PARNAÍBA, TERRA DE HERÓIS VI
Vitor de Athayde Couto
Parabéns à Parnaíba, pelo seu aniversário!
Esta é a sexta e última crônica escrita em homenagem à invicta cidade, pela passagem do seu 176º aniversário. Mas há controvérsias. Os auto-declarados escritores, de tanto estudar nas revistinhas da Disney, ainda discutem se é 176, 167, 671, ou 761. Esses são os números inscritos nas roupas de presidiários da família metralha, inclusive do vovô. O genial Barks, seu criador, garante que o vovô metralha perdeu a memória e vive se atrapalhando com a combinação dos algarismos 1, 6 e 7. Como diz a Francisca: “eu acho isso muito lindo” – o que torna Parnaíba uma das cidades mais divertidas do mundo, e agradável de se viver. Acho muito fácil ser feliz em Parnaíba: é só não levar nada a sério.
Meus amigos tocadores são ótimos contadores de história. Aprendo muito com eles. Seu Mendonça havia estabelecido uma lei muito rigorosa para as manhãs de domingo na casa do seu Chico:
– A gente está aqui para brincar e se divertir. Ninguém fala em problema, seja de doença, dívida, ladrão, duplicata vencida… muito menos serasa, haha.
Outro, não me lembro quem foi (não é só o vovô metralha que anda esquecido), arrematou na hora, dirigindo-se a mim:
– Professor, aqui a gente nunca discute essas três coisas: política, futebol e religião.
Mas eu sei que todos acabam indo votar no dia da eleição. Votam errado, mas votam. Até porque eles dizem que é quase impossível votar certo em Parnaíba. Eu pensava que era só em Salvador. Esse “quase” daria uma ótima discussão, mas é melhor não, haha.
Sei também que cada um torce fervorosamente pelo seu time. Time europeu, claro. Já não vale a pena torcer por nenhum time brasileiro. Eles vão usando as últimas camisas do flu, do fla… até se acabarem. Restarão só as camisas da Emirates, Toyota…
Quanto à religião, eu sei que todos eles rezam. Rezam na cartilha de Deus, como Ele mandou, ou seja: cada um, discretamente, trancado no seu quarto, sem trombetear.
O certo é que todos nós, parnaibanos, adoramos falar do passado. E é fácil saber por quê. Em Parnaíba, dá mais resultado falar do passado do que do presente. Quem ainda duvidava disso, aprendeu com a pandemia. Como dizem os amigos espíritas, a exemplo do Antônio: quem não chega pela alegria, chega pela dor, pelo sofrimento. Mas um dia chega até Deus. Isso é o que importa, sem excluir os ateus convictos. Até porque muitos ateus estão mais próximos de Deus do que muita gente pensa.
Respeitamo-nos uns aos outros, assim como respeitamos os nossos heróis musicais. E os nossos maiores heróis parnaibanos são filhos de deuses e deusas, assim como os heróis musicais de todas as cidades brasileiras onde ainda se consegue ouvir um violão, um piano, um sopro, um bandolim, um pandeiro, um surdo, ou, simplesmente, uma voz – que é o instrumento musical mais belo, desde sempre.
Fica aqui minha homenagem aos músicos parnaibanos que estudam, dominam e ainda conseguem transmitir alguma linguagem musical, em meio a tanto barulho, cada dia mais infernal. E é por essa razão que os considero heróis. Heroísmo supõe coragem, preparo e competência para enfrentar, mesmo discretamente, como concerne ao bom gosto, o paredão dos decibéis patrocinados inclusive pelo mau uso do dinheiro público.
Na sua simplicidade de filho dileto de Pixinguinha, Chiquinha, Herivelto, Nazaré, Garoto, Clementina, Goodmann, Jacó, Baden, Aldir, Waldir, Radamés, Abel, Sivuca, Zequinha, Pernambuco, Cartola, Jobim, Donga, Caymmi, Jobim, João Gilberto e tantos outros deuses e deusas… ele era chamado simplesmente de tocador, por sua querida Goia, que lhe deu toda atenção e carinho até os seus últimos dias. Refiro-me ao meu saudoso amigo, de grande talento musical, Domingos Cunha. Hoje ele toca no céu, com Chico e Sansão. E com os anjos, nas datas comemorativas, para uma plateia educada, divina, e sempre atenta.
Neste 176º aniversário (ou qualquer que seja a sua idade), Parnaíba e todos os seus heróis tocadores estão de parabéns.
Assim, encerro a série “Parnaíba, terra de heróis”, uma declaração de humor à minha cidade natal. Fazer rir é sempre um grande desafio, maior ainda nesses temos difíceis de pandemia. Continuo com as crônicas semanais das sextas-feiras. Para amanhã, o tema é “Sanatório geral”. Nem escrevi ainda, e já estou rindo. Se vocês também rirem, seremos muito mais felizes. Agradeço ao Portal Costa Norte pela oportunidade.
Cuidem-se!!! (ops, gastei mais três pontos de exclamação do meu estoque)