Do ponto de vista jurídico, a noticia mais alvissareira neste final de ano foi a aprovação, pelo Senado, do novo Código de Processo Civil, numa sessão marcada por discursos otimistas, manifestações de júbilo e crença na ideia de que a partir de agora haverá simplificação e agilidade nos procedimentos judiciais de natureza civil.
O entusiasmo com o novo CPC é salutar e bastante compreensível, porque toda tentativa de aprimoramento é válida e a evolução sempre é necessária. Mas, nestes tempos de ceticismo, custa acreditar que após o período da vacatio legis todos os problemas relacionados à burocracia e lentidão dos processos estarão solucionados por conta da nova legislação.
O Ministro José Carlos Barbosa Moreira, no livro Temas de Direito Processual, nona série, pag. 373, ao abordar o problema da lentidão dos processos dizia que é ilusão pensar que “a chave para abreviar a duração dos processos consiste exclusivamente, ou principalmente, em mudanças na legislação processual. Semelhante ilusão responde pela espantosa catadupa de reformas legislativas, no Brasil e noutros países, ao longo dos últimos tempos, com resultados às vezes melancolicamente decepcionantes”.
De fato, lei alguma mudará uma realidade que é cultural. A reforma do CPC não obstante possa representar um avanço, contudo, não resolverá, sozinha, o problema da morosidade do Judiciário, que em grande parte é decorrente de sua própria estrutura e do conservadorismo dos operadores do direito.
Editar, ou simplesmente alterar, leis processuais pode ser uma tentativa, mas não o bastante para resolver o problema da lentidão dos processos. Inclusive, existem muitos dispositivos no CPC atual que poderiam reduzir a morosidade da Justiça, mas são subutilizados ou mesmo não utilizados.
O fato é que o problema da lentidão dos processos não será resolvido apenas com a mudança na legislação. É muito mais amplo do que isso! Passa, inclusive, pela falta de estrutura do Judiciário, falta de independência, tanto do ponto de vista interno, quanto do ponto de vista externo, sobretudo independência financeira. O TJPi, por exemplo, tem carência de mais de mil servidores e 72 juízes, e redimensionou o número de vagas para o próximo concurso público por conta do orçamento que foi reduzido, conforme publicado no “Blog do eu vou passar”, no dia 22.12.2014.
Em 2005, num Seminário sobre a reforma processual brasileira, que tratava especificamente das propostas de alteração do processo civil, o professor de Direito e Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, José Roberto dos Santos Bedaque, afirmou de modo peremptório que “Não adianta reforma enquanto nós não mudarmos mentalidade […]”. E disse mais:
[…] além dessa deficiência estrutural do Poder Judiciário. Aliás, este problema não há reforma processual que resolva. Há outro fator determinante para a morosidade do processo. Constitui um dos grandes óbices ao normal desenvolvimento da relação processual. É o problema do formalismo do processualista e do jurista em geral. A questão agora é muito mais cultural”.
As sábias palavras de José Roberto dos Santos Bedaque, proferidas em 2005, ainda são atualíssimas, até porque continua a deficiência estrutural do Poder Judiciário brasileiro e o formalismo cada vez mais se impondo, tanto que “o paradigma jurídico prevalecente ainda se dá sob bases do positivismo legalista, apoiado no exame dogmático de textos legislativos”, como revela Álvaro Ricardo de Sousa Cruz, no livro “Habermas e o Direito brasileiro”.
Enfim, embora louvável o esforço de notáveis juristas na elaboração do projeto do novo CPC, que, certamente, representará um avanço na legislação pátria, contudo, a nova legislação para surtir o efeito desejado necessitaria estar acompanhada da modernização do sistema de prestação jurisdicional e de uma formação crítica mais adequada nas universidades, o que me parece uma realidade bem distante ainda.
Por Roberto Cajubá