RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO ORIUNDA DA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE. IMPLICAÇÕES PRÁTICAS
Crescente torna-se a necessidade de se explanar o tema que tanto incomoda os profissionais de saúde, mormente a classe médica de nosso estado e capital.
O termo responsabilidade civil provoca reações mormente nos mais jovens que, recém saídos dos hospitais, seja pelo término do internato, seja pela consecução de residência, ingressam no mercado de trabalho com todas as espécies de histórias a respeito de um conhecido médico que já tivera de responder à justiça por uma suposta consequência de ato seu.
Desde consequências indesejáveis de cirurgias, a óbitos de neonatos no processo de parto, perpassando por óbitos de pacientes em utis, à piora de sintomas de alguma enfermidade após o tratamento; o campo para que se desenvolva um questionamento interno no paciente a respeito do mal sucedido resultado do tratamento é por demais amplo, suprimindo, por vezes, noites de sono daqueles que sob juramento de Hipócrates adquiriram o título de Médico.
Assim, no contexto da informatização, com a divulgação célere de conteúdos informativos, a legislação passou a ser bem alcançada pela população o que ocasionou, nos últimos anos, um incremento diário na quantidade de demandas propostas no poder judiciário, grande porção delas requerendo alguma espécie de indenização, o que deixou a classe médica bem mais suscetível a essa espécie de investida.
A qualidade da prestação desenvolvida pelo médico, denominada serviços médicos, consolidou-se, para nossos julgadores do Superior Tribunal de Justiça, instância máxima da justiça comum a respeito das contendas envolvendo aplicação de lei federal, como uma relação de consumo, sendo o paciente o consumidor, e o médico, o prestador de serviço (STJ, Edcl no REsp 704.272, Recl. Min. Isabel Gallotti, 4ª T., dj 15/08/2012).
De consequência deste julgado, e dos outros inúmeros que o sucederam no mesmo sentido, resultou que se aplica o Código de Defesa do Consumidor em qualquer dos “problemas” levados à justiça que tenham origem na relação médico-paciente decorrente da prestação dos serviços médicos.
Tal fato, hoje pacificado, trouxe diversas vantagens processuais e materiais aos pacientes consumidores, e, por outro lado, uma necessidade de maior diligência por parte dos profissionais médicos, envolvendo um maior planejamento na consecução dos serviços, elaboração e disponibilização das informações ao paciente e na confecção, detalhamento, armazenamento e disponibilização dos prontuários, os quais, eventualmente servirão de prova para excluir a culpa do profissional de saúde.
Inúmeras são as consequências da adoção do Código de Defesa do Consumidor, cabendo serem citadas as mais impactantes, assim, se nas relações regidas pelo Código Civil a prescrição da pretensão do paciente para requerer a reparação de qualquer dano decorrente dos serviços médicos seria de 3 anos, a contar da data do fato, no Código de Defesa do Consumidor a prescrição ocorre em 5 anos a contar do conhecimento do dano e da sua autoria (art. 27), portanto, um prazo mais dilatado.
No antigo regime, contratualista-civilista, o paciente deveria fazer prova das suas alegações, caso ingressasse com a demanda em juízo, resultando numa dificuldade técnica, por ser a matéria médica bem específica e necessitar de perícia. Com a adoção do Código de Defesa do Consumidor, o magistrado poderá inverter o ônus da prova em decisão fundamentada (art. 6º, VIII do CDC), relegando ao médico, profissional liberal (art. 14, §4º do CDC), provar que não teve culpa no resultado mal-sucedido e não esperado da cirurgia,tratamento ou trabalho de parto.
Veja-se que o médico tem o dever, caso invertida a prova pelo magistrado, de provar que não incorreu em culpa quanto ao resultado, devendo demonstrar divergências na literatura medica, incerteza quanto ao sucesso do tratamento, utilização da técnica mais adequada ao caso ou suficiente ao caso.
Doutra monta, a obrigação do médico é de meio, e não de resultado, não podendo ser responsabilizado se, apesar do esforços empregados terem sido os exigidos pela literatura médica, o paciente não tenha alcançado o resultado esperado. Salvo em caso de cirurgias plásticas, e tratamentos estéticos, onde se tem a obrigação de alcançar determinado resultado (REsp n. 1.46.632/RJ, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 13/11/2013.), desde que alcançável, diga-se de passagem.
Um último ponto importante desta sucinta exposição, e que pode causar um grande desconforto nos profissionais médicos, diz respeito ao foro competente para se processar e julgar as ações que tratem de responsabilidade civil do medico.
Sabe-se que Teresina, assim como outras capitais, são polos avançados de medicina, que atendem a população de diversos estados brasileiros, no nosso caso, a população do Tocantins, Pará e Maranhão.
Assim, firmada a premissa de que a legislação regente das demandas envolvendo médicos e pacientes é o Código de Defesa do Consumidor, o foro competente para processar e julgar a demanda é o do paciente-autor, portanto, se o mesmo reside em Santarém/PA,vem a Teresina, realiza um tratamento, e por qualquer motivo referente ao tratamento, decide ingressar com uma demanda contra o médico responsável, o profissional muito provavelmente terá que se deslocar ao foro de Santarém-PA para tomar parte nas audiências marcadas, nesse sentido o art. 101, I do Código de Defesa do Consumidor.
Portanto, com o crescente número demandas, faz-se necessário por parte das clínicas, uma política de prevenção e repressão de litígios, devendo contar com a consultoria frequente de profissionais de advocacia, numa espécie de prevenção a perdas por meio de indenizações, haja vista a tendencia de aumento das demandas em sede de responsabilidade civil.
Por Dmitri Figueiredo. Advogado especialista em direito público e demandas consumeristas, integrante do quadro profissional do escritório Josino Ribeiro Neto & Advogados.
Obra consultada: NETTO, Felipe PeixotoBraga. Manual de direito do consumidor: à luz da jurisprudência do STJ. 11ª ed. rev. atual. ampl. Salvador: Juspodivm, 216