ALGUÉM PEIDARAM
Vitor de Athayde Couto
– Quem nunca ouviu na infância: “Alguém peidaram, porém não foram eu”?
– Tá bom, tá bom, mas… e kiko?
– Ora, mano. Isso tem uma importância extraordinária para o aprendizado.
– Então sisplique, bora!
– Calma… relaxe… respire… conte até mil trezentos e vinte e sete.
– Bora, rapá! Entrega logo!
– Então, quem não teve infância nunca vai compreender esta lógica: “Agora eu era o herói / E o meu cavalo só falava inglês…” (ouça aqui).
– E o que significa isso?
– Você não sabe? É Joãozinho e Maria, a história do fim de um relacionamento.
– Do cavalo? E com quem?
– Por enquanto só se sabe que não foi com uma égua.
– Égua. Quem terá sido?
– Sim, quem terá sido? Eis a questão. Será que foi o rei?
– E kiko?
– Oxe, isso remete para aquela redação do Joãozinho, na escola. Lembra não?
– Não.
– Já vi que você nunca estudou em escola pública. Sabe é de nada.
– Pois conte, seu sabereza.
– A professora pediu para os alunos fazerem uma redação tratando dos seguintes assuntos: sexo, nobreza, religião e mistério. Um minuto depois Joãozinho entregou um papel para a professora.
– Desistiu, Joãozinho? Não vai fazer a redação? – perguntou a pró, surpresa.
– Já fiz, pró. Tá tudo aí – respondeu Joãozinho.
– Tudo, mesmo? Você falou de sexo, nobreza, religião e mistério?
– Sim, senhora. Como lhe disse, tá tudo aí.
Joãozinho disse tchau e tomou o rumo da porta de saída.
A professora, curiosa, leu o que Joãozinho escreveu: “Comeram o cu da rainha. Meu Deus, quem terá sido?”
– Haha!
– Não ria, mano. Isso é sério. Primeiro, a pró ficou chocada, devido à sua formação religiosa e às recomendações de sua vó para que ela sempre trilhasse o caminho das pessoas de bem.
– Pessoas de bem são pessoas sem cu? Num cagam, não?
– Escuta, rapá! Pestenção! Em seguida a pró avaliou a redação e corrigiu assim: “Comeram a rainha…”. Comeram a rainha? Aff… A pró logo percebeu que, se tirar o cu, a história fica sem graça. Finalmente, depois de muito refletir, reconheceu que a redação do Joãozinho merece nota dez, porque revela objetividade, um poder de síntese raramente visto.
– Sério?
– Oxe! Pra comunicar essa mesma coisa tem gente que escreve páginas e mais páginas cheias de vírgulas, próclises, mesóclises, entretantos… e até o cacoete da vez.
– E qual é o cacoete da vez?
– “Nesse sentido… Nesse sentido…”
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Escute o texto com a narração do próprio autor: