(Discurso proferido por Alcenor Candeira Filho, no auditório do CMRV/UFPI, em 25.10.2017, na solenidade de posse do acadêmico Manuel Domingos Neto).
Idealizada por José Pinheiro de Carvalho e fundada em 23.07.1983 por um grupo de seis pessoas, a Academia Parnaibana de Letras foi instalada solenemente em 19.10.1983 – Dia do Piauí -, com a posse conjunta de dezoito acadêmicos fundadores. Recentemente realizou-se outra inesquecível solenidade de posse de quatro novos confrades: Antônio de Pádua Marques Silva, Antônio Gallas Pimentel, Breno Ponte de Brito e Roberto Cajubá da Costa Brito.
A Academia Parnaibana de Letras ampliou, em 2017, de 35 para 40 membros efetivos e elegeu por aclamação os seguintes acadêmicos: Paulo de Tarso Mendes de Sousa (Patrono: Antônio José de Sousa), Manuel Domingos Neto (Patrono: José Rodrigues de Melo e Silva), José Hamilton Furtado Castelo Branco (Patrono: Epaminondas Castelo Branco), Francisco Valdeci de Sousa Cavalcante (Patrono: Gerardo Ponte Cavalcante) e Marco Antônio Siqueira (Patrono: Evandro Lins e Silva).
Foi com alegria que recebi do acadêmico Manuel Domingos Neto a incumbência de fazer o discurso de recepção. Cabe a cada empossado reportar-se aos respectivos patronos. Aproveito o ensejo para dizer que conheci a todos eles e por todos sempre tive grande admiração e respeito.
São também de amizade, admiração e respeito os laços que me unem aos cinco novos acadêmicos, particularmente os três que hoje tomam posse como membros da APAL.
Trata-se de velhos e queridos amigos, ao lado dos quais já participei de vários projetos culturais e educacionais executados na cidade. Há pouco tempo publiquei em portais e blogues piauienses um depoimento sobre Manuel Domingos, de modo que não há como não conservar neste discurso a essência do que disse anteriormente.
Ao longo de décadas tive conhecimento de importantes episódios de que ele participou como intelectual e idealista.
Manuel Domingos Neto é uma pessoa que a vida inteira vem praticando as virtudes de vida exemplar – decência, bondade, estudo e trabalho -, aliadas a forte inclinação para o combate corajoso em defesa das classes marginalizadas.
Dois anos mais novo do que eu, não me lembro de ter conhecido Manuel Domingos na infância e adolescência, apesar de eu ter nascido e crescido em casa bem próxima do estabelecimento comercial de seu avô, Ranulpho Torres Raposo, na avenida Presidente Vargas.
O primeiro contato com ele ocorreu em fins de 1983 e logo depois ele me enviou o livro que escreveu em parceria com o professor Geraldo Almeida Borges – SECA SECULORUM, FLAGELO E MITO NA ECONOMIA RURAL PIAUIENSE, editado pela Fundação CEPRO, com a seguinte dedicatória:
Alcenor,
Foi uma alegria ter te conhecido. Tenho certeza de que temos muita coisa para fazer nesta terra. É preciso, sobretudo, não perder tempo!
Aguardo notícias.
Um grande abraço.
Manuel Domingos.
The, 19.01.84.
No ano seguinte Manuel Domingos me pediu uma colaboração para a 60ª edição do ALMANAQUE DA PARNAÍBA, fundado em 1924 por Benedicto dos Santos Lima, o Bembem, que o manteve até 1941, com 18 edições, e que a partir de 1942 passou a ser dirigido por seu avô Ranulpho Torres Raposo, responsável por, 41 edições ininterruptas (1942/1982).
No auge da mocidade, estudante do curso de história da Universidade Federal do Ceará, concluído em 1971, Manuel Domingos engajou-se com muito entusiasmo na ação política estudantil como membro da AÇÃO POPULAR-AP, organização política clandestina de esquerda extraparlamentar, influenciada pelo socialismo de fundo católico e que, segundo a Wikipédia, buscava “inspiração ideológica em Emmanuel Mounier, nos jesuítas Teilhard de Chardin e Henrique Cláudio de Lima Vaz, Jacques Maritain e no dominicano Louis-Joseph Lebret”.
A AÇÃO POPULAR foi constituída por líderes estudantis, destacando-se Herbert de Sousa (Betinho), Aldo Arantes, Vinícius Caldeira Brant. Alguns de seus membros chegaram a exercer, com a redemocratização do país, relevantes cargos públicos, como José Serra, Cristóvem Buarque, Plínio de Arruda Sampaio e Manuel Domingos Neto, que foi deputado federal, e vice-presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico-CNPq.
Por conta de sua militância contra a ditadura militar de 1964, Manuel Domingos foi preso, torturado e expulso do país. Morou na Inglaterra e na França, onde fez doutorado em História na Universidade de Paris.
Retornando ao Brasil foi professor da Universidade Federal do Ceará e da Universidade Federal Fluminense, além de pesquisador da Fundação Getúlio Vargas, Ministério da Agricultura e Fundação CEPRO.
essa brilhante carreira acadêmica de Manuel Domingos Neto, destaca-se a sua permanente colaboração científica em TENSÕES MUNDIAIS – Revista do Observatório das Nacionalidades – a partir da primeira edição, que publicou um dos mais importantes artigos do novel acadêmico: “O Militar e a Civilização”, trabalho que foi traduzido para o inglês.
Manuel Domingos Neto foi um dos fundadores da ABED – Associação Brasileira de Estudo de Defesa -, sediada no Rio de Janeiro e de que foi presidente.
Publicou vários livros, destacando-se O QUE OS NETOS DOS VAQUEIROS ME CONTARAM, “que destaca a criação extensiva de gado bovino na construção do Brasil, os problemas do desenvolvimento socioeconômico regional e a reprodução do poder político no meio rural nordestino”.
Sobre esse livro esclarece o autor: “Eu busquei fazer uma reprodução do poder da época. Desde as figuras mais importantes da história do Piauí no século XX, até os seus grandes inimigos. Isso tudo partindo dos depoimentos colhidos em 1984, quando eu tinha aberto um laboratório oral em Teresina”.
Outra obra importante de sua lavra, em parceria com Geraldo Almeida Borges, é SECA SECULORUM, FLAGELO E MITO NA ECONOMIA RURAL PIAUIENSE, “resultado de mais de dois anos de pesquisas em fontes primárias e secundárias, com o objetivo de desvendar as características básicas do complexo fenômeno da ‘seca’ no Estado do Piauí”, como disse Antônio Adala Carnib, superintendente da Fundação CEPRO.
Natural de Fortaleza-CE (1949), Manuel Domingos Neto é filho de Pedro de Castro Pereira e Florice Raposo Pereira. Tem três filhas e é casado com a arquiteta e professora Diva Maria Freire Figueiredo.
Atualmente reside em Parnaíba, onde como professor visitante da Universidade Estadual do Piauí-UESPI trabalha nas áreas de pesquisa, ensino e extensão e vem se dedicando à recuperação do prédio da avenida presidente Vargas em que seu avô manteve atividade empresarial, com o propósito de nele instalar o Gabinete de Leitura Ranulpho Torres Raposo.
Apesar de ser uma das cidades do Nordeste brasileiro de grande tradição cultural, tendo hoje diversas faculdades públicas e privadas (inclusive duas de medicina), com cerca de treze mil universitários, – Parnaíba é dotada de poucas bibliotecas, destacando-se pelo acervo de livros e revistas, organização, direção e atendimento ao público a do SESC/CAIXEIRAL e a do Campus Ministro Reis Velloso/Universidade Federal do Piauí.
Na administração de Mirocles de Campos Veras, foi inaugurada em 1942 a Biblioteca Pública Municipal, que leva o nome desse grande médico e administrador, estruturada e organizada de conformidade com as instruções do Instituto Nacional do Livro.
Ao longo de 75 anos de existência a biblioteca pública de Parnaíba mereceu pouca atenção dos gestores municipais, encontrando-se atualmente em precárias condições de instalação e funcionamento e com acervo completamente desatualizado e desorganizado, além de pouco frequentada pela população.
Em qualquer cidade, especialmente nas que possuem poucos espaços culturais, como ocorre em Parnaíba, a biblioteca pública deveria ser a instituição cultural mais importante no município.
Pelo acesso fácil e direto, as bibliotecas concorrem para a formação de leitores e promoção do hábito de leitura, indispensáveis à informação e à transmissão de conhecimentos.
A missão essencial de centro de difusão cultural de uma cidade só pode ser cumprida se suas bibliotecas dispuserem de acervo constantemente renovado com publicações de diversos gêneros artísticos, científicos e filosóficos, bem como com equipamentos e funcionários suficientes para mantê-las em funcionamento.
A biblioteca moderna necessita não apenas de bom acervo de livros e revistas, mas também precisa ser informatizada de modo a propiciar aos frequentadores pesquisas na internet e acesso a CDs e DVDs.
O Gabinete de Leitura vai dispor de um acervo de cerca de sete mil livros, fazendo parte desse acervo a coleção completa do ALMANAQUE DA PARNAÍBA, com 70 edições.
Até hoje, já perto dos 70 anos de idade, Manuel Domingos Neto vem se comportando e agindo publicamente com a mesma força do ideal que conduziu seus passos na mocidade. Recentemente o vi no meio do povo, na praça da Graça, em Parnaíba, ouvindo atentamente os oradores que se pronunciavam na concentração cívica de apoio à Greve Geral do dia 28 de abril de 2017 realizada em todo o país. A cada grito de – Fora Temer! – erguia o braço direito, punho cerrado, com o mesmo entusiasmo de outrora e de sempre. E eu cá comigo: Puxa, por que não chamam o Manuel Domingos para falar? Eis que ao final da concentração, lá estava o grande professor com o microfone na mão. Compreendi então que o deixaram para o final para que a festa popular, de que jamais me esquecerei, fosse encerrada com chave de ouro.
Senhoras e Senhores,
Senhores e Senhoras,
A nossa academia tem sido comandada em todos os períodos de existência por diretorias responsáveis e competentes, como a atual, presidida por José Luís de Carvalho.
Apesar das dificuldades materiais, a academia vem acumulando boas conquistas no plano imaterial através, por exemplo, da publicação de dez edições do ALMANAQUE DA PARNAÍBA, de lançamentos de livros, de promoção de concursos literários e do ingresso de sete acadêmicos empossados em 2017 e de dois outros que tomarão posse brevemente.
Acadêmico Manuel Domingos Neto, a Academia Parnaibana de Letras o recebe com muita alegria.
Por Alcenor Candeira Filho