MAIONESE, FREGUÊS?
Vitor de Athayde Couto
– O que significa freguês? Freguês é quem compra ou quem vende?
– Ora – diz Maruzinho – freguês é quem mora na freguesia.
– Pois na Bahia – explica Galerão, sempre se achando sabido – o tabuleiro da baiana não distingue quem compra de quem vende. Todo mundo é freguês.
– Verdade. Tem até o dia da baiana. Li num outdoor da Soterópolis, na Avenida Garibaldi:
25 DE NOVEMBRO
DIA DA BAIANA DE ACARAJÉ
ABRACE SUA FREGUESA
– Pois você que não abrace. Em Salvador, baiana de acarajé é que nem religião. Cada freguês tem a sua baiana. E todos são unânimes em dizer que a baiana do seu bairro faz o melhor acarajé. Na origem, o acarajé era só um bolinho de feijão fradinho frito no dendê, um falafel, sem mais. Com o tempo, foram inventando, inventando…
– Verdade. Até chegar na pimenta. Pimenta, tudo bem. Mas aí a coisa foi indo, foi indo… e tome-lhe caruru, e tome-lhe vatapá, e tome-lhe até saladinha! O acarajé virou uma bomba.
– Pois eu acho é pouco.
– Por quê?
– Por causa dessa mania que brasileiro tem de esculhambar a comida dos outros. Já enfiaram até catupiry no croissant, açúcar no guacamole, ketchup no estrogonofe, goiabada na pizza… Mas a vingança não tarda a chegar no espaço gurmê. Não demora vai ter baiana alemã raiz vendendo acarajé, na boca do metrô de Frankfurt. Acarajé com recheio de salsicha. A verdadeira baiana, que antes perguntava “pimenta, freguês?”, vai esquecer tudo isso. E eu não vou me surpreender quando ouvir uma baiana tipo heterodoxa segurar um acarajé vegano na mão esquerda e o refil de plástico na direita, e perguntar:
– Maionese, freguês?
Ao que o freguês responde com toda segurança:
– Hoje, não, baiana. Bote só um pouco de vinagre balsâmico e batata palha.
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Escute o texto com a narração do próprio autor: