Sempre atualizado com as notícias do dia, ficou sabendo que muitas pessoas já conseguem ultrapassar os cem anos de idade. Bem informado e, por isso mesmo, cansado de viver neste mundo cruel, despediu-se da família, parou de se alimentar, deitou-se na cama e ficou por lá, esperando Dona Morte chegar. Estava decidido e queria mesmo morrer. Mas até hoje nunca morreu e morre de inveja de quem morre de morte morrida, de preferência à noite, enquanto dorme.
Ao acordar na manhã seguinte, ouviu no rádio que Dona Morte, com medo de morrer, nunca mais saiu de casa. Ela até pensou em fazer greve porque, no inferno, os salários andam sempre atrasados – e os reajustes, quando existem, são feitos abaixo da inflação. Acontece que no inverno do inferno é proibido fazer greve, pois o fogo pode se apagar. Sem fogo e aquecimento, os salários ficarão congelados para sempre.
Um dia, em meio a tanto sofrimento, Dona Morte acabou descobrindo como os demônios procedem: primeiro, congelam os salários; depois, esperam que os trabalhadores morram de fome, para compartilhar com eles o seu inferno existencial.
Desde aquele dia, Dona Morte entrou em greve por tempo indeterminado, e ninguém nunca mais duvidou da vida eterna. Por não temerem mais a morte, os mortais deixaram de fazer guerras, revelando assim o grande paradoxo da humanidade, e, finalmente, tirando o véu… desvelando todo o seu mistério.
Ouça o áudio com a narração do autor:
Vidas Eternas - Por Vitor de Athayde Couto