Depois de mais de um ano marcada por dor, desconfiança e uma injustiça sem precedentes, a parnaibana Lucélia Maria da Conceição Silva finalmente teve o nome limpo. Presa sob acusação de matar duas crianças envenenadas, ela foi absolvida pela Justiça na última terça-feira (14), e teve decisão judicial divulgada nesta quinta (16), proferida pelo juiz José Carlos da Fonseca Lima Amorim.

O caso aconteceu em agosto de 2024, quando dois irmãos, de sete e oito anos, morreram após supostamente comer cajus envenenados. Na época, Lucélia — vizinha das vítimas — foi apontada como principal suspeita. O que parecia um crime cruel, no entanto, virou uma tragédia dupla, revelando falhas graves nas investigações iniciais.

A reviravolta veio com o resultado da perícia: os cajus analisados não continham veneno. Mesmo assim, até a divulgação do laudo, Lucélia passou cinco meses presa na Penitenciária Feminina Gardênia Gomes Lima, em Teresina. Ela foi libertada apenas em 13 de janeiro de 2025. Ao retornar para Parnaíba, encontrou apenas os escombros da própria casa, destruída por populares revoltados com o crime que ela não cometeu.

O advogado Sammai Cavalcante, que representa Lucélia, informou que a defesa vai ingressar com uma ação indenizatória contra o Estado do Piauí, pedindo até R$ 1 milhão em reparação.

Relembre o caso

As vítimas, João Miguel Silva, de 7 anos, e Ulisses Gabriel Silva, de 8, foram internadas em 22 de agosto de 2024, com sintomas de envenenamento. O irmão mais novo morreu dias depois, e o mais velho, em 10 de novembro. A mãe das crianças, Francisca Maria da Silva, também seria vítima de um novo episódio de envenenamento em 1º de janeiro deste ano, que matou ainda três filhos e um irmão.

Com o avanço das investigações, a Polícia Civil identificou outros suspeitos: Maria dos Aflitos Silva e Francisco de Assis Pereira da Costa, que hoje respondem na Justiça por envenenar membros da mesma família.  Segundo o Ministério Público, o casal teria agido de forma premeditada e cruel, controlando a comida e adicionando veneno a diferentes refeições.

Em depoimentos, Maria dos Aflitos chegou a negar os crimes, mas admitiu suspeitar do companheiro. Ela acabou presa em 31 de janeiro, após a perícia detectar traços de terbufós (um tipo de agrotóxico altamente tóxico) no corpo de uma vizinha, Maria Jocilene, que morreu após tomar café em sua casa.

Documentos apreendidos revelaram ainda que Francisco de Assis tinha obsessão por substâncias tóxicas e ideias nazistas, o que reforçou a suspeita de motivação mórbida e calculada.

A absolvição de Lucélia Maria encerra um capítulo doloroso, mas reacende o debate sobre os danos causados por acusações precipitadas e a responsabilidade do Estado em garantir que a Justiça não seja apenas feita — mas que também não destrua inocentes no caminho.