais do Direito, tecnicamente emanados do Direito Romano, vejo que constam dos livros aquilo que meus pais sempre me ensinaram através dos conselhos e de suas próprias condutas: a) não lesar ninguém (neminem laedere); b) dar a cada um o que é seu (suum cuique tribuere) e c) viver honestamente (honeste vivere).
Ao ensinarem com naturalidade, e sem tecnicismo, a viver honestamente, dando a cada um o que é seu, sem prejudicar ninguém, intuitivamente meus pais estavam me repassando valores jurídicos relacionados à ideia de boa-fé e justiça distributiva.
Ainda na infância, quando minha mãe orientava que eu dividisse um presente ou um bolo com irmãs(aos), de modo implícito, estava me ensinando que “a família atual busca sua identificação na solidariedade (art. 3º, I, da Constituição), como um dos fundamentos da afetividade”, exatamente como acentua o jurista Paulo Lobo, no livro Famílias.
Ao acolher todos os meus amigos em sua casa, de portas abertas, servindo lanches e até se adaptando à linguagem dos jovens para melhor recebê-los, minha mãe, mesmo sem qualquer preocupação de ordem técnica-científica, punha em prática o princípio da igualdade de tratamento, respeitando as diferenças individuais e tratando a todos com o devido e necessário respeito.
Minha mãe, no âmbito do lar, era assim: Magistrada quando decidia sobre o melhor para os filhos(as) e marido, e fazia prevalecer sua decisão. Advogada, quando sabia sugerir de forma discreta os argumentos que considerasse os mais pertinentes para a ocasião. Mediadora, quando, até mesmo com o silêncio, possibilitava que se criassem soluções ideais para todos, e Promotora, por ter sido sempre responsável pelo atendimento necessário ao marido, filhos(as) e amigos(as), na garantia do bem-estar de cada um.
As noções de Justiça que aprendi em minha infância, consolidadas através das relações jurídicas familiares, estão enraizadas na minha memória e isto para mim tem mais significado do que tudo o que aprendi em sala de aula ou na praxe forense.
Saudades da minha primeira professora de Direito, minha Mãe.