O talentoso escritor OTON LUSTOSA, integrante das ACADEMIAS PIAUISENSE DE LETRAS E DE LETRAS JURÍDICAS, produziu mais um romance, prestigiando mais uma vez a cidade de Paranaguá (Pi.), sua terra natal, com enfoque especial para o GRANDE LAGO, que enriquece e embrinca a Cidade com os encantos de uma natureza viva proporcionada aos seus habitantes e visitantes.
Em homenagem ao autor, amantíssimo de sua terra natal, a coluna transcreve suas considerações sobre a motivação maior da composição do romance, que são a Cidade e o Lago, como seguem.
“O lago e a urbe.
O grande lago natural datava de tempos imemoriais. Suas medidas quilométricas impressionavam. As matas que o circundavam, as duas ilhas verdejantes que dele emergiam, o fervilhar de vidas em seu interior e no seu entorno, tudo isso compunha um todo harmônico de indescritível beleza. Dele se dizia que era encantado, que seres sobrenaturais habitavam suas profundezas e, de vez em quando, vinham à tona para anunciar o bem ou o mal. A seu lado, como se fora um filho sob a proteção da mãe, estava a povoação, que se fez vila e se tornou cidade.
Passaram-se anos e séculos, os ventos sopraram do sul e de todos os lados; trouxeram consigo a tecnologia e o progresso, a ambição e o consumismo, a indiferença e o desamor. A cidade cresceu, iludiu-se com as facilidades tecnológicas e não mais se deu conta de que o lago existia, que estava ali a seu lado e carecia de proteção e defesa. Deu-se que ele secou! E secou tão completamente que as areias úmidas de suas praias se fizeram poeira, a lama impermeabilizante do fundo esturricou, e os entes misteriosos que diziam habitar as profundezas ou nunca existiram, ou foram homiziar-se em águas ignotas.
Sob os efeitos da longa estiagem e padecente da inominável perda, a cidade ficou polvorosa. Gaguejaram lamentos, vociferaram imprecações, sustentaram libelos contra agentes propulsores do progresso, tidos por agressores do meio ambiente. Rogaram a Deus enfim. Alguns entre filhos da terra, porém, fizeram a mea-culpa; outros reagiram com atitudes concretas em proveito de remediar os agravos já consumados e de conscientizar as pessoas a não mais agredirem a natureza. Eis que, em abundância, voltaram as chuvas. O lago encheu , transbordou. Os mais velhos, sábios de experiência e de idade, vaticinaram: “ Ela nunca mais vai ser como era antes”. Referiam-se à grande lagoa de Parnaguá.
De posse desse acontecimento real e inédito, a propósito do qual confabularam, dialogaram e bradaram as ruas, o autor desenvolveu a sua narrativa, valendo-se de personagens que, com suas ações e omissões, vigílias e sonhos, outra coisa não fizeram senão representar a realidade da vida, que ora é doçura, ora amargor. E tudo, sendo ficção, é arte e nada mais.”
O intelectual OTON LUSTOSA, escritor de “pena leva”, que produz obras literárias de rico conteúdo e de agradável leitura, lança mais um romance, onde resta homenageada Parnaguá, sua terra natal, e o grande lago que embrinca a referida cidade.
JUSTIÇA NO BRASIL. CUSTAS JUDICIAIS DE VALORES SIGNIFICATIVOS.
O Judiciário no Brasil cobre dos jurisdicionados elevados valores pela prestação de seus serviços à guisa de “custas judiciais” de ingresso das ações.
A maioria dos jurisdicionados brasileiros é composta por pessoas de classe média, assim, considerando o pesados ônus das despesas cobradas pela Justiça e a necessidade de buscar a via judiciária para resolver seus litígios passou a ser recorrente a busca dos benefícios da JUSTIÇA GRATÚITA, que agora começa a merecer acurado exame de parte do magistrado que preside o feito, antes de deferir a pretensão.
Então, repita-se, considerando o número crescente dos jurisdicionados requerendo o benefício da gratuidade dos serviços prestados pela Justiça, atualmente não basta a parte requerer e juntar DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA, pois a maioria dos juízes que presidem os feitos estão exigindo provas acessórios que comprovem com mais robustez o estado de pobreza do pretenso beneficiário.
A coluna colheu decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que traça os rumos do posicionamento da jurisprudência sobre a matéria.
REsp 1.988.687-RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Corte Especial, por maioria, julgado em 17/9/2025. (Tema 1178).
REsp 1.988.697-RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Corte Especial, por maioria, julgado em 17/9/2025 (Tema 1178).
REsp 1.988.686-RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Corte Especial, por maioria, julgado em 17/9/2025 (Tema 1178).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
EMENTA – Gratuidade da justiça. Benefício pleiteado por pessoa natural. Acesso à justiça. Requisito da insuficiência de recursos. Aferição com base nas circunstâncias do caso concreto. Declaração de hipossuficiência econômica. Presunção relativa de veracidade. Parâmetros objetivos. Impossibilidade de indeferimento de plano do pedido de gratuidade. Caráter meramente suplementar. Necessidade de intimação da parte requerente. Oportunidade de comprovar a necessidade de deferimento do benefício. Tema 1178.
Destaque
I) É vedado o uso de critérios objetivos para o indeferimento imediato da gratuidade judiciária requerida por pessoa natural;
II) Verificada a existência nos autos de elementos aptos a afastar a presunção de hipossuficiência econômica da pessoa natural, o juiz deverá determinar ao requerente a comprovação de sua condição, indicando de modo preciso as razões que justificam tal afastamento, nos termos do art. 99, § 2º, do CPC;
III) Cumprida a diligência, a adoção de parâmetros objetivos pelo magistrado pode ser realizada em caráter meramente suplementar e desde que não sirva como fundamento exclusivo para o indeferimento do pedido de gratuidade.
Informações do Inteiro Teor
A questão submetida a julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, nos termos do art. 1.036 do Código de Processo Civil, para formação de precedente vinculante previsto no art. 927, III, do Código de Processo Civil, é a seguinte: “definir se é legítima a adoção de critérios objetivos para aferição da hipossuficiência na apreciação do pedido de gratuidade de justiça formulado por pessoa natural, levando em conta as disposições dos arts. 98 e 99, § 2º, do Código de Processo Civil”.
A análise das normas que regulamentam a gratuidade judiciária tem por premissa interpretativa a finalidade para a qual foi estabelecido o referido instituto, que é afastar a escassez de recursos como fator de exclusão do acesso à justiça.
O benefício da justiça gratuita depende de requerimento formulado ao juiz da causa e não se relaciona com a demonstração da plausibilidade do direito vindicado na demanda. Está atrelado, exclusivamente, à insuficiência de recursos para o pagamento das despesas processuais.
O Código de Processo Civil adotou parâmetro abstrato de elegibilidade para a gratuidade judiciária, pois não detalhou como será avaliada a condição de hipossuficiência econômica, tampouco os meios para sua comprovação. Há apenas a utilização da expressão aberta “insuficiência de recursos” e a indicação de que o benefício será conferido na forma da lei.
A opção legislativa pela utilização de parâmetro abstrato de elegibilidade para a gratuidade judiciária (insuficiência de recursos), conjugada com a expressão “na forma da lei” disposta na parte final do art. 98 do CPC, leva-nos à conclusão de que a concessão desse benefício deve pautar-se por critérios subjetivos.
Nesse sentido, cumpre ao magistrado analisar as condições econômicas e financeiras da parte postulante da justiça gratuita com fundamento nas peculiaridades do caso concreto. Não há amparo legal, portanto, para sujeitar-se o deferimento do benefício à observância de determinados requisitos objetivos preestabelecidos judicialmente.
O argumento da isonomia, ao invés de justificar a implementação de parâmetros objetivos para a gratuidade judiciária, reforça a necessidade de que o exame da insuficiência de recursos seja realizado casuisticamente, tomando-se por consideração as peculiaridades do caso. A igualdade não deve ser concebida exclusivamente sob o aspecto formal. Deve ser observada também sob a perspectiva material ou substantiva, com a finalidade de reduzir as desigualdades de fato para a promoção do acesso à justiça.
A declaração de hipossuficiência econômica apresentada por pessoa natural, todavia, apresenta presunção relativa de veracidade. O art. 99, § 2º, do CPC estabelece que o magistrado poderá indeferir o pedido de gratuidade, caso existam nos autos elementos de prova que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a sua concessão. Em todo caso, faz-se necessário que o juiz, antes de indeferir o pedido, intime a parte requerente para que comprove o preenchimento dos requisitos à obtenção da justiça gratuita.
Essa norma procedimental é deveras importante, pois realça não apenas a presunção iuris tantum da declaração de pobreza da pessoa natural, mas, principalmente, a opção legislativa pelo caráter eminentemente subjetivo da análise do requisito da insuficiência de recursos para a concessão da gratuidade judiciária.
Dessa forma, mesmo que existam nos autos elementos de prova que, em princípio, conduziriam ao indeferimento do pedido de gratuidade, deve o magistrado intimar a parte requerente para comprovar a hipossuficiência econômica com base nas circunstâncias do caso concreto.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, tanto sob a ótica da Lei n. 1.060/1950 como a partir da regulamentação promovida pelo atual Código de Processo Civil, tem sido firme quanto à impossibilidade de utilização de parâmetros unicamente objetivos para o exame do pedido de justiça gratuita. Entende-se que a hipossuficiência econômica da parte requerente deve ser avaliada com fundamento em um conjunto de condições factualmente aferíveis, considerando-se a situação particular de cada litigante em arcar com as despesas processuais.
Da mesma forma, também está consolidado o entendimento jurisprudencial a respeito da presunção relativa (iuris tantum) de veracidade da declaração de pobreza formulada por pessoa natural. Essa orientação deve ser ratificada neste precedente qualificado para que não seja autorizada a adoção exclusiva de critérios objetivos para a aferição da hipossuficiência econômica no exame do pedido de gratuidade judiciária.
Com efeito, são razoáveis as preocupações relacionadas ao ajuizamento de lides temerárias a sobrecarregar o funcionamento do Poder Judiciário. Nesse particular, a concessão indiscriminada do benefício da justiça gratuita com base na simples declaração de hipossuficiência poderia, em tese, contribuir para a utilização abusiva desse direito, comprometendo o próprio princípio de acesso à justiça, sob o viés da efetividade da tutela jurisdicional.
Contudo, a diversidade das situações presentes no plano fático assim como as discrepâncias sociais, culturais e econômicas existentes entre as regiões do Brasil tornam impossível a padronização de critérios adequados a compatibilizar a concessão da gratuidade judiciária com o direito de acesso à justiça.
Deve-se salientar que o art. 98 do CPC, ao se referir à expressão “insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios”, trouxe novos horizontes à antiga correlação existente na Lei n. 1.060/1950 entre a justiça gratuita e a figura do necessitado, conceituado como aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas sem o comprometimento do sustento próprio ou da família.
No contexto atual, a concessão da gratuidade pode ocorrer apenas em relação à prática de determinado ato ou diligência processual, ou ainda consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. O CPC prevê, inclusive, a possibilidade de o juiz conceder o parcelamento de despesas processuais.
O benefício da gratuidade judiciária não deve se fundar na lógica do tudo ou nada, mas sim na técnica da granularidade, permitindo-se a concessão parcial do benefício (limitado a um ou alguns atos previstos em lei), o deferimento de benefício reduzido (em que há a redução percentual do valor a ser pago para viabilizar proporcionalmente o acesso à justiça) ou ainda o parcelamento das despesas processuais.
Tais circunstâncias reforçam o entendimento de que o legislador optou por adotar um parâmetro abstrato de elegibilidade para a gratuidade judiciária, o que nos leva à conclusão de que a concessão desse benefício deve pautar-se por critérios subjetivos e não exclusivamente objetivos.
Portanto, cumpre ao magistrado analisar as condições econômicas e financeiras da parte postulante da justiça gratuita com base nas peculiaridades do caso concreto, considerando não apenas o processo judicial como um todo, mas eventuais impactos financeiros da diligência processual a ser realizada.
A esse respeito, existem inúmeras variáveis que podem nortear a atuação do magistrado quando estiver diante de um pedido de gratuidade judiciária, tendo em vista a necessidade de equilibrar a realização do direito fundamental de acesso à justiça, sem, contudo, banalizar o referido benefício e comprometer a própria finalidade.
Nessa linha, a percepção de renda mínima por pessoa natural, a participação em programas sociais destinados à população de baixa renda, a situação de superendividamento, o acometimento de doença grave ou incapacitante, a propriedade de bens são referenciais igualmente válidos para a aferição do requisito insuficiência de recursos para o custeio das despesas processuais.
Em todo caso, não é possível que o exame da condição de vulnerabilidade econômica prenda-se a um único parâmetro ou critério objetivo, a exemplo do rendimento da parte requerente, devendo ser consideradas e ponderadas as demais circunstâncias e particularidades existentes no caso concreto.
Diante de tudo o que foi exposto, a recorrência a parâmetros objetivos deve ser admitida tão somente em caráter suplementar, isto é, não se prestando ao indeferimento de plano do pedido de gratuidade, mas para justificar o procedimento previsto no art. 99, § 2º, do CPC, permitindo que o juiz intime a parte requerente para comprovar a situação de miserabilidade jurídica perante o caso concreto.
Assim, fixam-se a seguintes teses do Tema Repetitivo 1178/STJ:
i) É vedado o uso de critérios objetivos para o indeferimento imediato da gratuidade judiciária requerida por pessoa natural;
ii) Verificada a existência nos autos de elementos aptos a afastar a presunção de hipossuficiência econômica da pessoa natural, o juiz deverá determinar ao requerente a comprovação de sua condição, indicando de modo preciso as razões que justificam tal afastamento, nos termos do art. 99, § 2º, do CPC;
iii) Cumprida a diligência, a adoção de parâmetros objetivos pelo magistrado pode ser realizada em caráter meramente suplementar e desde que não sirva como fundamento exclusivo para o indeferimento do pedido de gratuidade.
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