poesiaO que é poesia?

     De forma simples pode-se dizer que poesia é a arte da palavra que traduz uma percepção subjetiva da realidade. É a transformação de ideias e de emoções em palavras carregadas de significado e de expressividade.

     Na ARTE RETÓRICA E ARTE POÈTICA, Aristóteles ensina  que a poesia é imitação (mimésis) pela voz e, dessa forma,  se diferencia das artes plásticas que imitam pela cor e pela forma. A mimésis, a que a expressão metafórica está intimamente ligada, é o ponto central na caracterização da natureza da poesia. Partindo dessa premissa, Aristóteles passa a estudar as diferentes espécies de poesia segundo os objetos imitados, a origem da poesia e seus gêneros.

     Se a poesia é mimésis e metáfora, conclui-se que ela representa a verdade através da mentira: “A arte é uma mentira que revela a verdade” (Picasso).

     O entendimento de que o real é a verdade fingida se encontra num dos textos mais instigantes de outro gênio do século XX:

 

               “O poeta é um fingidor.

               Finge tão completamente

               Que chega a fingir que é dor

               A dor que deveras sente.”

                       ( Fernando Pessoa  –  “Autopsicografia”)

 

     Mário Faustino se refere à poesia como aquilo que não pode ser conceituado:

 

                                 “  –  Que é poesia?

                                 –  Nenhum de nós pode pretender,

                    lucidamente, apresentar sobre isso um conceito

                    definitivo. O mais que podemos fazer é procurar

                    estabelecer, discutindo o assunto por algum tempo,

                    o que representa para nós, a esta altura, aquilo que

                    chamamos de poesia”.

 

     A primeira parte do livro POESIA-EXPERIÊNCIA, de Mário Faustino, são reflexões sobre o significado da poesia e sobre a posição que o poeta contemporâneo deve assumir diante dos problemas de sua época.. Para que poesia? Para ensinar, para comover, para deleitar? … E que dizer da utilidade  social da poesia? Em que pode a poesia servir à sociedade? Qual o papel do poeta perante a sociedade no seio da qual vive? Eis aí algumas indagações a partir das quais o autor desenvolve, em forma de diálogo, ideias sobre o tema.

     Vários poetas que tentaram definir a poesia ou o fazer poético através de metapoemas, isto é, poemas sobre a própria poesia, ressaltam que a linguagem literária  –  expressão intuitiva e individual  –  é impotente para representar a realidade real ou imaginada, o que não o impede de “lutar com palavras” (…)/ mal rompe a manhã”, como diz Carlos Drummond de Andrade no poema “O Lutador”.      

       A última estrofe do poema de minha autoria  –  “Fundo e Forma”  –  encerra a mensagem de que poesia é palavra com a qual o poeta se ilude e trabalha:

 

               poema  –  semente fincada

               na ordem/desordem alfabéticas:

              letra  –  P  –  e outras co’as quais

             se ilude e peleja o poeta.”

 

     Cabe aqui a transcrição dos seguintes versos:

 

                    “melodiosa palavra

                    não melosa entretanto

                    palavra com ideia

                    tão livre quanto vento.

 

          palavra para o ouvido musical

          palavra para a imaginação visual

          palavra para o pensamento real

          código para se decodificar.

 

                    palavra que na síntese

                    das sínteses poundianas

                    é sinal igual a

 

                            melopeia

                            fanopeia

                            logopeia.

 

                            ( Alcenor Candeira Filho  –  “Teoria do Poema”)

 

     “Teoria do Poema” mostra que a poesia é um fenômeno linguístico e estético destinado a ser lido ou ouvido e decodificado pelo leitor. É expressão rítmica do belo, sendo elaborada com palavras melodiosas mas não melosas,  palavras livres como o vento, ou seja, como ensina Ezra Pound, palavras para

      – o ouvido musical (melopeia)

      – a imaginação visual (fanopeia)

      – o pensamento real (logopeia).

 

     Finalmente, cito mais um poema de minha autoria:

 

                              FINALIDADE

                “conquanto nada lhe custe

                o poema o poeta não faz

                para que à rígida norma

                d’arte pela arte se ajuste

                reduzindo tudo a

                forma e fôrma e fôrma e forma.

 

               conquanto nada lhe custe

               não faz o poema o poeta

               para deleite no avião,

               mas para que o deglutam

               mesmo fora do café

               qual manteiga leite e pão.

 

               conquanto nada lhe custe

              não faz o poema o poeta

              para embalar o que sonha

              com mil fantasmas no escuro

              como se o poema pudesse

             ser sombra insânia ou insônia.

 

           conquanto nada lhe custe

           trabalha o poema o poeta

           para que ele  –  como deve  – 

           seja senha som e seta.”

 

      Esse poema tenta  responder à pergunta  –  para que poesia?

      Embora nada lhe custe, o poeta luta com palavras na construção do poema para que ele não  seja

          –  simples objeto de perfeição formal

          –  simples objeto de diversão

          –  simples cantiga de ninar

mas sim

         –  senha: sinal/indício

         –  som: melodia/ritmo

         –  seta: direção/leitor.

     Encerro estas reflexões sobre a poesia recorrendo mais uma vez a Fernando Pessoa:  “A poesia é uma música que se faz com ideias, e por isso com palavras”.