Mudança de ritmo. Construtoras elevam número de lançamentos diante de aumento da confiança do consumidor e de estímulos de crédito para a compra da casa própria pela Caixa Econômica Federal, que liberou R$ 16 bilhões - Ana Branco / O Globo/20-11-2015
Mudança de ritmo. Construtoras elevam número de lançamentos diante de aumento da confiança do consumidor e de estímulos de crédito para a compra da casa própria pela Caixa Econômica Federal, que liberou R$ 16 bilhões – Ana Branco / O Globo/20-11-2015

Caixa libera R$ 16 bilhões para financiamento.

Os sinais de que a economia começa a se recuperar e a maior confiança tanto de empresários como de consumidores nos rumos do país estão sendo um estímulo para incorporadoras e construtoras de imóveis desengavetarem projetos. Um levantamento da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) mostra que, de janeiro a maio, o número de novas unidades em construção no país chegou a 5,7 mil, uma alta de 24,7% na comparação com igual período de 2015. Há casos de construtoras em que o aumento de lançamentos chegou a 72%. As novas regras da Caixa Econômica de estímulo ao crédito imobiliário, tanto às empresas quanto a pessoas físicas, que entraram vigor ontem e somam R$ 16 bilhões, deverão aquecer ainda mais o setor, que teve um desempenho combalido em 2015. Para as empresas, 2016 está sendo considerado um ano de retomada de fôlego.

Temos notado uma mudança de humor, com maior confiança da população e dos empresários na economia. Isso é fundamental para que o mercado imobiliário retome o crescimento. Os lançamentos já voltam a ganhar ritmo, e as medidas de estímulo da Caixa ajudam porque atendem a uma faixa de compradores (de maior renda) que não era contemplada — afirma Luís Fernando Moura, diretor da Abrainc, que reúne 20 empresas do setor que atuam em todo o país.

A Caixa dobrou o valor de avaliação dos imóveis de R$ 1,5 milhão para R$ 3 milhões para financiamento pelo Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), voltado a quem quer adquirir imóveis acima de R$ 750 mil. O banco vai liberar R$ 6 bilhões para esta linha e mais R$ 10 bilhões para financiar as construtoras.

CONDIÇÕES FAVORÁVEIS AO CONSUMIDOR

Segundo o vice-presidente de Habitação da Caixa, Nelson Antonio de Souza, as medidas, além de estimular as vendas e aquecer o setor, vão permitir ao banco — que detém 67% de participação no mercado — cumprir a meta de aplicação em crédito imobiliário de R$ 93 bilhões em 2016. Também estão nessa conta os recursos do FGTS, destinados ao Minha Casa Minha Vida.

A expectativa é executar todo o orçamento, além de aumentar a velocidade das vendas e a própria economia. A construção civil é um dos setores que respondem mais rapidamente a medidas de estímulo — disse Souza, acrescentando que o simulador de empréstimo da Caixa chega a ter 6,5 milhões de acessos por mês.

No Rio, os estímulos da Caixa são vistos como um sinal de melhora, mas ainda tímido.

No setor, a certeza é de que saímos do fundo do poço. O governo dizer que vai dar mais crédito é ótimo. Mas não traz resultado imediato. Mostra que o banco quer financiar, e isso vai mexer com as taxas dos bancos privados. Nos últimos 60 dias, as vendas estão melhores — afirma João Paulo Matos, presidente da Ademi-RJ, entidade que reúne as construtoras cariocas.

Para Moura, da Abrainc, o aumento no número de lançamentos mostra que as incorporadoras acreditam que haverá retomada das vendas, no médio prazo, já que os empreendimentos demoram de dois a três anos para serem concluídos. Em 2015, os lançamentos somaram 64,1 mil unidades, uma queda de 15,4% em relação ao ano anterior. Para este ano, as empresas dizem que os lançamentos terão mais fôlego, e as vendas vão apontar um início de recuperação. Nos primeiros cinco meses de 2016, foram vendidas 8,5 mil unidades, ainda um recuo de 14,7% em relação ao mesmo período do ano passado. Mas, no segundo semestre, diz o diretor da associação, essa queda deve ser amenizada pelas medidas da Caixa.

Bruno Serpa Pinto, vice-presidente de Operações da Brasil Brokers para o Rio, acredita que o momento favorece o consumidor, com queda de preços e condições melhores de negociação:

As pessoas estão voltando a comprar porque as condições estão favoráveis. As incorporadoras tiveram aumento no endividamento e apresentam dificuldades de caixa. Elas baixaram o preço de venda para pagar financiamentos adquiridos de obras já realizadas.

No Grupo Rodobens, os lançamentos imobiliários somaram R$ 169 milhões no primeiro semestre deste ano, um crescimento de 72% sobre o feito em igual período de 2015. O presidente da empresa, Mauro Meinberg, reconhece a melhora, mas diz que ainda é preciso cautela.

Retomamos os lançamentos, mas em praças que fizemos um trabalho exaustivo para avaliar se havia demanda efetiva. Temos indícios preliminares de melhora nos índices de confiança, mas ainda acompanhamos a melhora das condições de mercado — disse, acrescentando que a empresa também estuda os lançamentos de concorrentes, para ter certeza que não haverá uma superoferta, frustrando as vendas futuras.

A Eztec, empresa que atua em São Paulo no segmento de alto padrão, lançou, no ano passado, apenas dois empreendimentos, o pior desempenho desde a abertura de capital, em 2007. Neste ano, até junho, fez dois lançamentos e outros seis projetos estão praticamente finalizados.

Qualquer estímulo feito pela Caixa, mesmo que modesto, é importante, pois, como ela tem participação de mercado muito forte, faz com que os bancos privados sigam o mesmo caminho — avaliou Emílio Fugazza, diretor financeiro da Eztec.

A Direcional Engenharia e a MRV, ambas com foco no segmento Minha Casa Minha Vida, apresentaram crescimento nos lançamentos no primeiro semestre deste ano, respectivamente, de 55% e 3,5%, comparado ao mesmo período de 2015. Na Gafisa, os lançamentos totalizaram R$ 853,7 milhões no primeiro semestre, um crescimento de 7% em relação aos seis primeiros meses de 2015. A maior responsável pela alta é a marca Tenda, de imóveis econômicos, nas regras do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), avaliados em até R$ 750 mil.

SE DEMANDA CRESCER, PODE FALTAR IMÓVEL EM 2017

O segmento coberto pelo SFH foi exatamente o mais afetado no ano passado. Além da retração econômica, agravada pela incerteza política, essa parcela ainda sofreu com a elevação dos juros e a restrição do crédito pela Caixa, que passou a exigir uma entrada maior. Isso porque a instituição estava praticamente sem recursos para esses empréstimos devido ao alto volume de saques da caderneta de poupança, que é a principal fonte de recursos do SFH. O resultado foi o cancelamento de muitos contratos (os chamados distratos), já que os mutuários não tinham como arcar com os financiamentos dos imóveis comprados na planta.

João Paulo Matos, que também é diretor da Calçada, ressalta que, no último fim de semana, vendeu 40 das 90 unidades em estoque da construtora em projetos no Recreio dos Bandeirantes, a maioria de distratos ou devolução por inadimplência.

O preço dos imóveis anunciados para venda no Rio acumula queda de 1,71% em 12 meses, segundo o Índice FipeZap, apurado em 20 municípios do país. Apesar de estar entre as oito cidades que registraram variação negativa, o Rio continua a ter o metro quadrado mais caro do país, por R$ 10.251, bem acima da média nacional, de R$ 7.635. Segundo Serpa Pinto, a cidade tem um estoque para vender por 14 meses, na velocidade atual de comercialização:

Se a demanda reaquecer, já em 2017 poderá haver falta de imóveis novos para a venda.

Para Rubem Vasconcelos, presidente da imobiliária Patrimóvel, a janela de oportunidade para o comprador está se fechando:

A demanda está reprimida, pela suspensão dos lançamentos, quando retomar, haverá retomada dos preços.

Fonte: O Globo