O advogado Willian Guimarães, que não deve sofrer nenhuma restrição no exercício de sua profissão, pelo fato de exercer o cargo de Presidente da OAB/PI (Foto: Reprodução)
O advogado Willian Guimarães, que não deve sofrer nenhuma restrição no exercício de sua profissão, pelo fato de exercer o cargo de Presidente da OAB/PI (Foto: Reprodução)

SEMANÁRIO JURÍDICO – EDIÇÃO DE 27.07.2014

JOSINO RIBEIRO NETO

O PRESIDENTE DA OAB/PI E O LIVRE EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE ADVOGADO.

Alguns profissionais da advocacia, liderados pelo advogado Celso Barros Neto, dirigiram requerimento ao Conselho da OAB/PI., pugnando pelo afastamento do Dr. Willian Guimarães do exercício do cargo de Presidente, por estar o mesmo prestando serviços de sua especialidade a um determinado grupo político concorrente a cargos eletivos nas próximas eleições.

A pretensão causa estranheza e as razões devem ser diversas do que consta do petitório. O Dr. Willian Guimarães é advogado militante e o fato de exercer o cargo de Presidente da OAB/PI., nada obsta que exerça sua profissão livremente.

No caso, prestar serviços advocatícios a um partido político  e seus integrantes,  pelo fato do Dr. Willian Guimarães ser Presidente da OAB/PI, não resta qualquer comprometimento ético ou  legal. A pretensão dos advogados, liderados pelo Dr. Celso Barros Neto, como afirmam, deve ter, como afirmei, outra motivação.

DIREITO DE FAMÍLIA – CASAMENTO – PESSOA IDOSA – REGIME DE BENS.

O art. 1.641, inciso II, do Código Civil, impõe o regime de separação de bens (separação, legal, obrigatória) no casamento da pessoa maior de 70 anos de idade.

O regrado é tido como inconstitucional por todos os doutrinadores. Seguem algumas considerações. Tiago Vieira Bomtempo ( Consulex, 418, p. 15), pontifica:

“Assim, verifica-se a inconstitucionalidade do art. 1.641, inciso II, do Código Civil, pois, no que tange à obrigatoriedade de adoção do regime da separação de bens no casamento de pessoas com mais de 70 anos, causa grave violação ao exercício da autonomia privada dos idosos. Isto não somente fere a dignidade da pessoa humana, como viola, por conseguinte, o Estado Democrático de Direito, obstando que os idosos decidam por si constituírem seus individuais projetos de vida. A vida, aliás, é uma construção, e o envelhecimento é o contínuo resultado de um processo de amadurecimento, que enseja mais sabedoria e reflexão do que limitações.”

O jurista Francismar Lamenza um dos comentaristas do “Código Civil Interpretado”,  editora Manole, 7ª edição, p. 1.408,  ao se reportar  sobre a vedação posta no art. 1.641, II, do CC, afirma:

“Apesar de o legislador tentar querer proteger o patrimônio da pessoa maior de 70 anos, evitando o chamado “golpe do baú” (no caso do indivíduo inescrupuloso que quer se beneficiar do matrimônio com pessoa bem mais velha para lhe tomar os bens), na verdade se tem presente um fato sui generis, que é a submissão de uma pessoa que tem capacidade e discernimento a respeito da vida a uma situação constrangedora e restritiva de sua liberdade para o relacionamento. Por haver contraste desse inciso com o disposto no art. 5º, I, da Magna Carta, tem-se essa restrição como abertamente inconstitucional. Chama-se a atenção para uma exceção à regra referente aos maiores de 60 anos, prevista no art. 45 da Lei n. 6.515/77 (união estável de mais de dez anos consecutivos ou da qual tenham resultado filhos). Aqui, os nubentes estabelecerão livremente o regime de bens – mais um motivo para se exigir a igualdade entre as pessoas maiores de 70 anos no tocante à escolha livre dos relacionamentos”.

Fernanda Paula Diniz, na dissertação de mestrado versando sobre “A Interpretação Constitucional dos Direitos dos Idosos no Código Civil” publicada na Revista Direito, 2007, p. 183, se reportando sobre o art. 1.641 , inciso II, do CC,  também se manifesta:

“Todavia, razão alguma assiste, uma vez que em razão da autonomia privada, pode qualquer indivíduo dispor de seus bens, desde que obedeça aos requisitos legais. Não é o fato de se encontrar em fase mais adiantada da vida que impossibilita ao idoso o exercício dessa autonomia, ou cria a obrigação de manutenção de seu patrimônio a fim de favorecer seus futuros herdeiros”.

A capacidade do ser humano é presumida e a incapacidade, que é exceção, tem que ser provada através de avaliação técnica especializada, que poderá resultar em interdição judicial. Não é pelo fato de o cidadão ou cidadã contar de 70 anos de idade, que deve ter a sua liberdade de decidir reduzida, notadamente, quando a longevidade no Brasil  é uma realidade comprovada.

Ainda em sede de manifestação doutrinária Carolina Lopes Cansado Campos e Maria Goreth Macedo Valadares, na obra “Direito Civil. Atualidades”, editora Del Rey, p. 111, argumentam que “Não pode existir uma idade presumida na qual todas as pessoas se tornam incapazes, até porque a capacidade é auferida individualmente, sendo a incapacidade considerada uma exceção para o ordenamento jurídico e nunca uma presunção”.

Por todas as razões argumentadas constata-se a inconstitucionalidade do art. 1.641, inciso II, do Código Civil, pois a obrigatoriedade de subordinação ao regime de separação total de bens no casamento de pessoas que atingiram 70 anos de idade, fere a dignidade humana, causa grave violação de autonomia de seus direitos e afronta o Estado Democrático de Direito.

FOTO: O advogado Willian Guimarães, que não deve sofrer nenhuma restrição no exercício de sua profissão, pelo fato de exercer o cargo de Presidente da OAB/PI.