“Ainda lembro deste dia, como se tivesse sido há poucas horas…”.

  Era 17 de julho de 1994 e, de pé, junto a um grupo de pessoas, assistia, no clube da AABB, o atacante italiano Roberto Baggio chutar a bola para bem distante do gol, provocando uma alegria geral de todos que ali estavam. Afinal, depois de um longo jejum de 24 anos, o Brasil vencia novamente uma Copa do Mundo. Naquele instante, uma onda eufórica percorria os corações de muitos fãs do tão amado futebol, atingindo até aqueles que nem simpatizavam tanto com tal modalidade esportiva, mas que, tragados por essa onda benéfica, se uniam num grande coro em comemoração à conquista do Tetra. Próximo ao local onde eu estava, a poucos quarteirões de distância, mas precisamente na Coroa (hoje Bairro do Carmo), encontrava-se um homem que, ao vibrar com a vitória do Brasil sobre a Itália, acabou por mergulhar no passado, de quando ainda era garoto, e ouviu pelos quatro cantos da “Velha Parnaíba”, os brados de – “É campeão!” – quando o Brasil venceu sua primeira Copa, há mais de cinco décadas. Este homem era José Maria Alves Costa Filho.

     Zé Maria, como muitos o chamam, nasceu no dia 12 de março de 1952, na cidade de Araioses (Maranhão), porém, ainda com um ano de idade, foi levado pelos pais para Parnaíba, cidade que considera sua terra natal. Ele veio ao mundo apenas dois anos após a amarga derrota do Brasil para o Uruguai na Copa que nosso próprio país foi sede, e adquiriu o interesse pelo futebol ainda muito jovem, aos seis anos, quando vencemos por 5 a 2 a Suécia, conquistando, assim, a primeira Copa em 1958. Apenas quatro anos depois, nosso time vencia, pela segunda vez, o torneio mundial, desta vez em cima da Tchecoslováquia, e Zé Maria, agora com 10 anos, já despontava perante os colegas a habilidade que tinha como centroavante, fato que despertaria com o tempo a atenção de pessoas ligadas ao futebol em Parnaíba, e que o conduziria para um tempo de glórias e gols inesquecíveis.

         Ainda na infância, junto aos irmãos Antônio, Raimundo e Alcioneide,  Zé Maria,  estudante das escolas José Narciso, Comercial da Parnaíba e, posteriormente, Estadual Lima Rebello, aprendia lições de matemática e português, dentre outras, enquanto crescia na prática do futebol,  percebendo, pouco a pouco, a infância iria terminar e, junto dela, a inocência, a tranquilidade e muitas outras coisas…

           Na década de 70, aos 18 anos, e já jogador experiente, Zé Maria teve a felicidade de acompanhar o tricampeonato brasileiro, conquistado no México em cima da rival, Itália. Durante alguns anos, jogou nos times e seleções de futebol da cidade e,  principalmente, no Payssandu, eterno adversário do Parnahyba Sport Club.

          Porém, chegou um momento em que Zé Maria teve que deixar o estado do Piauí para ganhar seu sustento, pois a carreira de futebol, até os de dias de hoje, infelizmente, nem sempre assegura quem dela tenta viver, e partindo para o Centro do País, ele abandona as chuteiras, deixando de lado o sonho de ser um artista dos pés para se tornar um nobre trabalhador das mãos. Foi nesse período, passando pelos estados de Goiás e Mato Grosso que Zé Maria casou-se e teve dois filhos, mas a saudade o trouxe de volta anos depois, em 1991, para a sua cidade do coração, Parnaíba. Divorciado, casa-se novamente em 1993, e como que numa incrível coincidência ou mágica do destino, o Brasil volta a vencer, desta vez, na Copa dos Estados Unidos e, novamente, sobre a Itália. Daí veio a Copa de 2002, trazendo o pentacampeonato, e hoje Zé Maria trabalha no condomínio no qual resido, e local que tive a oportunidade de conhecê-lo.

            Com um rádio na mão, e sempre ligado nos jogos do Flamengo, seu time preferido, este veterano do futebol e da vida, já aposentado dos gramados, possui um olhar distante, porém sereno, quando lembra do passado e de suas inúmeras vitórias como jogador e ser humano; campeão dos inúmeros obstáculos que surgiram e ainda surgem do amadurecimento diário de conquistas e derrotas, impostas pelo cotidiano de uma sociedade cada vez mais fria e sem sentimentos. E é com um sorriso cativante que ele termina a conversa, aliás, uma das muitas que já tivemos no decorrer desses três anos de amizade.

           Quando me despeço deste eterno craque, começo novamente a lembrar daquela Copa do Mundo de 1994, quando tive o prazer de gritar bem alto: – “É tetra, é tetra!” Da mesma forma que, em 1958, ele vibrou. Alegrias que hoje lhe trazem recordações nostálgicas de um tempo em que a vida era menos complicada e os problemas mais facilmente resolvidos. E num último instante, quase posso ouvi-lo sussurrar, como que apenas  para si…

            “Ainda lembro deste dia, como se tivesse sido há poucas horas…”.

Claucio Ciarlini (2010)