SEU CUNHA 

Vitor de Athayde Couto

No tempo do regime militar, um dos ditadores de plantão apresentava-se como amante do futebol. Conforme recomendavam os marqueteiros, também de plantão, o então “presidente” esforçava-se para se fazer popular. Tudo era planejado pelas agências de publicidade, inclusive a escolha do seu jogador preferido, que tinha por que tinha de ser convocado para a seleção, e nenhuma comissão técnica jamais se atreveria a discordar.

Até o radinho de pilha do “presidente” era do mesmo modelo daqueles que o povão usava nos estádios. A propósito, fico me perguntando por que mudaram os nomes dos estádios para arenas, já que o campo continua sendo coberto por gramados, inclusive sintéticos. Arena, só se fosse de areia, não é mesmo? M’enfin! – como diriam os franceses.

Como o governo militar se endividava facilmente, tomando muitos empréstimos de alto risco, tanto de eurodólares e petrodólares, quanto do FMI, não faltava dinheiro para construir estádios. Afinal, o futebol era o principal instrumento de controle social e de garantia de resultados favoráveis ao regime nas chamadas “eleições”. Pronto, virou moda. Todo governador queria ter o seu estádio bem grande, o maior possível, de preferência com o seu nome, como prevaleceu na região Nordeste. E no aumentativo! Foi assim que surgiram os albertões, almeidões, barretões, batistões, castelões, nelsões, tomazões, trapichões e outros arenões, com exceção de Alagoas, que prestou justa homenagem ao Rei Pelé. Felizmente, para os baianos, Salvador manteve um nome que, além de histórico, é muito bonito: Fonte Nova, dada a sua localização ao lado do também belíssimo Dique do Tororó, onde fui beber água, mas a água já não era mais água.

Como tudo no Brasil, as empreiteiras logo se alvoroçaram e a moda chegou aos gabinetes dos prefeitos municipais. Todo prefeito-maria-vai-com-as-outras queria ter estádio com seu nomezinho, ops, nomezão. Igualzinho às outras modas como parques de exposição, corações nas praças, e arcos na entrada das cidades. “Eu amo…”, “Bem-vindo…”, tudo, tudo igual.

Eis que, no interior do Nordeste, havia um prefeito conhecido como Seu Cunha. Por ser um grande aliado do regime e frequentador de quartéis, nosso valente não demorou em conseguir uma boa verba do governo federal. Mas, pra variar, a obra do estádio estava bastante atrasada e o campeonato estava para começar. O povo, já impaciente, não parava de perguntar:

– E o Cunhão? Cadê o Cunhão? Esse Cunhão sai ou não sai?

Esse é o meu povo, o povo brasileiro!

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