Religiões: NOTAS DE LEITURA 5

Vitor de Athayde Couto

– E por que tu fala tanto nesse IBGE? – perguntou vó Alika.

– Porque tudo está mudando muito rapidamente, vó – respondeu Ifé. – O IBGE não consegue  acompanhar tantas transformações. Cê tá vendo a minha cor? A senhora é preta-tinta-forte, mas, para o IBGE, eu sou parda.

– Tu também foi branqueada, fia?

– Sim, vó. Branqueamento é o projeto das elites brasileiras. Elas confundem desenvolvimento com branqueamento. Mas nunca seremos brancos porque descendemos do estupro colonial. Os brasileiros são filhos das entranhas do ventre sangrado de mães pretas e amarelas. Somos africanizados, como as abelhas que até pouco tempo eram “italianas”.

Um dia, quando todos os brasileiros forem pardos, não haverá mais ódio nem preconceito racial. Esse dia não tarda. O censo de 2022 já revela que o número de pardos superou o de brancos e pretos, pela primeira vez. A mídia ainda não se deu conta de que estamos diante de uma revolução colorida, e ao mesmo tempo demográfica, étnica, cultural e social.

– Não entendo nada do que tu fala, fia. Mas eu vi nos búzios que tu é fia de Nanã Buruquê, mãe da sabedoria. Sereis essa minha ideia, o que tu diz só pode ser verdade verdadeira como o reinado do divino.

– Salubá, Nanã! – saúda Ifé, e continua a folhear suas anotações, ansiosa pela divulgação dos dados definitivos do censo das religiões, prometida para este ano de 2025.

Ifé cresceu assim, muito curiosa. Até hoje, a cada censo, ela se admira ao ver que o mundo está mudando cada vez mais rápido. E o Brasil, mais rápido do que o mundo. Ela percebe que, entre familiares e outras pessoas das suas relações, muitos são intolerantes às mudanças e acabam adoecendo por isso. Porque a intolerância é um veneno que mata o coração bem devagar. Mata de ódio o intolerante; e, também, mata o outro, de desesperança. Infelizmente, no Ministério da Saúde inexistem protocolos para diagnóstico e tratamento da intolerância, esse mal do século. Afinal, em que acreditamos?

(CONTINUA)

________________________________________________________

Ouça o áudio com a narração do autor:

***

Caro leitor, tu também poderás ouvir este e outros textos, assistindo aos vídeos no canal YouTube do autor. Basta clicares aqui.