SEMANÁRIO JURÍDICO – EDIÇÃO DE 29.01.2021

JOSINO RIBEIRO NETO

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PIAUÍ. VAGA DE DESEMBARGADOR.

 

O Desembargador BRANDÃO DE CARVALHO, que ocupa vaga de advogado, do quinto constitucional, no Tribunal de Justiça do Piauí, este ano se aposentará, por força do limite de idade.

 

A vaga já está sendo antecipadamente disputada por alguns advogados, ávidos por um “emprego” na magistratura, em afronta a ética, pois o magistrado ainda continua no cargo, em pleno exercício do seu múnus púbico.

 

Aos apressados um conselho. Em situações semelhantes nem sempre quem se lança prematuramente chega à reta final, isto é, conseguem a pretendida nomeação, pois são “queimados” pelos competidores silenciosos.

 

Quanto ao Des. BRANDÃO DE CARVALHO, gozando de boa saúde física e mental, despede-se do cargo  em pleno vigor e, certamente, se dedicará a advocacia, atividade exercida com dedicação, zelo e competência, antes  de ser magistrado.

 

DIREITO DAS SUCESSÕES. TESTAMENTO PARTICULAR. VALIDADE.

 

É cada vez mais crescente a preocupação de quem dispõe de patrimônio a ser dividido no caso de sucessão, em especial, quando pode antever disputas e desentendimentos entre os herdeiros no processo de inventário e partilha de bens, buscar a via testamentária, para deixar parcialmente resolvido o problema futuro.

 

Existem no Código Civil as formas de testamentos, sendo os procedimentos ordinários, que são o testamento público, o testamento cerrado e o testamento particular, os mais usuais.

 

A coluna, que dispõe de espaço exíguo de publicação, faz breves comentos acerca do TESTAMENTO PARTICULAR, disciplinado nos artigos 1.876 a 1.880, do Código Civil, merecendo transcrição a primeira das regras.

 

Art. 1876. “O testamento particular pode ser escrito de próprio punho ou mediante processo mecânico.

 

§ 1º Se escrito de próprio punho, são requisitos essenciais à sua validade seja lido e assinado por quem o escreveu, na presença de pelo menos três testemunhas, que devem subscrever.

 

§ 2º Se elaborado por processo mecânico, não pode conter rasuras ou espaços em branco, devendo ser assinado pelo testador, depois de o ter lido na presença de pelo menos três testemunhas, que o subscreverão”.

 

O que se pode afirmar, inicialmente, é que as regras que disciplinam a feitura de testamentos, outrora aplicadas rigorosamente, vêm sendo mitigadas por decisões judiciais, em especial, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), restando firmado o entendimento de que importa, na apreciação de cada caso, é a intenção, isto é, a vontade do testador.

 

À guisa de exemplificação, seguem alguns exemplos colhidos na jurisprudência dominante sobre a matéria.

 

Não há falar em nulidade do ato de disposição de última vontade (testamento particular), apontando-se preterição de formalidade essencial (leitura do testamento perante três testemunhas), quando as provas dos autos confirmam, de forma inequívoca, que o documento foi firmado pelo próprio testador, por livre e espontânea vontade e, por três testemunhas idôneas, não pairando qualquer dúvida quanto à capacidade mental do de cujus, no momento do ato. O rigor formal deve ceder ante a necessidade de se atender à finalidade do aro, regularmente praticado por testador” (STJ, 3ª T., REsp. 828.616, DJu 23.10.2006).

 

“A jurisprudência desta Corte tem flexibilizado as formalidades prescritas em lei no tocante às testemunhas do testamento particular quando o documento tiver sido escrito e assinado pelo testador e as demais circunstâncias dos autos indicam que o ato reflete a vontade do testador. No caso dos autos, o testamento é apócrifo, não sendo, portanto, possível concluir de modo seguro que o testamento redigido de próprio punho exprime a real vontade do testador”.  (STJ – 3ª T., Resp 1.444.867, Min. Ricardo Cueva,. J. 23.9.14, maioria, DJ 31.10.14).

 

Resp 1.633.254-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção por maioria, julgado em 11.03.2020, DJe 18.03.2020. “Testamento particular escrito por meio mecânico. Ausência de assinatura de próprio punho do testador. Aposição de sua impressão digital. Validade do testamento. Violação do art. 1.876, § 2º, do Código Civil. Inocorrência. Observância da real vontade do testador”.

 

Em sede de comentários à decisão supra consta do INFORMATIVO 667, do site do STJ o seguinte:

 

“É válido o testamento particular que, a despeito de não ter sido assinado de próprio punho pela testadora, contou com a sua impressão digital.

 

Em se tratando de sucessão testamentária, o objetivo a ser alcançado é a preservação da manifestação de última vontade do falecido, devendo as formalidades previstas em lei serem examinadas à luz dessa diretriz máxima, sopesando-se, sempre casuisticamente, se a ausência de uma delas é suficiente para comprometer a validade do testamento em confronto com os demais elementos de prova produzidos, sob pena de ser frustrado o real desejo do testador.

 

Conquanto a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça permita, sempre excepcionalmente, a relativização de apenas algumas das formalidades exigidas pelo Código Civil e somente em determinadas hipóteses, o critério segundo o qual se estipulam, previamente, quais vícios são sanáveis e quais são insanáveis é nitidamente insuficiente, devendo a questão ser verificada sob diferente prisma, examinando-se se da ausência da formalidade exigida em lei efetivamente resulta alguma dúvida quanto à vontade do testador.

 

Em uma sociedade que é comprovadamente menos formalista, na qual as pessoas não mais se individualizam por sua assinatura de próprio punho, mas, sim, por seus tokens, chaves, logins e senhas, ID’s, certificações digitais, reconhecimentos faciais, digitais, oculares e, até mesmo, pelos seus hábitos profissionais, de consumo e de vida, captados a partir da reiterada e diária coleta de seus dados pessoais, e na qual se admite a celebração de negócios jurídicos complexos e vultosos até mesmo por redes sociais ou por meros cliques, o papel e a caneta esferográfica perdem diariamente o seu valor e a sua relevância, devendo ser examinados em conjunto com os demais elementos que permitam aferir ser aquela a real vontade do contratante.

 

A regra segundo a qual a assinatura de próprio punho é requisito de validade do testamento particular, pois, traz consigo a presunção de que aquela é a real vontade do testador, tratando-se, todavia, de uma presunção juris tantum, admitindo-se, ainda que excepcionalmente, a prova de que, se porventura ausente a assinatura nos moldes exigidos pela lei, ainda assim era aquela a real vontade do testador.

 

É preciso, pois, repensar o direito civil codificado à luz da nossa atual realidade social, sob pena de se conferirem soluções jurídicas inexequíveis, inviáveis ou simplesmente ultrapassadas pelos problemas trazidos pela sociedade contemporânea.

 

No caso, a despeito da ausência de assinatura de próprio punho do testador e de o testamento ter sido lavrado a rogo e apenas com a aposição de sua impressão digital, não havia dúvida acerca da manifestação de última vontade da testadora que, embora sofrendo com limitações físicas, não possuía nenhuma restrição cognitiva”.