EVOLUÇÃO DO PARNASIANÊS

 

Vitor de Athayde Couto

 

Em pouco tempo forma-se um atraente mercado interno em Parnasia. Mas um mercado não é só população. Consumidores devem ter rendimentos. Essas rendas familiares, por assim dizer, vêm da principal atividade: o turismo sexual. Os programas são pagos em cachês aos boys lixos e às modelos top-top.

 

Mani descobriu que os serviços são pagos com serviços: sexo, droga e sertanejo – além de ingressos para shows de sofrência. Não, não se fala mais em sexo, droga e rock n’ roll. A moda é polissexo, drug-delivery e pancadões, que os parnasianos apreciam bastante. Dão a isso o nome de música de alto nível, pois o som é sempre muito alto.

 

Na semana, as filas nas clínicas de otorrinos provam que a surdez tornou Parnasia um grande centro especializado em linguagem de libras. Quando os parnasianos estão se comunicando em libras, turistas fazem vídeos, pensando que se trata de uma dança local ou rito de passagem espiritual a Manitu.

 

O governo oferece kits promocionais e repete o mesmo xarope publicitário: “cabe no seu bolso”. Roteiros turistosos na Rota das Infecções fazem a festa de outros especialistas urolos e ginecos. Os postos de saúde e o pronto-socorro ficam lotados. Talvez isso explique por que Parnasia tornou-se um grande centro de saúde e estética. Grande, embora de qualidade duvidosa.

 

Consolida-se um moderno complexo industrial químico-farmacêutico. A exploração dos recursos naturais ao longo do rio Piroga Grande destaca-se pelo extrativismo do ipê amarelo, árvore-símbolo de Parnasia. Da flor amarela, o complexo produz tinta para cabelos artificialmente louros.

 

Para escapar da crise econômica, os capitães da indústria mandaram os lordes providenciarem uma lei municipal, de número 666, obrigando os falocratas e as falocratas, ou seja, todes, a pintar o cabelo pelo menos uma vez por semana. Essa lei passou fácil e por unanimidade na Câmara Municipal porque são os mesmos capitães que financiam as campanhas eleitorais dos candidatos a representantes do… povo, por assim dizer.

 

Meninas da facção céltica parnasiana misturam tinta vermelha na cor amarelo-ipê. Querem ser ruivas, mas que raiva! Isso só serviu para elas ganharem apelidos como formiga-de-fogo, sarará ou inferno na torre, conforme a tonalidade mais ou menos forte nos cabelos. Geralmente o resultado químico é uma espécie de marrom-cocô.

 

Assim prospera o comércio varejista de tintas. O censo registra uma elevada densidade lourográfica em Parnasia, onde também se observa a maior concentração, por metro quadrado, de louras com sobrancelhas e ppks pretas.

 

Tintas são compradas nas casas especializadas e nos supermercados. As gôndolas bem sortidas com produtos de beleza, exibem: maquiagem, lixas, tesouras, piranhas e barbeadores de pernas, sovacos e ppks. Essas gôndolas são maiores do que as de feijão, arroz e outros produtos menos essenciais.

 

Com um pouco mais de dinheiro, a clientela pode obter produtos diretamente dos fornecedores, através de redes de backpackers (sacoleiros), coaches e personal trainers, que são os consultores técnicos muito especializados, em parnasianês. Dizem que esses consultores são pós-graduados em Harvard, mas ninguém sabe se estudaram na matriz, ou em alguma franquia sudestina. Ou mesmo à distância, quando se formam websacoleiros e webconsultores.

 

Prosperam também serviços como salões de beleza (clínicas de estética, em parnasianês). Devido ao latinório das elites e ao falatório do povo, o parnasianês ficou mais rico. Acadêmicos propõem que o parnasianês deixe de ser um patuá, recebendo um upgrade que o levará ao status de língua viva.

 

Com a evolução do parnasianês, padaria virou delicatessen. Quitanda virou mercantil, supermercado, atacadão. Entrega é delivery. Comida de rua é food truck. Remarcação de preço é over price. Sapeco virou churrasco que virou barbecue. Xixo virou brochat, depois, espetinho. Empregado virou colaborador, depois sócio-parceiro. Só empresário continua sendo chamado de meu patrão.

 

Pra compensar a perda da lourice e dos olhos azuis, a tradição falocrata manda dar aos filhos do sexo masculino os mesmos prenomes dos pais, avôs ou tios. Por essa razão, os cartórios registram recém-nascidos como Filho, Neto ou Sobrinho no final do nome, causando revolta entre as feministas.

 

(próxima crônica: “FEMINISMO PARNASIANO”)

 

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Escute o texto com a narração do próprio autor: