ECONOMIA DA SOLIDÃO
Vitor de Athayde Couto
“Antes só do que mal acompanhado” parece uma frase inocente. Todavia o capitalismo, como sempre, absorve e transforma tudo e qualquer coisa em mais um jeito de ganhar dinheiro. Estou falando da Economia da Solidão.
Engana-se quem pensa tratar-se de algum nicho de mercado de senhorinhas e tiozinhos. Pesquisa do Gallup/Meta constatou que “a maior solidão está entre as pessoas de 15 a 29 anos, ou 25% a 27% dos pesquisados, ligeiramente acima da média mundial. No ano passado (2023), 24% (média mundial), isso mesmo, 24% da população de 142 países se declararam solitários.
Arredondando, são cerca de um bilhão de pessoas, portanto, um grande mercado, maior do que quatro Brasis. Segundo os pesquisadores, esse número pode ser maior ainda porque a China não foi pesquisada.
No Brasil, país quase sempre fora da curva, apenas 15% dos entrevistados afirmaram ser ou estar sozinhos. Talvez essa quantidade bem abaixo da média mundial se explique pela falta de infraestrutura – o que acaba confinando muitos solitários brasileiros em micro coletividades habitualmente chamadas de “seio da família”, seja lá o que isso possa significar. Mas na maioria não passam de grupos de pessoas que apenas dividem o mesmo teto, por falta de opção melhor. Teto nem sempre seguro, em todos os sentidos, desde o sentido físico (infraestrutura) até o afetivo.
Se um em cada quatro habitantes do planeta é solitário, pode-se considerar que o PIB da solidão é ligeiramente superior ao PIB da China, segundo o FMI e o BIRD, para 2023. Visto desse ângulo, o PIB da solidão seria a segunda maior economia do mundo.
Qual a importância disso no mundo dos negócios? A recente pandemia revelou a mercadoria ícone da economia da solidão, que bateu todos os recordes de vendas. Trata-se do Lovot, um robô que imita animais de estimação e se deixa abraçar. Em seguida incluem-se aí os pets, as petshops e toda a rede de serviços de apoio aos lovots de verdade.
Bonecas infláveis quase humanas coloca o Japão em destaque nesse tipo de negócio num mercado que também oferece namoradas humanas de aluguel. Sim, sim, de verdade.
A indústria do entretenimento está cada vez mais voltada para solitários, com destaque para os games e outras pornografias.
Como exemplo, a coisa funciona mais ou menos assim: o pizzaiolo solitário repassa a sua solidão para o embalador solitário, que repassa para o faturador solitário, que repassa para o entregador solitário, que repassa para o porteiro solitário do condomínio, que repassa para o consumidor solitário, que repassa a embalagem usada para o lixeiro solitário, que repassa para o catador…
Se o XIX foi o século da Filosofia, e o século XX, da tecnologia, o nosso século XXI é, sem dúvida, o século da solidão. Haja terapias e pipocas… na solidão do divã pós-freudiano, em frente à tela plana da tevê-maratona de 52 polegadas.
Fico imaginando o que será que as crianças brasileiras entendem quando o Cebolinha diz: “A tela é plana”. Depois, essas crianças crescem e…
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