Há anos recebi de um jornalista e escritor piauiense a solicitação de que me manifestasse numa pesquisa/eleição definidora de quem seria o maior poeta vivo do Piauí. Minha resposta: silêncio.

Implico há bom tempo com esse negócio de se considerar alguém como absolutamente superior aos demais. Vejo como inúteis todas as calorosas discussões que flamenguista doente travei na adolescência com vascaínos, botafoguenses, tricolores sobre quem era o maior. Sempre a emoção sobre a razão. E o Brasil é maior que a Alemanha, Itália, Uruguai, Argentina?

Cresci e aprendi que todos são grandes, têm uma história rica de vitórias e derrotas e compõem no calor da competição a grandeza superior da prática esportiva.

Olavo Bilac, poeta parnasiano, foi eleito “Príncipe dos Poetas Brasileiros” em concurso promovido pela revista “Fon-fon”. Sei não, mas a meu juízo Alberto de Oliveira, Raimundo Correia, Vicente de Carvalho, Da Costa e Silva e Cruz e Sousa em nada ficam a dever a Bilac. Se Camões é o maior dentre os maiores, como classificar Homero, Dante, Shakespeare, Fernando Pessoa?

O poeta Jonas Fontenele da Silva foi envolvido numa disputa com Antônio Francisco da Costa e Silva destinada a eleger o “Príncipe dos Poetas Piauienses”.

Na época, primeira metade do século XX, Parnaíba se encontrava no apogeu do desenvolvimento econômico, de modo que havia forte rivalidade entre parnaibanos e teresinenses. Jonas da Silva representava a cidade natal, Parnaíba, enquanto Da Costa e Silva, nascido em Amarante, estava representando sobretudo a capital do estado.

O episódio inspirou a Jonas da Silva o soneto “As Duas Cidades”, transcrito no livro-álbum PARNÁRIAS: POEMAS SOBRE PARNAÍBA:

        “As cidades lutavam… Pertencia

Eu a uma delas – as facções rivais:

Teresina querendo a primazia,

Parnaíba – ombrear com capitais…

 

O príncipe dos poetas imortais

Do Piauí, quem era, quem seria!

Como soldado em meio a generais

O meu nome surgiu nesta porfia…

E assim, na Arte esplêndida de Dante,

Na eleição – soube aqui no meu retiro –

Vencedor foi o poeta de Amarante!

 

Nada a mim perturbou nesta humildade…

Eu só do bem ao principado aspiro.

O homem só é grande pela caridade!”

 

No livro de estreia – ALGUMA POESIA _ , de 1930, Carlos Drummond de Andrade publicou um poema-piada denominado “Política Literária”, que diz:

 

“O poeta municipal

discute com o poeta estadual

qual deles é capaz de bater o poeta federal.

 

Enquanto isso o poeta federal

tira ouro do nariz.”

 

Para Virgínia Wollf, “a estátua é sempre maior que o original”.

Em Fernando Pessoa colhi inesquecíveis lições sobre o ´que é ser verdadeiramente grande:

“Para ser grande, sê inteiro: nada

Teu exagera ou exclui.

Sê todo em cada coisa. Põe quanto és

No mínimo que fazes.”

(“Ode”)

 

“Grande é a poesia, a bondade e as danças…

Mas o melhor do mundo são as crianças,

Flores, música, o luar, e o sol, que peca

Só quando, em vez de criar, seca.

 

O mais do que isto

É Jesus Cristo,

Que não sabia nada de finanças

Nem consta que tivesse biblioteca…”

(“Liberdade”)

Na obra FERNANDO PESSOA: O LIVRO DAS CITAÇÕES, de José Paulo Cavalcante Filho, há a seguinte nota de rodapé na pág. 59:

“O poema, de 16/3/1935, é um ato de protesto contra

o autoritarismo de Salazar – como se percebe pelo próprio

título. Vetado pela censura, foi publicado só depois da

morte de Pessoa (…) A ironia do verso é ser referência ao

fato de que Salazar, professor de direito financeiro em

Coimbra, passou, em 1928, a ser ministro das Finanças de

Portugal.”

Quando alguém quer a minha opinião sobre quem é o maior nisto, o maior naquilo, tenho a resposta na ponta da língua: como diz o doutor Lauro Correia, “maior é a girafa porque tem o pescoço grande”.

Por Alcenor Candeira FIlho