SEMANÁRIO JURÍDICO.  EDIÇÃO DE 12.08.2022.

JOSINO RIBEIRO NETO

 

PRINCÍPIOS JURÍDICOS. IMPORTÂNCIA NA ELABORAÇÃO DAS LEIS.

A coluna, rotineiramente se manifesta acerca da importância dos princípios jurídicos como norteadores na composição de arcabouço das regras (normas)  de um país.

Sem dúvida, os princípios constituem alicerces básicos na metodologia do direito, como afirmam os doutrinadores, constituem liame em torno de uma mesma nota, ainda que em tons diferentes, entre a ciência e a prática.

Pode-se afirmar, sem temor de qualquer contestação, que hoje, no Brasil, o direito é norteado e aplicado a partir de seus princípios.

Nesta edição, seguem resumidas  considerações sobre o PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE, que tem estreitas ligações com o direito de família, biológica ou não, considerando o entendimento doutrinário moderno acerca do temo.

O jurista Paulo Luiz Netto Lobo, um dos autores do livro “DICIONÁRIO DE PRINCÍPIOS JURÍDICOS”, Editora Campus Jurídico, p. 46, firma o seguinte conceito:

“Princípio que fundamenta o direito de família na estabilidade das relações socioafetivas , de natureza cultural ou sociológica, principalmente na filiação.”  

A afetividade é sentimento mais ligado a laços familiares, outrora, de natureza somente biológica.

Mas, na atualidade, o modelo tradicional perdeu espaço e a efetividade pode resultar de ligação de convivência, resultando de tal fato, direitos, inclusive a possibilidade de receber pensão alimentícia.

Então, a Constituição não tutela apenas a família matrimonializada e já não estabelece distinção entre filhos  biológicos e não biológicos, o que deve ser considerado é o liame marcado por atos de amor, zelo e afeto. As pessoas que se unem em comunhão de afeto, não podem ou não querendo ter filhos, é família protegida pelo Texto Fundamental.

Sobre a matéria o autor supra referenciado (ob. cit. p. 49), afirma: “O modelo tradicional e o modelo científico partem de um equívoco de base: a família atual já não é exclusivamente, a biológica. A origem biológica era indispensável à família patriarcal, para cumprir suas funções tradicionais. Contudo, o modelo patriarcal desapareceu nas relações sociais brasileiras, após a urbanização crescente e a emancipação feminina, na segunda metade do Século XX. No âmbito jurídico, encerrou definitivamente seu ciclo após o advento da Constituição de 1988.”

Atualmente encontram-se na Constituição Federal fundamentos essenciais do PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE, constitutivos dessa profunda evolução social da família, em especial, o que vem ocorrendo durante as últimas décadas do Século XX:

a)     todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem (art. 227, § 6º); b) a adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente no plano da igualdade de direitos  (art. 227, §§ 5º e 6º); c) a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, tem a mesma dignidade de família constitucionalmente protegida (art. 226, § 4º); d) a convivência familiar ( e não a origem biológica) é prioridade absoluta assegurada à criança e ao adolescente (art. 227).

Por fim, se pode afirmar que o PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE também tem seu respaldo em fundamentos constitucionais mais elásticos, a exemplo do princípio da solidariedade (art. 3º, I, CF) e do princípio da dignidade da pessoa humana ( art. 1, III, da CF).

 

CONTRATO. INSTRUMENTO PARTICULAR. TESTEMUNHAS.

Os brasileiros ainda sofrem influências culturais, especialmente, no aspecto jurídico, das velhas Ordenações, MANUELINAS, AFONSINAS e FILIPINAS, cujas definições colhe-se do DICIONÁRIO JURÍDICO, 5ª edição, Editora EDIÇÕES TRABALHISTAS, p. 642, composto por Cristovão Piragibe Tostes Malta e Júlia Brotero Lefère, conforme segue.

Compilações de textos legislativos portugueses, iniciando-se com as Ordenações Afonsinas. Estas foram baixadas em 1446/1447. Continham 5 livros, sendo o 1º sobre os ofícios públicos e seus regimentos; o 2º sobre jurisdição especial a ser dada às pessoas e aos bens da Igreja, direitos do Rei e outros assuntos, inclusive concordatas; o 3º constava principalmente de processo civil; o 4º continha legislação referente ao Direito Civil substantivo e o 5º ao Direito Criminal e respectivo processo. Aceitavam como subsidiário o Direito Romano, salvo onde houvesse pecado, hipótese em que deveria recorrer ao Direito Canônico. Em seguida tivemos as Ordenações Manuelinas, saídas em parte em 1514 e tendo a primeira impressão concluída em 1521. Com exceção do Livro I, eram muito semelhantes às anteriores. Seguindo, tivemos as Ordenações Filipinas, ordenadas pelo de`l Rei Felipe, o primeiro. Vigoraram em Portugal como legislação até o ano de 1868,

As normas das Ordenações tiverem e ainda têm influencia na origem das normas brasileiras, algumas, restaram impregnadas costumes, podem afirmar, passaram a integrar a nossa cultura, especialmente, nos contratos (Direito das Obrigações).

Nas repartições cartorárias ainda prevalecem regras originarias das velhas Ordenações, tipos selos, reconhecimentos de firmas, contratos testemunhados, entre outras exigências bolorentas.

Contratos particulares, ainda que resultem avenças insignificantes, não obstante a assinatura das partes, ainda se exige que seja testemunhado.

Mas, com o passar do tempo, mitigado pela jurisprudênca, a assinatura em contratos particulares vem perdendo a força, a ponto de se considerar válida a assinatura das testemunhas posteriormente à data em que foi firmado e, também, considerar válida, a vontade das partes contratantes independentemente de ter sido ou não testemunhado.

A decisão do Superior Tribunal de Justiça a seguir transcrita é exemplo da mitigação referenciada.

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DISTRATO. DOCUMENTO PARTICULAR. ASSINATURA DAS TESTEMUNHAS POSTERIOR AO AJUSTE. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Conforme bem delineado no acórdão recorrido, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “o fato das testemunhas do documento particular não estarem presentes ao ato de sua formação não retira a sua executoriedade, uma vez que as assinaturas podem ser feitas em momento posterior ao ato de criação do título executivo extrajudicial, sendo as testemunhas meramente instrumentárias” (REsp n. 541.267/RJ, Relator o Ministro Jorge Scartezzini, DJ de 17/10/2005).

2. Verifica-se, assim, que a decisão da Corte estadual está em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior, incidindo, portanto, o óbice da Súmula n. 83/STJ, aplicável também à irresignação pela alínea c do permissivo constitucional.

3. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp n. 1.993.919/GO, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 4/4/2022, DJe de 7/4/2022.)